Erros médicos levam doentes a exigir 26 milhões

A Inspecção-Geral das Actividades em Saúde (IGAS) descobriu, através do levantamento das acções judiciais interpostas pelos utentes do Serviço Nacional de Saúde (SNS), que dois terços dos serviços públicos foram alvo de queixas em tribunal, durante o ano de 2010. No total dessas acções judiciais, são exigidas indemnizações de cerca de 26 milhões de euros.

no relatório de uma auditoria recentemente concluída, a igas retoma um assunto a que já se tinha dedicado em 2008 – o erro médico e as acções judiciais por deficiente assistência médica – para concluir que pouco mudou desde então. os valores dos pedidos indemnizatórios mantêm-se elevados, assim como o número de processos em tribunal: quase 140. «mais de 26 milhões de euros é uma cifra que não pode ser ignorada», lê-se no relatório. da amostra recolhida pela igas foi possível concluir que apenas 19 hospitais são responsáveis por mais de 80% dos valores demandados nesses processos.

a inspecção-geral lembra, a este propósito, que a direcção-geral de saúde (dgs) tem manifestado nos últimos anos a intenção de criar grupos de trabalho para implementar um sistema nacional de notificação de incidentes adversos (os chamados erros médicos ou assistenciais), «cujos resultados ainda não são conhecidos», lê-se neste relatório.

é, entretanto, «assinalada» a publicação de uma circular da dgs dirigida aos hospitais do sns – intitulada «cirurgia segura salva vidas» –, cujo início de operacionalização estava previsto para julho do ano passado.

infecções e ferimentos acidentais

os doentes queixam-se, sobretudo, de erros médicos que resultaram em infecções, lacerações acidentais, reacções a transfusões sanguíneas ou traumas de nascimento, com lesões para o recém-nascido. há ainda queixas de complicações nas anestesias e de corpos estranhos deixados no organismo, depois da cirurgia. as quedas das macas e os erros nas prescrições de medicamentos são outros tipos de queixas que levam também os utentes do sns a avançar para tribunal.

tal como a igas concluíra na primeira acção deste tipo, a cirurgia e a ortopedia são as especialidades médicas mais visadas nos processos judiciais, seguindo-se a obstetrícia e a medicina interna como principais causas dos litígios.

os hospitais do litoral, onde existem os maiores e mais diferenciados estabelecimentos de saúde, são aqueles que mais queixas acumulam – o que se explica pelo facto de serem estes os hospitais «que maior número de actos médicos praticam».

prevenção do erro ainda é deficiente

a auditoria da igas tinha também como objectivo fazer o levantamento do tipo de sistemas de gestão do risco e de prevenção do erro usados nos estabelecimentos de saúde do sns.

os serviços de urgência hospitalar são aqueles que, por natureza, maior exigência têm neste domínio, tendo a igas apurado que quase 60% têm protocolos escritos de prevenção do erro médico. há especialidades médicas que também têm o mesmo tipo de protocolos, destacando-se, segundo o apuramento feito pela inspecção, a cirurgia, a anestesiologia e a ginecologia.

apenas um terço dos hospitais inquiridos pela igas declarou, em contrapartida, ter um sistema informatizado de alerta e prevenção dos riscos no decurso de toda a assistência médica. isto apesar de mais de metade assegurar ter práticas de comunicação de incidentes adversos ou deficiências na prestação de cuidados médicos.

uma ínfima parte dos estabelecimentos hospitalares do sns informou ter um seguro de responsabilidade civil profissional (cobrindo a assistência médica). e apenas um sexto dos médicos respondeu ter feito, a título individual, um seguro de responsabilidade profissional.

a igas entende, no entanto, que esta amostra não é significativa, alertando para o facto de ser necessário um «esclarecimento adicional sobre a matéria» por parte dos hospitais do sns.

graca.rosendo@sol.pt