Monárquicos europeus celebram, mas as casas reais enfrentam escrutínio sem precedentes

É um menino. George Alexander Louis nasceu às 16h24 de segunda-feira, com 3,9 quilos, pondo fim a horas de ansiedade de uma multidão que se juntava em frente ao Palácio de Buckingham, em Londres. E foi uma festa de massas aquela que marcou a vinda ao mundo do herdeiro da coroa britânica: milhares de pessoas…

um dia antes, em bruxelas, o novo rei filipe, 53 anos, prestou juramento depois do pai, alberto ii, ter renunciado à chefia de estado por razões de saúde. também os belgas celebraram nas ruas o raro momento de união de um país ameaçado pelo separatismo flamengo.

terminada a festa, os próximos dias, anos e décadas vão trazer para filipe e o recém-nascido filho de william e kate algo mais do que o carinho e admiração dos súbditos. sobre ambos recaem as expectativas dos monárquicos europeus, que vêem a peculiar e milenar forma de governo e de representação nacional cada vez mais ameaçada pelo escrutínio dos cidadãos e das instituições. os últimos tempos ficam marcados por múltiplos escândalos, e uma viagem pelo mapa continental das monarquias não poupa quase nenhuma casa real.

tal como na economia, o pior está a sul. a coroa espanhola vive desde 2012 o maior desafio desde o fim do franquismo. a 14 de abril desse ano – por ironia, no aniversário da segunda república espanhola – era publicada uma imagem do rei juan carlos numa expedição de caça no botswana, numa altura em que um em cada três dos seus súbditos se encontrava no desemprego. a viagem foi paga por um empresário de origem síria, e não pelos contribuintes espanhóis, mas o monarca não foi poupado a críticas de rara violência. e seria ainda condenado pelos activistas dos direitos dos animais ao deixar-se fotografar em frente a um majestoso elefante abatido, sendo afastado da presidência honorária da filial espanhola do fundo mundial para a natureza (wwf). no culminar da polémica, juan carlos expressou um inédito pedido de desculpas. “sinto muito. errei. não voltará a acontecer”, declarou à saída de um hospital madrileno – durante a desastrosa escapadinha africana, o rei tinha caído e fracturado a anca.

segredos revelados

a imagem do monarca seria também afectada nesse ano pelo escândalo que envolve o seu genro iñaki urdangarín, marido da infanta cristina. o duque de palma de maiorca é arguido num mediático caso de corrupção, fraude fiscal, tráfico de influências e branqueamento de capitais que envolve uma fundação sem fins lucrativos utilizada em negócios com políticos conservadores espanhóis. e apesar da casa real ter cortado relações com urdangarín e censurado a sua conduta, continua por apurar o real conhecimento e envolvimento da infanta e do seu pai no caso.

a juntar aos dois escândalos, ou talvez por causa destes, a imprensa espanhola começou finalmente a investigar o que há muitos anos circulava em madrid: as histórias das infidelidades em série de juan carlos. terá tido mais de mil amantes ao longo da vida, sugere-se numa biografia não autorizada. a mais falada é a princesa alemã corinna zu sayn-wittgenstein, companheira de viagem no botswana e inquilina de uma mansão madrilena com direito a protecção policial.

em abril deste ano, uma sondagem publicada no el país comprovava o impacto dos escândalos: 53% dos inquiridos reprovavam o desempenho do rei de 75 anos e 45% pediam a sua abdicação a favor do príncipe filipe, de 45.

caso renunciasse à coroa, juan carlos seguiria o exemplo recente do referido monarca belga alberto ii, 79 anos. que, aliás, também vinha acumulando escândalos. de resto, a saída de cena foi anunciada na mesma altura em que este foi chamado a tribunal para apurar a paternidade da escultora delphine boël. a belga de 45 anos é há vários anos apontada como filha ilegítima do rei, com quem nunca conseguiu estabelecer contacto, tendo avançado agora com um pedido de testes de adn. outro caso manchara a família real belga no início do ano. a rainha fabíola, cunhada de alberto ii, foi duramente criticada pelo governo e pela generalidade dos seus súbditos quando, em janeiro, se soube que tinha constituído uma fundação para proteger o seu património do fisco de bruxelas.

outro rei europeu vem perdendo a admiração dos seus concidadãos. em 2010, os suecos ficaram a saber que o rei carlos gustavo, hoje com 67 anos, foi cliente habitual de clubes de sexo de senhores do crime organizado, e que este era um fã ávido de orgias em saunas com modelos nórdicas. as revelações surgiram num livro que relatava ainda uma relação extraconjugal mantida com uma cantora negra. no entanto, o rei foi perdoado pela família. “falei com a rainha e decidimos virar a página e seguir em frente, porque foram coisas que aconteceram há muito tempo”, declarou o monarca numa comunicação ao país.

já os seus súbditos, segundo vários estudos de opinião, manifestam maior simpatia pela princesa vitória, sua primogénita, de 36 anos. casada com um plebeu, o personal trainer daniel_westling, segue a moda dos jovens príncipes europeus que procuram o amor fora da corte: filipe de bourbon, herdeiro do trono espanhol, apaixonou-se pela jornalista letizia ortiz; o príncipe frederico da dinamarca escolheu partilhar o futuro trono com mary donaldson, uma marketeer australiana, e o rei guilherme alexandre dos países baixos casou com a banqueira argentina máxima zorreguieta.

a factura da festa

guilherme alexandre protagonizou outra passagem de testemunho mediática em abril, depois da mãe, a rainha beatriz, ter abdicado aos 75 anos. a monarca decidiu pôr termo ao reino “para dar lugar a uma nova geração”, num gesto unanimemente elogiado pelos súbditos. popular, a família real holandesa não é contudo imune à crítica, com muitos cidadãos e observadores a apontarem gastos excessivos. segundo um estudo de referência da universidade de gante (bélgica), a casa de orange-nassau é a mais cara da europa, custando 35 milhões de euros por ano aos cidadãos holandeses. a segunda monarquia mais cara é a britânica, que custa 33 milhões de euros por ano, quatro vezes mais que a coroa espanhola. contudo, a chefia de estado mais onerosa é republicana – a francesa, com o palácio do eliseu a consumir 101 milhões de euros anuais.

pedro.guerreiro@sol.pt