“O mercado do arrendamento não está bom para inquilinos nem para senhorios”

Teresa e Rui querem arrendar casa, mas não têm dinheiro suficiente (apesar de auferirem ordenados distintos). Já Patrícia e Carlos têm receio de arrendar os seus apartamentos após más experiências.

A maioria dos jovens fica em casa dos pais ou outros familiares até tarde. Ou encontra outra forma de poupar, partilhando casa com amigos. Em setembro do ano passado, era noticiado que os jovens portugueses foram os que, na União Europeia (UE), saíram mais tarde da casa dos pais em 2021, numa média de idades de 33,6 anos. Isto é, acima da média comunitária de 26,5 anos, segundo o Eurostat. Os dados revelavam que, há dois anos, os Estados-membros da UE nos quais os jovens deixaram mais tarde o seu agregado familiar foram Portugal (33,6 anos), Croácia (33,3 anos), Eslováquia (30,9 anos), Grécia (30,7 anos) e Bulgária (30,3 anos).

Teresa Viegas vive com a mãe e, agora, também com o namorado, mas não sabe como é que se têm mantido no apartamento que arrendaram em Carnaxide, no concelho de Oeiras. É que pagam 1000 euros por um T2 e a jovem de 25 anos aufere apenas 810 euros líquidos.

“Eu e o meu namorado dividimos a renda, 500 euros para cada um. Com o valor que me sobra do ordenado, cerca de 300 euros, pago as minhas despesas (combustível, prestação da mota e necessidades do dia-a-dia). Ele também tem as suas despesas, mas ajuda nas compras do supermercado e o que resta da pensão da minha mãe ajuda a pagar as contas… Não nos sobra praticamente nada, estamos literalmente a sobreviver”, confessa a rapariga. “Conseguimos fazer as compras do supermercado com muita atenção, o mais barato possível: mas conseguimos”.

Em relação ao estudo do gabinete estatístico, a Suécia (19 anos), Finlândia (21,2 anos), Dinamarca (21,3 anos) e a Estónia (22,7 anos) registaram as idades médias mais baixas, todas com menos de 23 anos. O_Eurostat observou que “na maioria dos países do norte e oeste, os jovens deixaram a casa dos pais, em média, entre o início e meados dos anos 20, enquanto nos países do sul e leste, a idade média foi no final dos 20 ou início dos 30”.

“Ando constantemente à procura de casa. Tenho visto T2 em Oeiras e arredores com rendas entre os 800-1000 euros. Apartamentos muito mais pequenos do que o meu, alguns em condições… deploráveis. A precisar urgentemente de remodelação, mas ainda assim a preços exorbitantes. Já para não falar das condições de arrendamento: normalmente, algo como: caução no valor de 2 (às vezes 3) rendas + 1 renda adiantada + fiador”, lastima Teresa, questionando:_“Com uma renda de 800 euros, 2 cauções são 1600. Mais uma renda adiantada são 2400… Mais fiador? Quem é que vai ser fiador de uma renda no valor de um ordenado?”.

Em média, na UE, os homens deixaram a casa dos pais com 27,4 anos e as mulheres com 25,5 anos em 2021. Segundo o Eurostat, esta tendência foi verificada em todos os países, pelo que as jovens saíram do agregado familiar em média mais cedo do que os jovens. O Eurostat constatou igualmente que os homens deixaram o seu domicílio parental, em média, após os 30 anos em 11 países da UE (Croácia, Portugal, Eslováquia, Bulgária, Grécia, Eslovénia, Itália, Malta, Espanha, Roménia e Polónia), sendo que isto aconteceu nas mulheres em somente dois países (Portugal e Croácia).

Numa situação semelhante à de Teresa encontra-se Rui Cardoso, de 41 anos, que trabalha na função pública e tem um rendimento de cerca de 1215 euros. Separou-se da agora ex-companheira há pouco tempo e teve de regressar a casa dos pais porque não tem dinheiro suficiente para pagar uma casa na capital. “Lisboa? Nem pensar. É que antes ainda podia ponderar sítios que eram mais baratos como a Amadora, Odivelas, mudar-me para Sintra… Neste momento, honestamente, não vejo diferença nenhuma entre os diversos concelhos”, explica. “Isto está cada vez pior e tenho medo de nunca mais ter independência”.

“É complicado viver fora de casa há 11 anos e estar a voltar para perto dos meus pais com esta idade. A questão é que não sou o único: somos cada vez mais as pessoas nesta situação porque é completamente incomportável suportar os preços atuais das rendas”, sublinha Rui. “Conheço pessoas, por exemplo, que estão em relacionamentos péssimos, que simplesmente nunca funcionaram ou já não funcionam, e continuam com aquelas pessoas porque não têm recursos financeiros para sair de casa. Isto é triste e não pode continuar a acontecer”, frisa. “Em que país vivemos?”, pergunta.

Estas são algumas das dificuldades de quem procura casa, mas será que quem as arrenda também enfrenta outras? Patrícia Soares é proprietária de um apartamento T2 em Sintra e já teve dissabores relativos ao arrendamento do mesmo. Por exemplo, em 2007, gastou aproximadamente 400 euros na mudança da fechadura da porta de entrada porque um dos membros da família que vivia na casa colocou um objeto estranho para que ela não conseguisse abrir a porta.

Além disso, as condições em que a mesma se encontrava deixavam muito a desejar. “A higiene era quase inexistente, entravam e saíam pelas janelas porque é um rés-do-chão… Enfim, arrependo-me profundamente de a ter arrendado, mas era uma família de cidadãos brasileiros que tinha chegado a Portugal há pouco tempo e precisava de um sítio para morar”, explica.

Mesmo assim, a proprietária de outro apartamento, sendo este um T3 no concelho de Oeiras, não perdeu totalmente a confiança nas pessoas e emprestou a casa a um conhecido. “Era um cidadão marroquino que precisava de um sítio para viver durante três ou quatro dias. Quando me apercebi, ele já não estava cá, tinha ido para Marrocos, e deixou a mulher e os dois filhos menores dentro de casa”, conta. “Quando tentei que eles saíssem, a senhora chamou a PSP alegando que estava a ser assaltada. Os polícias ainda olharam para mim com um olhar de arrogância como se eu é que estivesse a ocupar uma propriedade privada indevidamente”, lamenta. “Só conseguirei resolver este problema pelas vias legais”.

Tal como Manuel, de Lisboa, que ficou com a casa destruída – ficando até sem as torneiras – seis meses depois de ter feito obras teve de voltar a investir em intervenções e, mesmo assim, a mesma permanece inabitada. Já Carlos Barbosa, proprietário de cinco apartamentos (T2 e T3) no centro do Porto, narra dificuldades distintas, mas que o levam igualmente a não querer ver mais ninguém nas suas casas. “A maioria das pessoas não paga as rendas nos dias que estipulo. Sou paciente mas, ao longo dos anos, tenho vindo a ficar cansado e acho que já não se justifica. Tenho muitos mais pontos negativos do que positivos. Portanto, provavelmente, vou tentar vender as casas e pôr um ponto final nisto”, resume.

“Arrendar casas já foi um bom negócio, mas hoje só dá dores de cabeça. Quem julga que os senhorios só ganham dinheiro e ficam ricos está muitíssimo enganado”, realça. “Sei que há quem seja sério e pague a tempo e horas, mas o mercado do arrendamento não está bom para inquilinos nem para senhorios. Por um lado, quem precisa de um lugar para viver tem de pagar, habitualmente, um preço que não é compatível com o ordenado que ganha. E quem quer arrendar mantém o mesmo valor durante anos, reduz ou aumenta e é mal encarado. É muito complicado”.