Se não tivesse nascido em Paris, não há tanto tempo como isso, o Paris Saint-Germain seria um clube de Hollywood. Nunca uma tão grande feira de vaidades tomou conta daqueles que sonham obsessivamente com a Taça dos Campeões e falta-lhes, claramente, estatuto e patina para lá chegar apesar do dinheiro dos emires do Qatar escorrer pelas ruas de Paris como o Sena quando vai cheio. Mas ainda muito antes de os parisienses terem aprendido de cor e salteado onde diacho fica o tal de Qatar, já o seu presidente da altura, Daniel Hechter, sonhava com vestir a camisola do clube ao que era, à época, melhor jogador do mundo: Johan Cruyff. E vestiu mesmo.
O Paris Saint-Germain, comparado com os grande clubes da Europa, é um menino: foi fundado a 12 de agosto de 1970 e começou por adotar um equipamento vermelho e branco, assim à Benfica, ou à Manchester United. Depois, continuamente envolvido em ações de marketing, foi desenvolvendo novos desenhos na tentativa de conquistar aquilo que não tinha – adeptos. Apostou num estilo Ajax. Mas, como sabemos, camisas bonitas ou originais não encantam quem vai à bola se esta não for tratada com mimos dos que têm pés de belbutina. Eram preciso estrelas para que a Cidade-Luz se encantasse com futebol.
Vamos então até junho de 1975 quando a imprensa francesa explodia de alegria com a possibilidade da chegada a Paris do Bola de Ouro holandês. Daniel Hechter era (e é) dono de uma famosa marca de roupa. Conheceu Cruyff a propósito disso mesmo. «Cruzámo-nos várias vezes. Gostava de vestir nas minhas lojas», contaria mais tarde. «Foi então que, certo dia, lhe perguntei se estaria disposto a vir ao Parque dos Príncipes para participar num torneio internacional de categoria e jogar pelo PSG pelo menos um jogo. Além do mais o nosso treinador era um nome formidável do futebol mundial, Just Fontaine. Johan tinha contrato com o Barcelona e, antes de aceitar o meu convite, pediu-me para contactar diretamente o presidente do seu clube. Fiquei entusiasmadíssimo!»
O Paris Saint-Germain tinha acabado de subir à I Divisão mas o seu sonho de grandeza era insaciável. «Há que dizer duas coisas para que se reponha a verdade sobre algumas notícias vinda a público», dizia Hechter. «Em primeiro lugar nunca ofereci um contrato para que Cruyff viesse para o PSG porque, para nós, na altura, a verba era absolutamente incomportável. Em segundo lugar também não paguei fortunas para que jogasse por nós no Torneio de Paris. Nem ao Barcelona, que se mostrou cooperativo com a vontade dele em vir, nem ao próprio Johan que se fez pagar com meia-dúzia de fatos que escolheu das minhas coleções».
Os portugueses
Em 1975, o Paris Saint-Germain tinha um jogador português e não era um qualquer: tratava-se de Humberto Coelho que saíra do Benfica para tentar compor a sua vida financeira mas se encontrava lesionado. E no dia 17 de junho, Cruyff entrou no Parque dos Príncipes como príncipe que era para defrontar uma equipa portuguesa: o Sporting, um dos convidados do torneio com Valência e Fluminense. Tirando o entusiasmo em redor do que o holandês ia ou não ia fazendo com a bola, o jogo resumiu-se a uma vitória fácil dos franceses por 3-1, golos de Renaut, Bogliani e M’Pelé contra o de Nelson.
Para contrariedade de Daniel Hechter as bancadas ficaram longe de encher. Foi com um passe brilhante que Cruyff ofereceu o golo a M’Pelé, mas nem por isso o público parisiense pareceu ficar satisfeito. Dois dias mais tarde, Cruyff voltou a jogar pelo PSG, desta vez na final contra o Valência: derrota por 0-1. Renaut, seu companheiro de equipa nesse dia, comentou: «A forma como nos comandava a todos no campo só por gestos era fantástica. Horrorizou-me que as pessoas o assobiassem sempre que tocava na bola». Cruyff reconheceu galantemente a sua má noite: «Peço desculpa. Estava muito cansado. Tive uma época muito complicada e estou sem me treinar há mais de um mês». Um príncipe é sempre um príncipe.