Spanish bombs

E quando já estiverem completamente alucinados, a ver a dobrar e ouvindo em altos berros Spanish Bombs dos The Clash, poderão finalmente tornar-se governantes responsáveis.

por João Cerqueira

Um estudo sobre o ‘Consumo de Álcool, Tabaco, Drogas e outros Comportamentos Aditivos e Dependências de 2019 do Serviço de Intervenção nos Comportamento Aditivos e nas Dependências’ concluiu que «as abordagens preventivas sobre comportamentos aditivos a que foram sujeitos os alunos do ensino público, com idades entre os 13 e os 18 anos», tiveram um efeito contrário. Ou seja, fizeram-nos beber e consumir mais drogas. Em Portugal acontecem estas coisas. Quando o Estado pretende resolver um problema e, para tal, cria uma comissão de especialistas, peritos e pessoas bem-intencionadas, o problema tende a agravar-se.

As decisões dos órgãos estatais portugueses assemelham-se às do Comissário das Brigadas Internacionais durante a Guerra Civil de Espanha, André Marty, que, no romance Por Quem os Sinos Dobram, Hemingway retrata como um louco incompetente. Sem entender patavina de estratégia militar ou sequer ler cartas militares, punha o dedo num ponto de um mapa e decidia ser aquele o local que os Republicanos deveriam atacar. E os Nacionalistas somavam mais uma vitória.

Nos últimos anos, o Governo não para de anunciar medidas para combater a crise, medidas para melhorar a vida dos portugueses, medidas para resolver o problema do imobiliário, medidas para combater a desertificação, medidas para impedir a fuga de jovens qualificados, medidas para democratizar os urinóis, medidas para acabar com os fumadores, os gulosos e os viciosos, medidas para tudo e mais alguma coisa. Depois, apesar dos sucessivos anúncios de crescimentos acima da média, reduções de défices e outros feitos financeiros nunca antes vistos, Portugal é ultrapassado por outros países e os portugueses continuam a empobrecer.

Logo, torna-se claro que o Governo esteve a proceder como os responsáveis das escolas públicas com as suas abordagens preventivas sobre comportamentos aditivos, ou como o comissário Marty. Em vez de resolver os problemas, agrava-os. A metodologia usada, não só está errada, como ainda é exatamente a oposta à que deveria ser utilizada. Estas são as más notícias. As boas notícias são que não estamos na Guerra Civil de Espanha, e basta fazer tudo ao contrário. Assim, quando os membros do Governo e os seus gabinetes se reunirem para tentarem uma vez mais salvar o país e trazer felicidade aos portugueses, não devem pensar naquilo que julgam ser as melhores soluções para resolver os problemas, mas, sim, nas piores medidas possíveis para dar cabo disto tudo. Como bruxas cozinhando desgraças num caldeirão, vão lançando todos os ingredientes maléficos de que se lembrarem até a poção destrutiva estar completa.

«Como é que vamos dar cabo da Economia? Como vamos destruir o Sistema Nacional de Saúde? Como vamos arruinar a Educação? Como vamos sabotar a Justiça? Como vamos afugentar os licenciados? E o que fazer para acabar de vez com a Cultura?».

Como se tem visto na Comissão de Inquérito à TAP, o Governo dispõe de pessoas extremamente talentosas e com uma imaginação prodigiosa. Com os seus comissários Marty, não lhes será difícil desencadear um brainstorming destinado a riscar Portugal do mapa. Para melhor se inspirarem, poderão até imitar os alunos sujeitos a ações preventivas contra o vício levando garrafas de vinho e charros para os seus gabinetes. E então, quando já estiverem completamente alucinados, a ver a dobrar e ouvindo em altos berros Spanish Bombs dos The Clash, poderão finalmente tornar-se governantes responsáveis que souberam encontrar as melhores soluções para o desenvolvimento do país.