Regresso às aulas e às vacinas

Será que as crianças de hoje brincam ou ficam a olhar para os telemóveis sem conviverem umas com as outras?

Por Alice Vieira e Nélson Mateus

Querida avó,

Voltou a romaria de velhos a caminho dos centros de saúde, e afins, para voltarem a ser vacinados. Daqui a pouco deves estar a ser chamada. Não te esqueças que tens que vir a Lisboa para tal! Confessa que estás cheia de vontade de vir à capital e com saudades de voltar a colocar a máscara.

Segundo a Dra. Graça Freitas, vais levar duas vacinas (uma em cada braço) no mesmo dia. Assim ficas protegida da Covid-19 e da Gripe.

Duas por dia, nem sabes o bem que te fazia. A Vacinação protege (a nós e aos outros). Vacinem-se!

Esta semana também se assinala o Regresso às Aulas.

Recordo-me de em criança as aulas começarem bem perto de outubro.

A escola primária onde andei foi deitada a baixo recentemente. No mesmo local vai nascer (mais um) hipermercado.

Recordo-me das mesas de madeira que tinham uma ranhura para colocar os lápis e canetas. Cujo tampo se levantava para guardar os livros, a tabuada do Ratinho, o lanche e tudo o resto.

Lembras-te no anúncio das esferográficas da BIC. «BIC laranja, escrita fina; BIC cristal, escrita normal»?

O primeiro dia de aulas era uma excitação. Vestido com a bata nova aos quadrinhos e o meu nome bordado. Bata que começava o ano escolar imaculada e terminava o ano a parecer um esfregão.

Como será que as crianças passam o tempo livre nos recreios?

Nós corríamos, caíamos, esfolávamos os cotovelos e os joelhos, jogávamos à macaca, ao berlinde e ao pião. As meninas jogavam ao lencinho e ao elástico.

Será que as crianças de hoje brincam ou ficam a olhar para os telemóveis sem conviverem umas com as outras?

Pelos gritos estridentes que me entram pela janela, devem brincar. Menos mal!

Cada vez que vou a uma escola e digo que antigamente existiam escolas para meninos e escolas para meninas … as criaturas ficam a olhar para mim como seu eu fosse do tempo dos dinossauros.

Bjs

 

Querido neto,

Hoje não me apetece falar de Covid, estou com uma grande gripe, até pensei que era covid, fui fazer o teste mas não era. Adiante.
Como na minha família toda a gente morria tuberculosa, (até a minha mãe esteve no Sanatório do Caramulo, mas safou-se) as minhas tias não me deixaram ir à escola. Arranjaram uma professora que ia lá a casa, a quem chamávamos Jita.

Tínhamos depois de ir a uma escola oficial fazer o exame da 4ª classe, e pronto. Nessa altura ou se reprovava, ou se ficava aprovado, ou se ficava distinta.

É claro que eu ia muito mais bem preparada que as outras – a Jita ensinava-nos tudo e mais alguma coisa – e fiquei distinta.

E disse lá em casa que queria ir para o liceu.

«Nem pensar», disseram as tias, «continuas cá em casa com a Jita». 

Mas eu tanto insisti, que elas acabaram por concordar: «Pronto, vais. Tu nunca estiveste com outras crianças, assustas-te, e queres logo voltar para casa!».

Lá fui para o Liceu Filipa de Lencastre – que foi verdadeiramente a minha casa! Eu até inventava aulas que não tinha, para as minhas tias me irem buscar lá mais tarde. As professoras adoravam-me (acabado o liceu, fiquei a escrever-me com muitas delas até elas morrerem), a reitora adorava-me, eu até aos casamentos das funcionárias ía.

Quando cheguei ao então 5º ano do liceu, quando era preciso escolher a área para onde íamos, fui para Germânicas, que era a única área que havia no liceu, para lá poder ficar mais dois anos.

E uma das coisas que mais me orgulha é que a sala onde eu andei tenha hoje o meu nome.

E quando hoje encontro uma velha colega – se é do liceu aquilo são abraços e beijinhos; se é da faculdade, resume-se a um «olá, estás bem?».

Não me parece que hoje os alunos de liceu criem estas amizades tão fortes. E é pena…

Bjs e cuida-te