disse que «este orçamento do estado é o mais difícil da democracia». porquê?
o memorando com a troika significa um compromisso e portugal é um estado de palavra, que não pode deixar de responder com confiança aos mercados, aos credores e aos cidadãos. o parlamento terá a última palavra sobre o orçamento do estado (oe) e terá de encontrar as melhores respostas. temos de saber, rigorosamente, quanto é que, por exemplo, deixámos de ter sem a medida de suspensão dos subsídios dos funcionários públicos e pensionistas, que foi legitimamente declarada inconstitucional. este valor é absolutamente fundamental. a unidade técnica de apoio orçamental (utao) e o conselho de finanças públicas podem ter aqui uma palavra importante, antes da aprovação do oe. e temos de saber a medida da eficiência fiscal nos últimos meses.
o oe2013 e as explicações do governo não são suficientes?
não são. e este é um trabalho que tem de ser feito para protecção de todos, inclusive do governo.
mas o ministro das finanças declarou que este é o oe possível e que não se esperem alterações, usando o memorando como argumento. há afinal margem de manobra?
o ministro das finanças, que é uma pessoa extremamente competente e que merece a nossa confiança, apresentou a proposta de orçamento, mas sabe que, no funcionamento normal das instituições, caberá ao parlamento a última palavra. temos de conhecer com rigor os constrangimentos e assegurar o cumprimento rigoroso das capacidades contributivas.
após a apresentação do oe, a contestação junto ao parlamento aqueceu, mostrando que os portugueses estão a perder a confiança…
é bom que as pessoas se manifestem pelos meios legítimos, mas em ordem, porque a liberdade é algo fundamental, mas é mais fundamental que as instituições funcionem, porque isso é a cidadania. os portugueses têm de saber que, neste caso, o tc é um aliado e vai continuar a fazer uma análise muito rigorosa de como o dinheiro público é utilizado.
a tónica do discurso do governo tem sido sempre muito orientada para os mercados…
pode falar-se mais dos mercados, mas o que tem de estar em primeiro lugar são os cidadãos. e é preciso não esquecer que o parlamento é a câmara dos cidadãos.
com a carga fiscal a que os portugueses vão estar sujeitos não haverá o risco de se agravar a evasão fiscal e a economia paralela?
a economia paralela cresceu no último ano e isso é um dado do qual temos de partir. é indispensável que quando ocorre o debate orçamental, como agora, exista já um parecer do tc sobre o último exercício fechado. neste momento, não temos condições. os prazos têm de ser alterados. o ideal é que a conta geral do estado fosse apresentada até ao final de março e o parecer do tc estivesse concluído no final de setembro.
a coesão política é um dos pilares do acordo com a troika e portugal vive uma crise dentro da coligação governamental. os interesses do país não deveriam ser superiores às tricas políticas?
o interesse nacional prevalecerá certamente sobre essas dificuldades de circunstância. as crises são passageiras. temos nove séculos de história e os portugueses têm sabido responder positivamente na provação. estou certo que isso irá acontecer.
considera hoje que o programa de assistência é o mais adequado em termos de tempo e dinheiro?
não estamos sozinhos aqui. portanto, qualquer decisão não dependerá exclusivamente de nós. em termos de princípio devemos assegurar que o período de assistência é o menor possível. mas não podemos esquecer que situações como a de espanha ou itália nos dificultam as coisas, nomeadamente o regresso aos mercados. temos de estar muito atentos para que seja feito nas melhores condições. não precisaremos de mais dinheiro, mas os calendários vão depender das circunstâncias internacionais e de regressarmos aos mercados nas melhores condições e no melhor momento. não devemos ter uma obsessão com os prazos. devemos é ser muito exigentes no que toca ao cumprimento das obrigações essenciais.
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‘zona euro é a sobrevivência para todos’
a falta de capacidade de resposta da ue tem sido evidente com o agudizar da crise na zona euro. qual a receita para resolver o problema?
a crise não será ultrapassada se cada país andar por si. sem coordenação não haverá resposta. a europa está hoje numa situação dilemática: tem de assegurar a disciplina financeira e orçamental e reduzir o endividamento, e ao mesmo tempo criar emprego e garantir o desenvolvimento. é indispensável que se acautelem muito cuidadosamente os dois elementos. a austeridade é passageira, agora tem de ser garantida uma política de sobriedade.
a verdade é que a estratégia que está a ser seguida pela europa não deu resultados na grécia, não está a correr bem em portugal e há o risco de também fracassar em espanha ou até itália. neste contexto de austeridade, que o fmi já reconheceu não ser o modelo certo, como se consegue que a economia cresça?
o problema não é meramente técnico. é político. sem vontade, sem união e sem governo económico não haverá respostas adequadas.
acredita que há essa vontade política dos grandes contribuintes líquidos da europa, como é o caso da alemanha? e continua a acreditar no futuro da zona euro?
continuo a acreditar. naturalmente vejo com muita preocupação o que aconteceu nos últimos anos. mas vejo também novos sinais positivos, por exemplo, do bce. além de que o euro é uma questão de sobrevivência também para os países contribuintes líquidos. a zona euro, se continuar com uma tendência recessiva, afectará fortemente a produção desses países. estamos todos no mesmo barco. não se pode continuar com o discurso de que há países bons e maus. há os países do norte e do sul, esse é um discurso totalmente errado. felizmente está a ser ultrapassado. os egoísmos nacionais, se prosseguirem, vão ser fortemente inimigos, antes de mais, dos grandes países.
‘serviço nacional de saúde tem de ser preservado’
o tc tem mostrado preocupação com a segurança social (ss). está para breve uma nova auditoria?
estamos a elaborar um parecer que será aprovado antes do final do ano para ser entregue no parlamento. a questão tem a ver com a ss, mas também com a sustentabilidade das finanças públicas. a questão demográfica é crítica e, além disso, esta crise financeira obriga-nos a tirar uma conclusão: temos de mudar de vida.
o último parecer do tc sobre a saúde alertava para o risco de os serviços não serem prestados em qualidade e quantidade. há novos dados sobre a lei dos compromissos?
continuamos a acompanhar e o ministro da saúde tem sido muito atento quanto às recomendações do tc. não podemos continuar a viver acima das possibilidades e temos de escolher o que é essencial para cumprir os limites, mas o serviço nacional de saúde tem de ser preservado.
como é que o tc vê o actual estado das fundações?
não me posso pronunciar sobre casos concretos, mas posso dizer que o tc foi a primeira entidade a alertar para a necessidade de acompanhamento escrupuloso das fundações.
em que ponto está a auditoria à estradas de portugal?
a pedido do próprio governo, estamos a realizar a auditoria que está na fase de trabalhos no terreno. ainda não há uma data para a decisão final. temos de ser muito racionais, rigorosos e transparentes nas ppp, porque são relações que perduram por muito tempo e as condições da economia mudam nesse período. todos os contratos adicionais que estão a ser renegociados têm de ser entregues ao tribunal.
os vistos prévios não deveriam ser alargados a todos os contratos que são geradores de despesa pública?
concordo com lei actual, porque temos visto prévio para grandes contratos, abrangendo a administração pública e as empresas públicas, coisa que não acontecia até 2011. temos de assegurar que a fiscalização prévia seja feita aos contratos realmente importantes.