Marcas de uma governação falhada

Os 13 governantes substituídos em apenas 9 meses, não são um dano colateral da agressão russa. São o resultado direto do fraquíssimo critério nas escolhas do primeiro-ministro.

A recente entrevista do primeiro-ministro à RTP1,  foi uma oportunidade perdida, que não acrescentou nada de novo à instabilidade e à crise política com que Portugal está confrontado. De resto, tendo levado a maior parte do tempo a contornar  perguntas, cavalgando a propósito de tudo o argumento externo da guerra na Ucrânia, António Costa só reforçou a evidencia da fragilidade e da incapacidade do governo superar as suas próprias circunstâncias.

Os 13 governantes substituídos em apenas 9 meses, não são um dano colateral da agressão russa. São o resultado direto do fraquíssimo critério nas escolhas do primeiro-ministro, que não viu drama em convidar para ministros e secretários de Estado, pessoas  envolvidas em casos graves e públicos, de natureza  institucional e até criminal, recrutados quase sempre no esconso do aparelho partidário puro e duro. A cada mudança, corresponderam problemas muito sérios. E sobre cada um deles, exigia-se que o primeiro-ministro tivesse dado respostas.

A falta de reformas capazes em áreas essenciais da governação, com exemplos na Saúde, no Ensino e na Agricultura, não tem nada que ver com a loucura de Vladimir Putin, em Moscovo. A razão da incapacidade encontra-se no âmago do Terreiro do Paço, em Lisboa. Os problemas crescentes no SNS não se resolvem com ideologia, os dramas dos professores não se tratam com reuniões inconsequentes e as reivindicações dos agricultores não desaparecem, extinguindo-se a secretaria de Estado. Por isso é que cada vez mais médicos optam pelo setor privado, os professores estão há semanas nas ruas, em vez de motivados nas escolas a ensinar e ao agricultores saíram dos campos, para  protestarem bem alto  nas cidades, de Mirandela a Lisboa.

A execução miserável dos cerca de 19 mil milhões de euros do Programa de Recuperação e Resiliência, que decorrido mais de um terço do prazo apenas está em perto de 9%, num desperdício imperdoável de fundos comunitários cruciais e estratégicos para a nossa economia, é até mais grave, precisamente ponderados os impactos do conflito militar a Leste.

E ficou claro que as 36 perguntas para escrutínio de governantes, não são mais do que um número publicitário usado em tempos de crise, para enganar incautos. Assumindo que não as aplicará aos atuais ministros e secretários de Estado, António Costa confessa que em causa nunca estiveram razões de princípio..

Claro que, pelo caminho, os últimos dados do INE sobre o crescimento  económico, ajudarão o governo na tentativa de fazer esquecer,  tudo aquilo de que  António Costa não quer falar. Acontece que se os portugueses estiverem atentos, perceberão que o que estes números verdadeiramente revelam, é que Portugal demorou muito mais tempo do que os outros países da UE a reagir à pandemia e aos efeitos da guerra.

O crescimento económico de Portugal, entre o 4º trimestre de 2019 e 4º trimestre de 2022, foi inferior ao da UE27 (2,6%  contra 2,9%). Por seu lado, o crescimento entre o 4º trimestre de 2019 e o final de 2021 foi negativo (-1%) e muito inferior aos países da dimensão de Portugal: Irlanda (+14,5%), Estónia (+7,1%), Dinamarca (+6,3%), Noruega (+4,9%) ou Suécia (+4%).

Acresce o crescimento da taxa de desemprego e do número de subutilização de trabalhadores, que pelas variáveis demonstra que o crescimento económico não é estrutural e gerador de emprego, antes resultando da recuperação de efeitos negativos, como a pandemia ou a subida dos preços.

Tudo sopesado, o maior desafio para eleitores em relação às escolhas futuras, estará na capacidade de saberem distinguir as marcas de uma governação falhada, da eficácia da propaganda e das dinâmicas criadas por sondagens falsas, mas pagas a peso de ouro.