É menino ou menina?

Começar no ensino básico a induzir a ideia de que um menino pode afinal ser menina e vice-versa, leva a que se pense que isso é uma coisa fácil. Que um menino pode transformar-se em menina – basta querer. Ora isto, para lá de um tremendo embuste, é um crime.

Um conjunto de deputados que se diriam respeitáveis – entre os quais Edite Estrela, Eurico Brilhante Dias, Pedro Delgado Alves, Porfírio Silva, Alexandra Leitão, Alexandre Quintanilha, etc. – assinou um projeto de lei sobre a identidade de género que me leva a perguntar: leram o texto? Não o podem ter lido. Por uma razão simplicíssima: contém contradições tão evidentes que uma leitura, mesmo distraída, os levaria a recomendar a sua correção.

Não falo no conteúdo do projeto – já lá irei. Refiro-me apenas às suas incongruências óbvias. O diploma aborda o direito que «crianças e jovens», em «transição de género», têm de escolher o nome por que querem ser tratados na escola, a casa de banho que querem utilizar, o balneário que querem frequentar, etc.

Ora, a ‘transição de género’ só pode legalmente iniciar-se aos 16 anos. E uma pessoa de 16 anos já não é evidentemente uma ‘criança’. O projeto só poderia pois, no limite, falar em ‘jovens’. Falar de crianças em transição de género é um absurdo. E uma ilegalidade. 

Mas o projeto é todo ele um contrassenso. Prevê a formação especial de professores e do conjunto do pessoal escolar para lidar com este problema da identidade de género, e a própria adequação das instalações escolares em todos os graus de ensino à nova realidade. 

Ora, para lá dos enormes meios que isto exigiria, eu pergunto: e as próprias crianças? E os jovens? Podem formar-se os professores e restante pessoal para responder a este objetivo, mas há uma barreira intransponível: as próprias crianças e jovens. Todos sabemos como são implacáveis. Como humilham impiedosamente colegas com problemas físicos ou psicológicos. Ora, por maior que seja a repressão nas escolas, ter numa sala de aula um menino vestido ou fardado de menina será um forrobodó para os colegas. Ele próprio não se sentirá bem. Por muito grande que seja a sensibilização dos alunos para este problema, ver um menino a ser chamado por Conceição, Isabel ou Felismina será motivo de chacota para a turma. E ter um menino a querer usar a casa de banho das meninas provocará uma revolução. Sei de escolas onde já tentaram experimentar esta ideia e as alunas revoltaram-se, acabando a medida por voltar para trás. Há barreiras que são intransponíveis, por maior que seja o empenho dos seus autores e mesmo a sua justiça. 

Este projeto de lei é um ato de voluntarismo impossível de ser levado à prática. E sabemos como o voluntarismo (e o experimentalismo) é perigoso na educação. 

Mas o diploma, sendo embora inviável, podia ser bom. Só que é mau. Muito mau. É mentiroso para não dizer criminoso – e vou explicar porquê.

Começar no ensino básico a induzir a ideia de que um menino pode afinal ser menina e vice-versa, leva a que se pense que isso é uma coisa fácil. Que um menino pode transformar-se em menina – basta querer. Como se fosse carregar no botão de um interruptor – e um rapaz transformava-se em rapariga e uma rapariga em rapaz. 

Ora, isto é um tremendo embuste.

Os processos de transição de género – ou, falando mais diretamente, de mudança de sexo – são terrivelmente traumáticos do ponto de vista físico e terrivelmente traumáticos do ponto de vista de vista psicológico. As pessoas que falam deste assunto com leveza nunca refletiram bem sobre ele. 

E no fim de tudo, a ‘mudança de sexo’ não resolve o problema… pois é clinicamente impossível. Por mais hormonas que se deem, por mais cortes que se façam, por mais silicone que se injete, nunca num corpo de homem nascerá uma mulher e vice-versa. Há limites biológicos impossíveis de transpor. 

 

Qualquer pessoa de bom senso sabe isso. Mas a maioria tem medo de o dizer. Teme ser considerada retrógrada, reacionária. Os próprios políticos, de esquerda ou de direita, têm medo de falar disto abertamente, refugiando-se em meias palavras. E assim, estes processos são liderados por minorias radicais, com objetivos duvidosos. 

A quem serve esta liberalidade levada ao extremo, passando a barreira mais intransponível entre os humanos: a que diferencia o homem da mulher? Um homem pode nascer pobre e tornar-se rico; pode nascer fraco e tornar-se forte; mas não pode nascer menino e tornar-se mulher, porque nenhuma operação conseguirá uma transformação completa. Só um golpe de magia o poderia fazer – mas isso pertence ao mundo do espetáculo e não da ciência.

Um adulto ter a ilusão de que pode transformar-se em mulher é, em minha opinião, um erro – mas é com ele. 

Um jovem de 16 anos poder fazê-lo, como já acontece, é uma precipitação perigosíssima. A adolescência é um período difícil, carregado de dúvidas, angústias e inseguranças, em que muita coisa muda, sendo completamente insensato fazer uma opção radical numa questão tão determinante. 

Agora falar de transformação de sexo em crianças é uma ideia de loucos. E de loucos perigosos.

O processo tem, mesmo, de ser exatamente o oposto: ajudar os meninos e meninas a sentirem-se bem com o corpo que têm – alto ou baixo, gordo ou magro, menino ou menina – e não estimular-lhes a dúvida, a insegurança, e criar-lhes ilusões de que podem mudar tudo. 

Assim, apelo a Edite Estrela, Eurico Brilhante Dias, Pedro Delgado Alves, Porfírio Silva, Alexandra Leitão, Alexandre Quintanilha, para que coloquem a mão na consciência e vejam o que estão a fazer. 

Não falo de Isabel Moreira, porque esta não atua racionalmente – age por militância ideológica, que é do domínio da emoção e não da razão.