Previsões positivas mas há riscos

As previsões da Comissão Europeia para Portugal são positivas mas há riscos como é o caso da dependência do turismo ou da inflação. Especialistas explicam ao Nascer do SOL o que esperar daqui para a frente.

Previsões positivas mas há riscos

A economia portuguesa deve «crescer o dobro da União Europeia». Quem o disse foi Paolo Gentiloni, comissário europeu com a pasta da Economia na apresentação das previsões da Comissão Europeia que espera que o PIB avance 2,4% este ano. É uma melhoria face aos 1% estimados em fevereiro.

Para Paulo Rosa, economista do Banco Carregosa, esta previsão é «confortavelmente realista», diz ao Nascer do SOL, defendendo o que vai puxar pela economia portuguesa este ano. «A dinâmica positiva do setor turismo e o aumento da população empregada, já muito perto dos 5 milhões de trabalhadores, mantêm a resiliência da economia portuguesa, tendo permitido revisões em alta do crescimento do PIB real para 2023 tanto pelo Executivo português como por diversas instituições nacionais e internacionais». 

E o que pode prejudicar as projeções de crescimento para este ano? O economista responde também e destaca «a crescente deterioração do rendimento disponível, que pela elevada inflação quer pela subida dos juros, poderá colocar em causa as atuais perspetivas otimistas para o crescimento do PIB português este ano». 

Sobre como deverá evoluir a economia no segundo trimestre do ano, o economista do Banco Carregosa detalha que nos primeiros três do ano, o PIB real (em volume) aumentou em cadeia 1,6%, ou seja, de 52.852 milhões de euros no último trimestre de 2022 para 53.700 milhões de euros no primeiro trimestre deste ano. «Assim, mesmo que a riqueza produzida nos restantes três trimestres tenha um crescimento nulo, uma alta do PIB de pelo menos 1% em 2023 já estaria garantida, em grande parte empurrada não só pelo aumento da população empregada, mas também pelo turismo, devendo este intensificar-se nos meses de verão». E as contas externas melhoram gradualmente, impulsionadas pelas exportações, sobretudo pelo maior contributo do turismo, «esperando-se que as importações abrandem à medida que o rendimento disponível se deteriora, penalizado pela elevada inflação e pela subida das taxas de juro», detalha o economista. Por isso, espera-se que o crescimento económico «se mantenha resiliente no 2.º trimestre, impulsionado novamente pelo turismo, tendo o verão à porta, e pelo crescente aumento da população empregada».

E defende ainda ser provável que mais instituições e o próprio Executivo português, «venham nas próximas semanas rever em alta as suas projeções de crescimento, sendo, atualmente, um crescimento à volta dos 2,5% o mais plausível». Mas há alertas: «A economia é a dinâmica e muitas surpresas existirão até ao final do ano, tendo em conta o crescente aumento das taxas de juro pelo BCE, deteriorando constantemente o rendimento disponível das famílias e desincentivando o investimento das empresas, bem como uma eventual recessão nos EUA».

Já Pedro Assunção, Chief of Officer da Forste, diz ao nosso jornal que os dados da Comissão Europeia «são boas notícias para o país que resultam sobretudo do facto de o inverno na Europa não ter sido, nem de perto nem de longe, tão mau em termos económicos como se esperava, e de um aumento continuado da atividade turística em Portugal». Para o especialista é claro que o turismo «foi o principal motor de uma surpresa na taxa de crescimento do PIB no primeiro trimestre» mas há alertas uma vez que «a procura interna mantém-se bastante fraca e isso é um fator preocupante».

No entanto, o analista diz que para estas estimativas favoráveis se concretizarem, «será necessário não só que o contributo do turismo se mantenha forte, mas que haja uma recuperação da procura interna (consumo e investimento privado)». 

Pedro Assunção diz que o ano mais forte que se espera para a economia portuguesa não significa uma quebra mais abrupta nos anos seguintes. «A eventualidade de uma recessão na economia existe obviamente para final de 2023 e 2024, mas no nosso entender, este arranque forte de 2023, à custa de um forte aumento da procura externa, não aumenta a probabilidade dessa recessão acontecer». Assim, o crescimento mais forte este ano «só agravaria a situação esperada para os anos seguintes se em 2023 forem agravados desequilíbrios ou se se estiver a antecipar de alguma forma crescimento futuro para esse ano», algo que o analista não prevê que aconteça. 

Por sua vez, Henrique Tomé, analista da XTB, não tem dúvidas que os dados da Comissão Europeia «são boas notícias para Portugal». Mas atenção: «Portugal tem muito a fazer para que o crescimento económico nacional seja sustentável e comparável com o crescimento de outros países da zona euro». O analista diz que é importante salientar que existem fatores de risco que podem fazer com que estas previsões venham a ser revistas em baixa «como por exemplo o caso da inflação se manter elevada e o poder de compra dos consumidores continuar a diminuir o que levará a um impacto a longo prazo na atividade económica que se irá refletir no PIB».

Inflação abranda

As previsões de Bruxelas melhoram a projeção da taxa de inflação em Portugal para 5,1% este ano, esperando uma moderação para 2,7% em 2024, refletindo inicialmente os preços da energia e depois dos bens alimentares. 

Paulo Rosa lembra que os preços tenderão a desacelerar o ritmo de subida. «Uma descida de preços, sinónimo de deflação, não é expectável diante das projeções de crescimento económico, mas não invalida que haja descidas dos preços de alguns bens e serviços. Todavia, uma descida generalizada dos preços, ou seja, fenómeno de deflação, só seria expectável num contexto recessivo da economia».

Por sua vez, Pedro Assunção diz que a queda da inflação, mesmo para 2024, «não é ainda suficiente para que objetivo dos 2% seja atingido, pelo que vamos viver nos próximos dois anos, pelo menos com mais inflação do que estamos habituados». Diz ainda o economista que os ganhos na inflação até devem ser relativamente rápidos ao longo do resto do ano, «mas depois disso a queda deve ser mais lenta».

E Henrique Tomé diz que apesar de se ter observado a taxa de inflação a descer, «o seu impacto na economia real é, de facto, muito reduzido». O analista diz ser necessário que a atividade económica abrande ainda mais «para que seja possível notar uma descida nos preços, porém, se isto acontecer então o crescimento económico poderá ser penalizado». Dito isto, o analista acredita que é necessário abrandar ainda mais o consumo «até que possamos ver realmente efeitos reais na economia no que diz respeito a baixas nos preços».

O Chief of Officer da Forste lembra que qualquer crescimento económico «é benéfico para os portugueses e por isso estes números são sempre bons». Defende também que o crescimento está muito concentrado no boom de turismo «que obviamente beneficia mais umas regiões que outras». Para que o crescimento económico beneficie todos, Pedro Assunção defende que deveria ser mais «disseminado, nomeadamente abarcando mais a indústria e serviços não relacionados com o turismo», defendendo que seria útil que os fundos do Portugal 2030 e PRR «fossem aplicados de forma eficiente e mais rápida».

Apoios aos portugueses

O Governo congratulou-se com os dados de Bruxelas e o Presidente da República, Marcelo Rebelo de Sousa, destacou a importância deste crescimento, mas alertou que o importante é que chegue à vida dos portugueses. «Estamos numa fase em que é necessário que a atividade económica abrande para que a inflação fique controlada e para que isso aconteça, teremos de retirar poder de compra aos agentes económicos para que estes comecem a consumir menos, ou seja, para que exista uma diminuição na atividade económica que levará a um reequilíbrio nos preços», comenta Henrique Tomé. No entanto, diz, o Governo tem um papel importante «dado que tem de se garantir que as classes sociais mais vulneráveis à atual conjuntura económica não são ainda mais afetadas por estas medidas».