Maria de Lourdes Resende

por Nélson Mateus e Alice Vieira

Querida avó,

Aos 95 anos partiu, esta semana, Maria de Lourdes Resende. Apesar de já não se ouvir falar da cantora há imenso tempo, para muitos, continua a fazer parte das memórias de Portugal.
Claro que as gerações mais novas nem devem saber quem foi Maria de Lourdes Resende. Provavelmente, nem nunca ouviram falar do nome. Mas as gerações mais velhas recordam-na perfeitamente.
Começou por cantar na igreja de Santa Cruz, no Barreiro, onde seu pai era organista amador. Entretanto, o pai morre, e Maria de Lourdes vai viver com os tios para Albergaria-a-Velha, onde começa a realizar várias iniciativas ligadas à cultura na Casa do Povo.
Aos 18 anos a sua vida não volta a ser a mesma: vem a Lisboa, ao casamento da irmã, e aproveita para prestar provas na Emissora Nacional.
Tudo começou aí! Canta na Rádio Graça e em 1945 estreia-se na Emissora Nacional.
Passados uns anos, já depois de ter atuado em Paris, e ter passado pelo Brasil, começa a gravar discos. É eleita “Rainha da Rádio” num concurso promovido pela revista Flama. No ano seguinte é “Rainha do Espectáculo” num concurso da revista Plateia.
Em 1957 participa na primeira emissão da RTP. Passado um ano concorre ao Festival da Canção Portuguesa, (nome anterior do Festival da Canção) voltando a concorrer outras vezes.
Deixou um reportório com mais de 200 músicas gravadas. 
Uma das que ficará gravada nas nossas memórias é “Alcobaça”.
Foi precisamente em Alcobaça que Maria de Lourdes Resende foi homenageada por ocasião dos seus 50 anos de carreira. E, como não podia deixar de ser, tem lá uma rua com o seu nome.
Recentemente, quando estivemos em Alcobaça, no caminho de regresso a casa viemos a cantar: «Quem passa por Alcobaça/ Não passa sem lá voltar/ Por mais que tente e que faça/ É lembrança que não passa/ Porque não pode passar!».
Obrigado pelo contributo que deu à cultura portuguesa.
Bjs

Querido neto,

É verdade, morreu Maria de Lourdes Resende. Tu não sabes (ou não te recordas), mas a Maria de Lourdes Resende entra num dos meus livros.
Um dos grandes temas dela foi a canção: “A Moleirinha”.
Se fores ao livro “Se Perguntarem Por Mim, Digam Que Voei”, uma das personagens um dia tem um pesadelo e, pelo meio de muita confusão, aparece-lhe a Maria de Lourdes Resende a cantar «Pela estrada fora, toc, toc toc», – que é, precisamente, a letra da “Moleirinha”.
Mas quando eu era miúda, lembro-me de haver grande rivalidade entre a Maria de Lourdes Resende e a Júlia Barroso. Era sempre uma disputa terrível entre ambas na eleição da “Rainha da Rádio”. Lá em casa votava-se em peso na Maria de Lourdes Resende. As minhas tias enchiam postais e postais do correio (ainda haverá postais do correio? Acho que não!) que depois a Menina Lucinda, que era a costureira lá de casa, ia pôr, quando saía, no marco do correio ao fim da nossa rua.
A Júlia Barroso tinha um “defeito” que as minhas tias não perdoavam: era linda de morrer. E, para as minhas tias, uma artista que fosse linda era também uma doida, devia ter para aí 500 homens e essas coisas todas. (Coitada da Júlia, sempre tão fiel ao seu marido e aos seus seis filhos, que se retirou cedo e ainda foi professora).
Ora a Maria de Lourdes Resende, inteligente como era, fez do ser feia uma arma: e um dos seus maiores êxitos, para lá de “Alcobaça” e da “Moleirinha” foi a “Feia”:
«Chamam-te feia/ Não te importes/ Tudo mente…Não se discute/ O gosto de ninguém…».
E pronto, o resto – prémios, medalhas, condecorações – já tu contaste. E todas merecidas.
Ver se em breve voltamos a Alcobaça. Que saudades dos doces conventuais e da cidade.
Bjs