O Princípio de Pedro

Não sei se este será o início do fim das ambições políticas de Pedro Nuno Santos – é demasiado novo para tamanho fatalismo –, mas não tinha alternativa à apresentação da demissão. 

A saída do Governo de Alexandra Reis era manifestamente insuficiente para pôr uma pedra sobre todas as questões que se colocam em torno da agora ex-secretária de Estado do Tesouro que recebeu uma indemnização milionária da TAP há cerca de 10 meses e no entretanto desempenhou funções como presidente de outra empresa pública – a NAV.

Mas a demissão de Pedro Nuno Santos de ministro das Infraestruturas também não iliba os demais responsáveis políticos, nem tão pouco sana as clamorosas falhas da enviesada forma como são escolhidos e nomeados os governantes e os gestores públicos e como é escrutinado o exercício das respetivas funções.

Porque o que está em causa é o próprio Governo e a administração da TAP no seu todo, para além da forma leviana, discricionária e clientelar ou amiguista como são selecionados aqueles a quem este poder socialista entrega a guarda da coisa pública, assim plasmando na perfeição o bem conhecido Princípio de Peter.

Não sei se este será o início do fim das ambições políticas de Pedro Nuno Santos – é demasiado novo para tamanho fatalismo –, mas não tinha alternativa à apresentação da demissão. 

Desde logo, porque não tem como justificar o desconhecimento do pagamento pela TAP da indemnização a Alexandra Reis e a nomeação desta para a presidência da NAV umas semanas depois. 

Mesmo acreditando que o seu secretário de Estado nada lhe comunicou, a questão é que não é admissível tê-la nomeado para outra empresa pública nessas circunstâncias, designadamente sem ter tomado conhecimento de todo o processo que envolvera a sua saída da anterior (para a qual, aliás, fora nomeada pelo anterior acionista, com múltiplos interesses na área dos transportes).

O mesmo se aplica, aliás, ao ministro das Finanças, Fernando Medina, a quem não é desculpável que nomeie secretária de Estado do Tesouro alguém que saiu há meses da administração da TAPsem questionar como e de que forma se processou tal saída (e aqui nem releva o facto de o ministro das Finanças poder ter tido fácil acesso a toda a informação dentro da sua própria casa ).

Sublinha-se: a questão não tem nada a ver com a credibilidade do desconhecimento invocado pelos dois ministros a quem cabe a tutela conjunta da companhia aérea nacionalizada, mas, sim, com a absoluta inadmissibilidade desse desconhecimento.

Porque todo este caso é paradigmático da forma de escolha e nomeação tanto dos membros deste Governo como dos gestores públicos dele dependentes – com ou sem CRESAP’s, já que o currículo dos nomeados é sobejamente rico, ou não estivesse o PS há tanto tempo com pleno domínio da Administração Pública, central e local, para além da vigência desde sempre do chamado bloco central de interesses.

Ora, se Pedro Nuno Santos já saiu e Fernando Medina não tem condições para continuar (até porque em matéria de escolha dos elementos do seu gabinete, Alexandra Reis já não é caso único – António Costa já o forçara a deixar cair também  Sérgio Figueiredo), estamos perante um Governo fragilizado nos seus principais alicerces.

Tem, por isso, razão Pedro Santana Lopes ao propor a demissão do Governo e a renovação do convite por parte do Presidente a António Costa para formar novo Executivo, uma vez que não estão reunidas as condições para a dissolução da Assembleia da República, porquanto existe uma maioria absoluta no Parlamento conquistada há menos de um ano por este primeiro-ministro e líder do PS e não há perspectivas de que eleições antecipadas pudessem resultar numa solução de governabilidade para o país. 

Ou seja, não existe uma real alternativa de Governo, considerando que o PSD de Luís Montenegro ainda não se constitui como tal, como evidenciam as mais recentes sondagens e estudos de opinião.
Esta solução, aliás, poderia ser não só a mais indicada para permitir a António Costa formar um novo Governo construído na base de um compromisso interno com o PS, como revelar-se a mais airosa também para o Presidente da República.

Pela primeira vez desde que chegou a Belém, Marcelo viu-se esta semana confrontado com populares apresentando-lhe diretamente a fatura pelo seu apoio ao Governo e à ação (inação) do Executivo.
Foi em Murça e o tom da confrontação – em claro desrespeito pelo estatuto e pela função presidencial – não podem deixá-lo indiferente.

Com a proximidade do final do ano, vale a pena lembrar e tentar cumprir o que manda a voz comum: Ano Novo, vida nova!

Marcelo, já alertado, tem de saber exigir ao Governo que governe em razão dos interesses do país e dos portugueses e não dos seus interesses partidários, clientelares ou de conservação do poder pelo poder.

E António Costa tem de deixar-se de arrogâncias e autismos e começar a habituar-se a que o Governo tem de ter rumo e estratégia para o país.

Goste-se ou não, Pedro Nuno Santos era dos poucos fazedores deste Executivo (com o ministro da Administração Interna, José Luís Carneiro, que merece a devida menção).

E o Governo não pode continuar a adiar a resolução dos problemas estruturais e de responder aos desafios inadiáveis do país. De outro modo, continuará enredado em sucessivos casos e casinhos enquanto a pobreza aumenta.
Veremos o que nos reserva o Ano Novo.