Revolução moderada no Irão

Um misto de esperança e de cautela segue-se à vitória do único candidato moderado nas presidenciais iranianas de dia 14. Hassan Rohani, um clérigo de 64 anos com ampla experiência jurídica e diplomática, venceu as eleições com 50,71% dos votos apesar dos muitos receios dos seus apoiantes e prometeu na sua primeira conferência de imprensa…

“temos de melhorar a confiança mútua entre o irão e os restantes países”, afirmou na segunda-feira em teerão, prometendo convencer a comunidade internacional a levantar as pesadas sanções económicas que esmagam a economia nacional. “o primeiro passo será mostrar uma maior transparência. estamos dispostos a fazer isso e a clarificar que as acções da república islâmica do irão estão completamente enquadradas na lei internacional”, disse em relação ao diferendo nuclear que isola o país.

o irão desenvolve há anos um programa de energia atómica que levanta suspeitas de fins militares. o programa não deverá ser interrompido, com rohani a pretender antes demonstrar que o país age de boa-fé. na terça-feira, segundo a rússia, surgiu um sinal nesse sentido, com o irão a manifestar a intenção de cessar o enriquecimento de urânio a 20%, um processo normalmente utilizado em programas de armamento atómico.

para israel, nação que mantém o monopólio nuclear do médio oriente, a boa-fé não basta. “a comunidade internacional não pode ceder à ilusão optimista e diminuir a pressão sobre o irão para parar o programa nuclear”, afirmou o primeiro-ministro benjamin netanyahu. “as eleições mostraram claramente uma profunda insatisfação do povo iraniano com o seu regime, mas infelizmente não alteram as ambições nucleares do irão”, alertou o líder hebraico.

os estados unidos saudaram rohani pela vitória eleitoral e exortaram-no a manter negociações directas com o ocidente. questionado pelos jornalistas se se sentaria à mesa com barack obama, o clérigo iraniano foi mais cauteloso e afirmou que “a questão das relações entre o irão e os eua é complicada”. mas também disse que a “velha ferida” teria de ser “sarada”, e não repetiu os habituais impropérios dirigidos contra washington pelo presidente cessante mahmoud ahmadinejad.

no plano interno, não é esperada uma alteração profunda da natureza do regime iraniano, uma vez que o verdadeiro poder está nas mãos de uma figura não eleita, o guia espiritual ali khamenei, mas vários analistas afirmam ser possível uma mudança gradual. para já, os iranianos registaram uma jornada eleitoral sem incidentes graves e com um resultado aparentemente incontestado, em claro contraste com a violência repressiva que marcou a votação de 2009.

ahmadinejad em tribunal

no mesmo dia em que rohani falava ao país e ao mundo, outro acontecimento disputava as atenções dos iranianos. ahmadinejad, o presidente cessante, recebia uma intimação para comparecer em novembro num tribunal de teerão para responder a uma queixa-crime apresentada pelo presidente do parlamento ali larijani. a informação foi avançada por um site noticioso governamental que nada acrescentava sobre o teor da queixa.

em fevereiro, ahmadinejad e larijani envolveram-se numa mediática troca de acusações em pleno parlamento. durante o episódio, o presidente divulgou uma gravação que supostamente expunha um irmão de larijani a vender favores políticos a troco de dinheiro. o incidente lesou a imagem de larijani, um conservador próximo do aiatola khamenei, e sublinhou a tensão entre a ala ortodoxa do regime teocrático e a ala populista e nacionalista encabeçada por ahmadinejad. a campanha para as eleições deste mês mostraram porém que khamenei mantém o poder supremo em teerão, com o pré-candidato presidencial apoiado por ahmadinejad, o seu antigo chefe de gabinete esfandiar mashaei, a ser desqualificado pelo conselho de guardiães.

pedro.guerreiro@sol.pt