‘Portugal já não é visto como a Grécia’

O responsável máximo do Deutsche Bank em Portugal garante que os accionistas alemães têm confiança no país. O banco tem produtos financeiros que investem em dívida pública nacional e o Estado português continua a ser cliente da instituição. Se surgirem bons projectos, haverá crédito disponível.

o que levou à passagem do deutsche bank em portugal de filial a sucursal?

foi uma alteração jurídica. em termos de posicionamento no mercado e de negócio tudo se mantém igual.

não teve a ver com uma percepção de maior risco de portugal junto da casa-mãe?

essa foi a percepção errada que ficou no mercado, porque coincidiu com o momento crítico que portugal começava a atravessar. mas este é um projecto bastante maduro do grupo e a ser implementado a nível europeu.

os vossos accionistas continuam a acreditar em portugal?

claro que sim. já depois da intervenção da troika, abrimos quatro balcões e vamos agora abrir outro. mesmo a conversão em sucursal acaba por ser um reforço da aposta. quando deixámos de ser uma filial, todo o balanço do deutsche bank ag está comprometido com o país e não apenas uma pequena empresa.

têm investimentos em dívida pública portuguesa?

directamente não, mas temos muitos produtos que investem em dívida soberana portuguesa. é um sinal da nossa confiança.

a banca estrangeira, em geral, fechou a torneira ao estado português. é o vosso caso?

continua a ser nosso cliente.

mas estão a dar-lhe novo crédito?

se surgirem boas operações, daremos, mas os critérios são mais exigentes. ao sermos um banco presente em vários países, os nossos accionistas têm oportunidades de investimento diferentes ao mesmo tempo. quando decidem investir um euro de capital querem o melhor binómio de risco e rentabilidade. hoje, a grande questão é convencer de que é melhor em portugal.

isso está a ser difícil?

sim, mas têm surgido boas oportunidades de negócio.

na alemanha continuamos a ser colados à grécia, à irlanda ou a nenhum?

à grécia definitivamente não. estamos muito mais na linha da irlanda. somos vistos como um país que tem feito tudo para corrigir as dificuldades, com poucos impactos sociais e de forma ordeira. portugal tem conseguido demonstrar um sentido democrático e de dever muito elevado.

acha que é possível voltarmos aos mercados em 2013?

se por acaso não voltarmos, temos de provar que demos todos os passos para isso.

os investidores não penalizariam essa flexibilização de tempo?

não. isso até pode ser encarado como um sinal de maturidade, porque o trabalho de casa está bem feito. o tempo a mais seria uma recompensa e não uma represália.

em portugal faz sentido aumentar mais os impostos?

não devíamos ir mais por aí. já estamos muito sobrecarregados. além do efeito económico, há um factor moral que começa a pesar muito. e um país para sair da crise precisa de confiança e força anímica. temos de cortar mais na despesa e dar sinais claros do lado do crescimento.

acha que a zona euro vai sobreviver a tudo isto da forma como existe hoje?

são duas perguntas. que vai sobreviver, seguramente. a europa tem muito para dar e será sempre uma grande potência. mas também acho que o futuro passará por uma maior união e por medidas que aproximem a europa de uma lógica mais federada, ao nível da legislação fiscal, laboral e de regulação financeira.

os contribuintes alemães parecem cansados de pagar a conta…

alguns países vão ter de dar mais do que outros, mas a verdade é que também recebem mais de outra forma. a integração tem retorno para todos os membros da zona euro. a integração foi muito benéfica para a alemanha e para a integração das duas alemanhas, por exemplo.

e haverá dinheiro suficiente para apagar todo este fogo?

terá de haver, porque a solução de não integração seria maléfica para todo o mundo, que precisa de uma europa forte para contrabalançar os pesos dos eua e da ásia. mas desacreditem-se aqueles que acham que vai haver o dia d para acabar com a crise na europa. isto é uma caminhada que se faz com pequenos passos durante muito tempo.

como se garante a confiança no sistema financeiro com escândalos como o do barclays?

os sistemas são sempre falíveis. não há sector imune a falhas.

como é que a banca portuguesa tem reagido a esta crise?

extraordinariamente bem. sofreu muito, foi chamada a socorrer o país, comprando dívida soberana e apoiando projectos com sentido de estado, e ainda continua activa, com os bancos a tentarem recuperar a forma.

há algum banco em portugal que vos interesse?

não. neste momento estamos a olhar para nós, a aproveitar para tornarmos o balanço mais sólido. temos ainda dois ou três anos pela frente que vão ser bastante desafiantes.

foram assessores dos chineses da state grid na privatização da ren. foram chamados a prestar esclarecimentos no âmbito das investigações em curso? houve buscas?

até agora nada. de resto, prefiro não me pronunciar.

como novo presidente da câmara luso-alemã, é prioritária a promoção das privatizações portuguesas junto de investidores alemães?

obviamente. na câmara queremos agora ter um papel mais activo. estamos a trabalhar para realizar, nos próximos meses, um roadshow pela alemanha com 40 pequenas e médias empresas portuguesas para ajudar a fomentar as exportações. vamos apresentar portugal e mostrar as vantagens de se investir no país, dando seis casos de sucesso de empresas alemãs que decidiram apostar em portugal e que, ano após ano, têm vindo a incrementar a sua relação com o país.

depois do interesse da e.on na edp, há algum apetite alemão nas próximas empresas a privatizar?

há interesse pelos bons activos que há em portugal.

há algum investimento alemão em risco de abandonar portugal?

não.

tania.ferreira@sol.pt