Le Corbusier é o pseudónimo de um arquiteto francês de origem suíça, nascido em 1887, considerado um dos pais da arquitetura moderna.
Criou um novo paradigma de urbanismo, ao propor a habitação em altura, em blocos assentes sobre pilares (pilotis) com o rés-do-chão livre. Em lugar de viverem em moradias ou blocos baixos, que ocupam grande parte da área disponível, os habitantes das cidades passariam a viver em edifícios com muitos apartamentos que não ocupariam espaço ao nível do solo. Este seria destinado a percursos pedonais, jardins e áreas de lazer.
O modelo criado por Le Corbusier representou uma revolução nos conceitos urbanísticos e foi aplicado em cidades-satélite pelo mundo fora.
Dou este exemplo para mostrar que de vez em quando surgem visionários com ideias novas que transformam por completo os padrões estabelecidos. Ora, julgo que estamos à beira de um momento desses. Não na arquitetura propriamente dita mas na própria arquitetura do poder.
O mundo está em mudança acelerada. Muitas pessoas já não vão ao emprego e trabalham em casa, para empresas situadas às vezes a milhares de quilómetros de distância. Não cozinham mas também não vão ao restaurante: contactam um serviço que lhes leva comida ao domicílio. Os táxis tornaram-se obsoletos: toda a gente tem aplicações que permitem chamar um carro de aluguer, tipo Uber. As máquinas fotográficas levaram o mesmo caminho, com os telemóveis equipados com essa função. As enciclopédias desapareceram, substituídas por gigantescos arquivos online onde se acumula uma informação infinita. As línguas pátrias são trocadas pelo inglês, que já é a língua oficial em muitas universidades em todo o mundo. As cozinhas tradicionais de cada país dão lugar à fast food – hamburgers, pizzas, etc.. As grandes marcas globais, Apple, Microsoft, McDonald’s, Coca-Cola, substituem as marcas nacionais. As relações pessoais perdem-se a favor das conversas nas redes sociais. As cartas e postais de correio desapareceram com a invenção dos e-mails.
A família tradicional está em vias de extinção: as pessoas vão tendo ligações ao longo da vida, com filhos de uns e de outros, quando os há. Os casais têm menos filhos. As famílias em casa já não se juntam no mesmo espaço, nem sequer a ver televisão: cada um está no seu canto a olhar para o telemóvel ou para o computador pessoal. As mulheres abortam gratuitamente nos hospitais públicos. As pessoas trocam de sexo em operações pagas pelo Estado. As crianças desprezam os brinquedos e passam o tempo livre a jogar jogos eletrónicos, geralmente de grande violência. Nas escolas deixou de haver exames. As cidades enchem-se de ciclovias pouco frequentadas, onde se pode circular de bicicleta, trotineta ou skate. O comércio de rua desaparece, substituído por conglomerados de estabelecimentos reunidos em centros comerciais. Os mercados e as lojas de alimentação seguiram o mesmo caminho, substituídos pelos supermercados. Os jornais em papel cedem lugar à informação online. O pagamento em dinheiro perdeu importância e há sítios onde já não é aceite, exigindo-se o pagamento eletrónico. A população europeia é rendida por imigrantes vindos de toda a parte. O debate político transferiu-se dos parlamentos para os estúdios televisivos. Enfim, o rol não acaba e daria origem a um livro ou a uma biblioteca inteira.
Acontece que, se na sociedade se observam mudanças radicais, ainda não se encontraram novas formas de governo. A organização política dominante no Ocidente é basicamente a que existia no século XIX, depois das revoluções liberais: um chefe do Estado que não governa, um Governo que concentra em si o poder executivo, um Parlamento que fiscaliza o Governo e produz leis. E depois uma Justiça independente dos outros poderes.
A sociedade mudou radicalmente mas a organização do Estado mantém-se a mesma de há dois séculos.
Ora, julgo que estamos no limiar de grandes mudanças. O afundamento dos partidos históricos tradicionais – socialistas e democratas-cristãos – a multiplicação em toda a Europa de partidos extremistas de esquerda e de direita, faz-me pensar que algo de muito importante vai acontecer. Vê-se muita gente descontente, assiste-se ao descrédito da classe política, multiplicam-se os casos de corrupção. O fascismo e o comunismo criaram novos modelos, que se revelaram uns fiascos. Mas o mundo não pára.
Mais cedo ou mais tarde surgirá um Le Corbusier que inventará na política um novo paradigma. Um modelo ajustado aos novos tempos, aos novos hábitos.
Claro que estamos a falar do Ocidente. Na Rússia, na China, no mundo árabe vivem-se tempos diferentes. Dominam as ditaduras e há sociedades que funcionam à maneira medieval, como se o tempo não tivesse passado.
Mas essa é outra questão.