Obama escuta as queixas da Europa

A cimeira de Bruxelas que hoje terminou e que deveria ter sido dedicada à promoção da agenda digital europeia e ao debate sobre a vaga migratória no Mediterrâneo acabou por ser dominada pelas mais recentes revelações sobre o escândalo de espionagem da NSA.

ontem, e num acto de protesto raro entre aliados próximos, o embaixador norte-americano em berlim, john emerson, foi chamado ao ministério alemão dos negócios estrangeiros para prestar esclarecimentos sobre as escutas ao telefone da chanceler germânica angela merkel. na véspera, foi a própria chefe do governo a ligar ao presidente dos estados unidos barack obama a pedir explicações.

segundo noticiou na quarta-feira a der spiegel, uma investigação dos serviços de segurança alemães concluiu que o telefone de merkel estaria a ser escutado pelos eua. o inquérito foi desencadeado depois de vários artigos da revista alemã que tiveram como principal fonte edward snowden, o antigo técnico da nsa agora exilado na rússia. sem desmentir a notícia, obama terá dito a merkel que os eua não espiam neste momento a chanceler conservadora nem o farão no futuro.

este foi o segundo pedido de explicações solicitado esta semana a obama por um líder europeu. também o presidente gaulês françois hollande ligou para a casa branca depois do le monde ter noticiado na segunda-feira, novamente com base nos dados de snowden, que mais de 70 milhões de chamadas feitas em frança foram escutadas pela nsa entre dezembro de 2012 e janeiro último.

tanto hollande como merkel terão usado linguagem forte para os parâmetros diplomáticos, disseram os respectivos gabinetes.

conselho europeu reage

em bruxelas, estas revelações dão novos argumentos para um reforço da legislação comunitária de protecção de dados pessoais, numa altura em que o parlamento europeu discute novas restrições à forma como empresas como a google ou a microsoft recolhem informações sobre os utilizadores de serviços online.

e os líderes dos 28 que hoje se reuniram na capital belga demonstraram no comunicado final as suas “profundas preocupações” com os “recentes acontecimentos” relacionados com “actividades de recolha de informações”. o conselho europeu lembrou que “a recolha de informações é um elemento fundamental na luta contra o terrorismo” e sublinhou que “a falta de confiança poderá prejudicar a necessária cooperação” entre os dois blocos no domínio da partilha de informações.

ficou ainda registada a “intenção da frança e da alemanha de procurar entabular conversações bilaterais com os eua a fim de chegar, até ao final do ano, a um entendimento sobre as relações mútuas nesse domínio”, ficando em aberto a hipótese de outros estados europeus se juntarem à iniciativa.

na quarta-feira, o pe suspendeu ainda o acordo de partilha com os eua de dados do sistema de transferências bancárias swift. o acordo, que visava originalmente o combate ao financiamento de grupos terroristas, terá sido aplicado de forma abusiva por washington, revelou este ano snowden.

também a cooperação entre os eua e o méxico ficou ameaçada nos últimos dias. no fim-de-semana, com base nos dados de snowden e aprofundando a investigação da brasileira globo, a der spiegel noticiou que a nsa acedia ilegalmente ao email do presidente do méxico desde 2010, espiando enrique peña nieto e o antecessor felipe calderón. o governo mexicano condenou a prática e avisou que irá rever a colaboração entre os dois países ao nível da segurança, tendo considerado “insuficientes” os esclarecimentos prestados por washington até ao momento.

pedro.guerreiro@sol.pt