Constâncio falhou declaração no Tribunal Constitucional

Vítor Constâncio partiu para Frankfurt, onde assumiu a vice-presidência do Banco Central Europeu (BCE) em Junho de 2010, sem apresentar a declaração de rendimentos no Tribunal Constitucional (TC) a que estava legalmente obrigado.

depois ter cessado as funções de governador do banco de portugal (bdp), em maio desse ano, o economista tinha dois meses para fazê-lo, mas isso não aconteceu no espaço de dois anos e meio. a situação foi regularizada apenas no dia 21 de dezembro de 2012, após uma investigação do sol durante a qual o próprio tc detectou a falha.

todos os titulares de cargos políticos e equiparados, bem como os titulares de cargos públicos – categorias em que se enquadra a figura de governador do banco de portugal, por exemplo – têm de apresentar no tc a declaração dos seus rendimentos, bem como do seu património e cargos sociais. o mesmo tem de ser feito sempre que haja alterações patrimoniais significativas (equivalentes a 50 salários mínimos) e quando um responsável renova um mandato ou cessa funções. e foi exactamente isso que vítor constâncio não fez.

cliente do bpi, cgd e bes

o ex-governador do banco de portugal apresentou no tc a declaração de 2006, em julho de 2007, referente ao momento em que assumiu o cargo. nesse ano, segundo o documento consultado pelo sol, registou rendimentos de 282.191,73 euros e poupanças na ordem dos 830 mil euros, entre contas à ordem, depósitos a prazo (ppr), fundos de investimento, planos de poupança de reforma, derivados e certificados de aforro, além de vários imóveis.

no ano seguinte, o ex-líder do ps voltou a cumprir a obrigação de apresentar a declaração de rendimentos. assim, em 2007, de acordo com o que o sol apurou, constâncio recebeu 281.807,98 euros e tinha poupanças declaradas de um pouco abaixo dos 800 mil euros, também distribuídas por contas à ordem, fundos de investimento, depósitos a prazo e produtos estruturados. mas terá deixado de ter certificados de aforro e passado a investir ainda em aplicações de capitalização e carteiras de títulos (ainda que não explicite quais).

já em 2008, o seu rendimento caiu para os 275.644, 54 euros, de acordo com a declaração apresentada no tc em janeiro de 2010. o valor aforrado também se terá reduzido, passando para cerca de 750 mil euros, aplicado de forma semelhante ao ano anterior, ainda que com movimentações entre os vários tipos de produtos de poupança.

um ano depois – e com base na declaração apresentada em dezembro de 2012, após ser contactado pelo tc para regularizar a situação, na sequência da investigação do sol – vítor constâncio ganhou 281.960, 82 euros. em 2009, quando desempenhou a função de governador do bdp na primeira metade metade do ano, e de vice-governador do bce na segunda, declarou então poupanças na casa dos 700 mil euros. nestes anos, vítor constâncio era cliente de bancos portugueses (bpi, cgd e bes).

incumprimento sem pena

nomeado por oito anos para o cargo de vice-presidente do bce, constâncio ficou, em portugal, livre de consequências da não entrega da declaração de cessação de funções no tc em tempo devido, por uma questão de meses – já que as alterações à lei de controlo público da riqueza dos titulares de cargos públicos entraram em vigor depois de ter abandonado o cargo de governador.

no actual enquadramento legislativo, os casos de incumprimento incorrem na pena de perda do mandato, demissão ou destituição judicial, consoante os casos, ou inibição por período de um a cinco anos para o exercício de cargos públicos. mas o ministério público pode decidir, ainda assim, proceder à análise das declarações apresentadas no tc após o termo dos mandatos ou a cessação de funções dos respectivos titulares.

tania.ferreira@sol.pt