Sínodo. A caminho da revolução ou do regresso ao passado?

Padres casados, mulheres diaconisas, poligamia, influencers e comunidade LGBT+ fazem parte dos temas que estão em discussão sobre o futuro da Igreja Católica. Em abril saber-se-á o que pensam o clero e os leigos portugueses.

Muito se tem falado sobre o caminho a seguir pela Igreja Católica e até se comenta a eventualidade de um cisma, com uma divisão entre os alemães e o resto do mundo, embora poucos acreditem nesse destino.

Tudo por causa de questões fraturantes, como seja a possibilidade de ordenação de padres casados, da ordenação de mulheres, e de os cristãos divorciados ou pertencentes a comunidades LGBT+ terem os mesmos direitos do cristão mais fiel aos princípios da doutrina, se é que isso existe.

Foi por isso que o Papa ordenou há uns anos que todas as dioceses da Igreja Católica espalhadas pelo mundo fizessem o seu relatório sobre o que pensam da instituição. Foi com esses relatórios na sua posse que o Papa Francisco decidiu reunir representantes do clero, maioritariamente bispos, além dos leigos, na Assembleia Geral Ordinária do Sínodo dos Bispos, que discutiram os contributos que lhes chegaram. Durante quase todo o mês de outubro, o Sínodo dos bispos contou com o contributo de mulheres, representantes de outras igrejas, além, obviamente, do clero. No final, foi elaborado o relatório de Síntese, agora enviado para todas as Conferências Episcopais do mundo, que terão a oportunidade de fazer uma síntese de oito páginas de tudo o que foi falado em Roma.

Cada Conferência Episcopal, que reúne os bispos de cada país, deverá entregar até ao final de abril as novas conclusões que cada diocese lhes enviará. Na prática, as dioceses são de novo chamadas a fazer uma síntese da síntese do Sínodo dos Bispos através de “um breve testemunho do trabalho realizado e das experiências vividas (máximo de duas páginas), partilhando uma boa prática que considere significativa para fazer crescer um dinamismo sinodal missionário”.

A grande novidade aqui é que o Vaticano deu a possibilidade a cada Conferência Episcopal de escolher os temas da síntese, pois o Papa não quer que a discussão volte à estaca zero. Sendo assim, cada diocese enviará uma síntese de duas páginas, que a CEP tratará de reduzir a oito páginas no total que enviará para o Vaticano, onde em outubro de 2024 os mesmos elementos que estiveram no Sínodo de 2023 estarão presentes.

Um pouco confuso? Expliquemos então. O Relatório do Sínodo dos Bispos tem 43 páginas com 20 temas. Sabendo que só poderá mandar oito páginas para o Vaticano, a CEP optou por dar de novo a voz aos seus fiéis, e ao clero, pedindo-lhes que se pronunciem sobre os capítulos oito a doze, e do 16 ao 18. E o que dizem esses capítulos? O oitavo tem como mote a Igreja é Missão e na síntese de Roma lê-se nas propostas: “Explore-se também a possibilidade de instituir um ministério a conferir a casais comprometidos em apoiar a vida familiar e a acompanhar as pessoas que se preparam para o sacramento do matrimónio”.

O ponto nove poderá dar mais discussão, pois refere-se ao papel das mulheres. Vejamos então as propostas de Roma: “Que se dê seguimento à pesquisa teológica e pastoral sobre o acesso das mulheres ao diaconado, beneficiando dos resultados das comissões propositadamente instituídas pelo Santo Padre e dos estudos teológicos, históricos e exegéticos já realizados. Se possível, os resultados deveriam ser apresentados à próxima sessão da Assembleia”. Como é sabido, muitos não concordam que as mulheres possam ser ‘ordenadas’ diaconisas. O ponto 10 não deverá trazer grande alarme, mas já o ponto seguinte irá criar, seguramente, muita divisão, pois refere-se ao celibato dos padres e ao papel dos diáconos e das diaconisas. “Foram expressas diferentes avaliações sobre o celibato dos presbíteros. Todos apreciam o seu valor, carregado de profecia, e o testemunho de conformação a Cristo; alguns perguntam-se, na Igreja latina, a sua conveniência teológica com o ministério presbiteral deve traduzir-se necessariamente numa obrigação disciplinar, sobretudo nos lugares em que os contextos eclesiais e culturais o tornam mais difícil. Trata-se de um tema que não é novo, que precisa de ser retomado ulteriormente”, lê-se no documento.

Já o ponto 16 irá ainda aquecer mais os ânimos. Com o título “Por uma Igreja que escuta e acompanha”, discute-se o tratamento a dar à comunidade LGBT+, sem nunca se referir a sigla: “Que deveremos mudar para que as pessoas que se sentem excluídas possam experimentar uma Igreja mais acolhedora? A escuta e o acompanhamento não são apenas iniciativas individuais, mas constituem uma forma de agir eclesial. Por isso mesmo, devem encontrar lugar dentro da programação pastoral ordinária e da estruturação operacional das comunidades cristãs aos vários níveis, valorizando também o acompanhamento espiritual. Uma Igreja sinodal não pode renunciar a ser uma Igreja que escuta e este compromisso deve traduzir-se em ações concretas”. Como última proposta deste capítulo, o Relatório de Síntese fala das diferentes culturas existentes no mundo: “Encoraja-se o SECAM (Simpósio das Conferências Episcopais de África e Madagáscar) a promover um discernimento teológico e pastoral sobre o tema da poligamia e sobre o acompanhamento das pessoas que vivem em uniões poligâmicas, que se aproximam da fé”.

Como estamos em pleno século XXI, as novas tecnologias não foram esquecidas no ponto 17. “É importante criar redes de colaboração de influencers que incluam pessoas de outras religiões ou que não professam nenhuma fé, mas que colaboram em causas comuns para a promoção da dignidade da pessoa humana, da justiça e do cuidado da casa comum”.

São estes alguns dos temas que as equipas sinodais de cada diocese se irão pronunciar, mas podem escolher outros capítulos. Do que não há dúvidas é que a CEP, presidida por D. José Ornelas, escolheu os assuntos mais polémicos para serem de novo debatidos. Certo é que no primeiro relatório de síntese da CEP houve quem não se identificasse com as conclusões e tenha apresentado outra leitura. Veremos qual será o contributo da Igreja portuguesa para o Sínodo dos Bispos de 2024 que promete revolucionar a Igreja… ou não. Na Alemanha e nos EUA as posições entre progressistas e conservadoras estão muito extremadas. Nesta edição tentamos um pouco colocar as várias visões em confronto. Sendo certo que ainda temos missas antigas, lidas em latim, e outras mais modernas, digamos assim.