por Raquel Paradela Faustino
Jurista e Porta-voz do CDS-PP
A gentrificação é o processo de reabilitação urbana que envolve a transferência de jovens e iniciativas culturais para zonas no centro, normalmente envelhecidas, atraídos pelo acesso a rendas baixas e pela formação de polos culturais e artísticos que oferecem uma intensa agenda cultural. Este processo recupera o interesse e a procura nesse bairro, valorizando novamente as suas características naturais de autenticidade, localização e proximidade.
Esta nova vida, jovem e artista destes bairros e áreas urbanas, cheia de vivacidade e uma frequência mais desejável, desperta rapidamente o interesse especulativo imobiliário de investidores e moradores com maior capacidade económica.
Numa primeira fase, os jovens e os coletivos de artistas contribuíram para o progressivo processo de gentrificação com a sua mudança para esses centros. Em Lisboa este processo foi particularmente incentivado pelo poder local, na valorização de determinadas áreas da cidade, como a Mouraria e o Largo do Intendente, com o intuito de melhorar a frequência e a segurança dos seus moradores e comércios.
A segunda fase é sempre menos desejada, mas evidentemente incontornável. É a etapa em que esses jovens e coletivos de artistas que deram início ao processo de mudança e valorização na composição de um bairro, são forçados a sair, e o que eram os ‘marginais gentrifiers’ (estes jovens que são uma franja menos privilegiada da classe média, com uma significativa disparidade entre as suas qualificações e a sua baixa capacidade económica, que valorizam estas áreas antigas do centro, pela sua autenticidade, proximidade, comércio e os seus bairros históricos tradicionais) como habitantes habituais, passam a ser substituídos por ‘consumidores mainstream’ e empresas de investimento de condomínios de luxo.
Olhando para a atual crise habitacional em Portugal, é por demais evidente como estas políticas públicas foram mal geridas, mal antecipadas e muito contraditórias.
Poucos meses antes da apresentação das medidas para a habitação do Governo, o Politécnico de Lisboa com o intuito de financiar a construção da sua Escola Superior de Dança, cede ao interesse da especulação imobiliária e tenta vender ao melhor preço de mercado os seus prédios no bairro alto. Prédios esses que deveriam ser utilizados e reabilitados pelo estado, aumentando o acervo de imóveis para arrendamento acessível.
Ao invés, a sua venda permitirá apenas a construção de mais um condomínio de luxo para habitação, no centro de Lisboa, inacessível ao comum dos portugueses.
É incompreensível, esta falta de planeamento que por um lado projeta a gentrificação de bairros urbanos para mais tarde a controlar e reverter.
É incompreensível que com a importância que foi dada pelo primeiro-ministro à habitação só este ano foi capaz de concluir o levantamento que identificou mais de quatro mil imóveis devolutos com aptidão habitacional. A Estratégia Nacional para a Habitação 2015 – 2031 ficou bem no fundo da gaveta.
É incompreensível que havendo capacidade de resposta imobiliária no estado, as soluções que o Governo apresenta são sempre coxas e de preferência impostas ao setor privado.