Opiniao

PSD: A receita para o fracasso

O PSD não tem conseguido demonstrar aos portugueses que Portugal estaria melhor com Montenegro ao leme. Prova disso mesmo, é o facto de nessa mesma sondagem, uma larga maioria dos portugueses não querer novas eleições e preferir claramente que Costa e o PS governem até 2026.

PSD: A receita para o fracasso

por Jorge Costa Rosa

Com a direita completamente fragmentada desde a saída de Pedro Passos Coelho da vida política, e com o nascimento (à direita) da IL e do CHEGA, seguiu-se, no PSD, a liderança desastrosa e falhada de Rui Rio, que se mostrou - na minha opinião - o pior líder da História dos sociais-democratas. Isto, porque conseguiu conjugar três ingredientes perfeitos para a implosão eleitoral do partido:

i) a inércia total de oposição (facilmente ilustrada, de forma exemplificativa mas simbólica, com o fim dos debates quinzenais);

ii) a tentativa falhada de assumir o PSD como um partido de centro-esquerda;

iii) e a (incongruente) falta de clareza quanto a entendimentos com o CHEGA.

Foi esta receita do “chef” Rio que nos conduziu a uma inesperada e improvável maioria absoluta do PS de Costa em 2022. E foi assim, neste contexto negro (mas absolutamente previsível) para a direita, que nasceu a nova liderança de Luís Montenegro que se apresentou como uma “lufada de ar fresco” para comandar uma oposição renovada ao Partido Socialista, munido da aura de quem tinha liderado a bancada parlamentar do PSD nos tempos de Passos. Contudo, a sua liderança acabou por consubstanciar-se numa enorme desilusão para o espaço ideológico que pretendia representar. Tanto o “chef” como a receita mudaram, mas, ao que parece, o resultado mantém-se.

Ao contrário do primeiro ingrediente da receita Rio - a inércia de oposição - a liderança de Montenegro mudou, de facto, o paradigma. Mas nem por isso, para uma estratégia mais inteligente. Ao invés de se demitir de fazer oposição como o seu antecessor, Montenegro tem optado por fazer uma oposição sensacionalista e demagógica assente na lógica dos “casos e casinhos”, comentando e apontando falhas ao Governo de acordo com a espuma dos dias e com os escândalos e demissões que têm pautado esta legislatura. Ora, basear a actuação política do maior partido da oposição nos casos que surgem na capa do Correio da Manhã é um erro, não só porque o PSD - sendo um partido de poder - também tem “rabos de palha”, mas sobretudo porque cultiva a imagem (falaciosa e nefasta para a Democracia) de que os políticos são todos iguais. Basear o discurso político no conteúdo das conversas de café e nas gordas dos tablóides, alastra a sensação de impunidade e de corrupção nas instituições democráticas, e - escusado será dizer - só beneficia o discurso populista e antissistema do CHEGA. Mas como veremos, Montenegro não tem quaisquer pruridos nem em utilizar um discurso populista, nem em beneficiar o partido do seu ex-companheiro de PSD.

Todavia, a receita do “Chef” Montenegro não fica por aqui. Ao invés de afirmar o PSD como um partido de centro-esquerda - como fez Rio - Montenegro volta a colocar o PSD no seu lugar: à direita do espectro político. O problema é que Luís Montenegro não tem pedalada para acompanhar os malabarismos do contorcionista António Costa - o político português mais habilidoso da actualidade. O Primeiro–Ministro, com a geringonça, conseguiu: fragmentar a direita (matando o CDS e desnorteando o PSD); esvaziar o discurso do PCP colando-o às políticas do Governo (colocando o PCP em coma profundo); e aniquilar eleitoralmente o Bloco de Catarina Martins, que entrará agora - com a liderança de Mortágua - nos cuidados paliativos da política nacional.

Isto tudo, ao mesmo tempo que secou o centro todo para o PS - centro esse, que para os mais distraídos, é onde se ganham as eleições - com uma política de contas certas “vendida” aos portugueses de forma eficaz, em contraposição com a comunicação desastrosa e pesarosa da austeridade da direita passista. Centeno cativou, Costa cortou, Leão perpetuou, e os portugueses apertaram o cinto na mesma. Mas fizeram-no enquanto os violinos da comunicação (eficaz e inteligente) do PS tocavam aos seus ouvidos. No fim de contas: contas certas, a conviver em simultâneo com uma sensação de melhoria das condições de vida dos contribuintes. Não fossem os obstáculos inesperados da pandemia, da guerra da Ucrânia e da inflação, e a sensação de bem-estar ainda se mantinha, ao mesmo tempo que as contas iam - de facto - batendo certo. E quem se “lixa”? O SNS, os professores, os oficiais de justiça, entre outros. Mas isso fica para outro artigo.

Desta forma absolutamente habilidosa, Costa conseguiu deixar o PSD de Montenegro sem discurso político. É esse mesmo, pois, o segundo ingrediente da liderança de Montenegro: a falta de alternativa e a ausência total duma ideia de país. E vou mais longe: duma ideia para o país. Montenegro (e a sua corte da São Caetano à Lapa) não conseguem apresentar-se como uma alternativa credível aos portugueses, precisamente por não possuírem uma ideia de país alternativa da de António Costa. Um novo rumo. Não sou só eu que o digo, é o próprio Presidente da República que o admite. O PSD de Montenegro não é uma alternativa ao actual Governo, porque Montenegro não é - por muito que queira - o líder da direita. E é simples: não havendo um líder, não existe uma alternativa.

As últimas sondagens e estudos de opinião demonstram precisamente isso. O PSD beneficia, é certo, duma queda do PS, mas não cresce praticamente nada. Vai ganhando, portanto, por falta de comparência. E porquê? Porque apesar do descontentamento recente com os socialistas, o PSD não tem conseguido demonstrar aos portugueses que Portugal estaria melhor com Montenegro ao leme. Prova disso mesmo, é o facto de nessa mesma sondagem, uma larga maioria dos portugueses não querer novas eleições e preferir claramente que Costa e o PS governem até 2026. Isto para não falar do facto dos estudos de opinião revelarem que os portugueses preferiam comprar um carro em segunda mão ao Primeiro-Ministro, ao invés de o comprarem a Montenegro. E quem é que os pode censurar?

Estou certo que os portugueses não sabem de cor nenhuma proposta do PSD, nem nenhuma ideia ou reforma pretendida por Montenegro. Assim como Rio, Montenegro está à espera que o Governo lhe caia no colo, sem que para isso tenha que se sentar com os seus companheiros de partido a pensar o país.

Contudo, a receita do Chef Montenegro (infelizmente) ainda não acabou. Como se o prato não estivesse mau o suficiente, Luís Montenegro coloca - agora sim - o mesmo terceiro ingrediente que Rui Rio: a falta de clareza quanto a entendimentos com o CHEGA. Este foi o maior tiro no pé de Rio, e Montenegro insiste grosseiramente em cometer o mesmo erro. É conhecido e público o meu desprezo pelo CHEGA e por qualquer figura, ou força política, que viva da demagogia, do populismo e da estratégia do “nós contra eles”. E já deixei claro no meu podcast - Bancada Paralamentar - que se as eleições fossem hoje e eu tivesse de escolher entre o PSD de Montenegro aliado com o CHEGA, ou o Partido Socialista, eu votaria PS - sem hesitar. Mas se por princípio e por respeito aos valores liberais da sociedade ocidental, Montenegro e a cúpula social-democrata que o rodeia (Pinto Luz, Balseiro Lopes e companhia) não são capazes de se demarcar do CHEGA, então que o façam por tática.

É, para mim, inexplicável esta estratégia de esconder dos portugueses se o PSD se coliga, ou não, com o CHEGA nas próximas legislativas. Já toda a gente percebeu que Montenegro não teria quaisquer pruridos em partilhar o Executivo com Ventura e os “taberneiros” que o rodeiam. É o segredo mais mal guardado da actualidade política. Só Montenegro é que ainda acredita que os portugueses são burros ao ponto de não perceberem o seu plano. Já Ventura tem plena noção disso, e tem sabido capitalizar esse facto - como seria de esperar.

Mas será que Montenegro não percebe que ao passar a imagem que o PSD se coliga com Ventura para vencer o PS, está a legitimar e a incentivar o voto no CHEGA? Está a dizer aos portugueses que votar no PSD ou no CHEGA é igual - visto que, no fim de contas, será um voto contra Costa. Que é precisamente aquilo que muitos eleitores precisavam para votar no CHEGA: a convicção que tornaria um governo da direita mais musculado e radical. Ao invés de mostrar que um voto no CHEGA é um voto desperdiçado, a mente brilhante de Montenegro acha por bem fazer com que Ventura obtenha o seu melhor resultado - talvez na ingénua e falsa esperança de absorver o seu eleitorado.

Alguém pode explicar a Montenegro a velha estratégia do “voto útil” perpetrada pelo PSD, que levou tantas vezes o CDS às cordas, encurralando-o como o partido do táxi?

Por fim, e infelizmente, Montenegro não se limita a legitimar o voto em Ventura. Imita-o. Ora dizendo que temos de ser mais selectivos na imigração, no seguimento do ataque cobarde a um imigrante em Olhão; ora chamando comunista a António Costa, no seguimento do pacote de medidas para a habitação. Relativamente à subida dos preços dos bens essenciais, o líder social-democrata limita-se a dizer que o Governo é que está a “assaltar” os portugueses, por ter aumentado a receita do IVA. Populismo fiscal a uma hora destas? O que se segue? Alinhar no populismo penal de Ventura? Será que Joaquim Miranda Sarmento não sabe que o facto da receita do IVA aumentar, é uma consequência natural e automática da subida dos preços? Ou sabe, mas ainda assim permite que o seu líder faça demagogia barata? Enfim, Luís Montenegro faz política com os pés e demonstra perceber tanto disto, como eu de patinagem artística.

Mas a pergunta que se coloca é: Como é que não há ninguém na cúpula do PSD, ou na entourage de Montenegro, que lhe explique que a estratégia de normalização do voto no CHEGA é uma estratégia eleitoralmente suicida, que deu a maioria absoluta ao PS de Costa? Não há assessores no PSD?

E o PS lá vai sobrevivendo nos destinos do país, com 13 demissões num ano de Governo, beneficiando do crescimento do CHEGA e da estratégia falhada do PSD. E bem. Da mesma forma que nunca coube à direita tradicional vencer a esquerda radical, mas ao PS; também não é ao PS que cabe vencer o CH. São os partidos de direita que disputam o seu eleitorado, que têm a possibilidade (e a obrigação por questões de sobrevivência) de o desbaratar eleitoralmente. Assim como Soares fez com Cunhal, e como Costa acabou por fazer com Catarina e Jerónimo.

E é assim, com um novo “chef” (Montenegro) e uma receita ligeiramente diferente - mantendo apenas o incentivo do voto no CHEGA - que se produzirá o mesmo resultado: conduzir o PSD (aquela que foi a grande casa do espaço do centro-direita em Portugal) a um papel de irrelevância política e de dependência dos pequenos partidos à sua direita - que já demonstraram, nos Açores, as consequências da sua imaturidade democrática. Sobretudo, e mais grave, na dependência dum partido populista da direita radical. O centro, esse, fica para o PS que - sobretudo por falta de comparência do seu adversário tradicional - se consolida cada vez mais como o partido do regime “à la” mexicana. E ninguém liga…

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