Paquistão: Julgar o passado e decidir o futuro

Não se deve voltar ao lugar onde se foi feliz. O antigo Presidente paquistanês Pervez Musharraf não seguiu o conhecido adágio e há cerca de um mês decidiu pôr termo a um exílio de quatro anos no Reino Unido para concorrer às eleições legislativas de 11 de Maio.

musharraf, de 69 anos, esteve quase uma década no poder, onde chegou com um golpe de estado, e de lá saiu em desgraça e em guerra com o poder judicial, acusado de violar a constituição e suspeito de envolvimento na morte da rival política benazir bhutto. motivos fortes para o ditador fugir do país mas que foram esquecidos perante a possibilidade de um regresso em grande. entusiasmado pelo enorme apoio reunido nas redes sociais, musharraf acabou traído pelo virtual. as centenas de milhares de fãs no facebook eram afinal centenas de apoiantes no aeroporto.

dias após o regresso, o general ficou a saber que não podia ser candidato às eleições – a justiça paquistanesa proibiu-o de se apresentar a votos por este ter suspendido a constituição em 2007. e a 18 de abril, um tribunal de islamabad decretou a sua detenção. musharraf encontra-se agora em prisão domiciliária.

além da acusação de traição que o actual governo de gestão diz não poder formalizar (terá de ser o próximo executivo a decidir o processo), o general é arguido no caso mais melindroso da morte de benazir. uma investigação das nações unidas ao atentado de dezembro de 2007 em rawalpindi co-responsabilizou musharraf e o então governo de shaukat aziz pelo ataque talibã à comitiva da candidata às eleições de 2008, por estes não terem garantido a segurança da acção de campanha.

musharraf, ele próprio, corre agora risco de vida. na terça-feira, a polícia descobriu uma bomba de 50 quilos junto à sua residência. talibãs, opositores políticos, inimigos militares – longa é a lista daqueles que querem ver morto o antigo ditador e aliado intermitente dos estados unidos.

corrida a três

o regresso inglório do general que disse ir «salvar o paquistão» da instabilidade política e económica e do extremismo islâmico acaba por ser pouco mais que uma história secundária da campanha agora em curso. são aqueles os temas do momento, mas os protagonistas são outros. espera-se uma corrida a três entre bilawal bhutto (filho de 24 anos de benazir e líder do secular partido popular, que não faz campanha nas ruas por razões de segurança), o ex-primeiro-ministro nawaz sharif (da conservadora liga muçulmana) e a velha glória do críquete imran khan (do populista movimento pela justiça).

perante a ausência de sondagens fiáveis, a demografia dá algumas pistas para 11 de maio. khan é popular nas grandes cidades e, devido à denúncia dos ataques de drones dos eua, nas zonas tribais da fronteira afegã. a liga muçulmana lidera na populosa província do punjabe, enquanto o partido de bhutto domina o sinde.

a comunidade internacional tem tentado manter-se à margem da política interna paquistanesa, mas uma vitória do filho de benazir seria celebrada no ocidente. em contrapartida, o apoio do extremismo islâmico a sharif e a khan traduz-se por estes dias na ausência de ameaças terroristas contra estes candidatos.

pedro.guerreiro@sol.pt