Abutres atacam rebanhos

Os agricultores da Beira Interior estão desesperados por os abutres lhes estarem a comer gado vivo. E culpam o Governo por não ter ainda licenciado campos próprios com carcaças para os abutres se alimentarem, nesta zona do país. É que, ao mesmo tempo, aquelas aves são espécies protegidas, o que impede os agricultores de as…

«é um sofrimento horrível para os animais e, quando vemos o ataque, não podemos fazer nada porque os abutres são aves enormes e protegidas», conta ao sol palmira gonçalves, presidente da associação regional de agricultores biológicos, de penamacor (castelo branco), adiantando que nas últimas semanas são várias as queixas dos produtores de gado sobre o assunto.

as situações ocorrem em produções animais da beira baixa, mas também no norte do alentejo. e só no último mês, por exemplo, chegaram duas queixas ao serviço de protecção da natureza e do ambiente (sepna) do fundão.

palmira gonçalves recorda que, há cinco anos, já tinha acontecido o mesmo: ««em 2006, fiquei sem 90 ovelhas. e agora, há duas semanas, voltei a ver abutres a atacar uma ovelha».

a responsável critica ainda as autoridades por nunca a terem compensado pelos prejuízos.

os agricultores garantem que os ataques aos rebanhos provocam graves perdas financeiras, sobretudo nos tempos de crise que vivem. e exigem que o instituto de conservação da natureza e biodiversidade, da tutela do ministério do ambiente, licencie rapidamente os dois alimentadores (zonas próprias e delimitadas com gado morto para os abutres se alimentarem), que estão fechados por falta de licenciamento.

 

falta de plano estatal
desde 2002, ano em que surgiu a bse (conhecida como a doença das vacas loucas), a união europeia (ue) impôs que todas as carcaças de animais fossem recolhidas pelos agricultores. a medida deixou, no entanto, os abutres com mais dificuldades em alimentar-se, correndo o risco de morrer à fome.

após queixas de vários países, o parlamento europeu aprovou a criação de campos de alimentação nos quais seriam depositados «corpos inteiros de animais mortos».

estes ‘alimentadores de abutres’ teriam de ser licenciados pela direcção-geral de veterinária (dgv) – só que as licenças estão suspensas à espera de um plano do instituto de conservação da natureza e da biodiversidade (icnb), que «já deveria ter sido feito há anos», como denuncia samuel infante, responsável pela conservação destas aves no parque do tejo. «em espanha este plano tem quatro páginas e é muito simples», garante.

além de prejudicar os agricultores, a falta de medidas do governo pode também levar à morte de abutres, avisa samuel infante, responsável do ceras ligado à conservação destas espécies no parque natural do tejo internacional (pnti).

o desespero acaba por levar alguns produtores de gado a querer ‘fazer justiça pela próprias mãos’. o responsável lembra o que aconteceu em 2003, quando 30 destas aves em perigo de extinção foram envenenadas após ataques a rebanhos. na altura, o processo acabou arquivado por não se encontrarem os responsáveis, lembra samuel infante. «já há anos que alertamos o icnb sobre as queixas dos proprietários de ataques de abutres aos rebanhos e no perigo que isso podia representar para as espécies», conta.

mas, até agora, nenhuma estratégia foi implementada. e o icnb admite a falta de um plano. « está previsto que a estratégia para a conservação das aves necrófagas em portugal (2011-2020), seja adoptada brevemente», assumiu ao sol a assessora do organismo, sandra moutinho. admitindo que «subsistem problemas com os dois alimentadores instalados na área do pnti», o icnb diz que ainda não licenciou os locais por estar à espera de um parecer da dgv.

a dgv, por seu lado, não prestou esclarecimentos.

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