Orçamento do Estado no TC? Governo dividido

O tema já subiu a debate no Governo, mas este partiu-se na análise: é melhor o Presidente da República (PR) pedir a fiscalização preventiva do Orçamento do Estado ou enviá-lo para o Tribunal Constitucional (TC) em Janeiro, depois de este entrar em vigor?

há um ano, quando a mesma questão se colocou, ninguém no executivo teve dúvidas: a entrada em vigor do orçamento era vista como essencial. desta vez, é diferente. sem uma posição consensualizada, o executivo decidiu dar carta branca a cavaco – o que equivale a dizer que não obstará à preventiva.

segundo relatos feitos ao sol por vários ministros, a posição mais inesperada veio da ministra das finanças. maria luís albuquerque defendeu que haveria vantagens numa fiscalização imediata, argumentando que a manutenção dos juros a 10 anos na casa dos 6% no mercado secundário não ajuda a fazer as emissões de dívida necessárias nos primeiros meses do ano, para que o país se qualifique para um programa cautelar e saia do resgate.

na base desta tese, há um pressuposto: se houver um chumbo do corte das pensões públicas em dezembro, os juros só podem baixar depois de uma clarificação total das dúvidas – e de um plano global para resolver o problema no orçamento. esperar até abril – prazo normal em fiscalização sucessiva do oe – pode piorar o caso.

a 18 de outubro, maria luís albuquerque deu um sinal da sua preferência, numa entrevista ao jornal de negócios. a sua resposta à pergunta sobre se preferia uma fiscalização preventiva ou sucessiva, a ministra sublinhou que se trata de um poder do pr, mas não escondeu a sua opção: “os partidos da oposição têm dito que irão pedir essa fiscalização, ela acontecerá. a incerteza nunca é uma coisa boa. (…) porque enquanto não há certeza sobre determinado resultado, o preço dessa incerteza reflecte-se nas condições de financiamento do estado. desse ponto de vista, quanto mais cedo se conseguir resolver essa incerteza melhor”.

do lado centrista o entendimento é outro. paulo portas e pires de lima, por exemplo, acreditam que um eventual chumbo em abril é demasiado tardio para que a europa (comissão e bce) deixe cair o país num segundo resgate. até lá, diz uma fonte centrista ao sol, resolve-se o que for preciso e fazem-se emissões de prazos mais curtos, onde a taxa de juro cobrada é menor.

algures no meio destas posições estará o núcleo mais psd do governo, entre os quais o próprio passos e poiares maduro. a expressão “mixed feelings” (sentimentos contraditórios) tem, aliás, sido repetida nos corredores de s. bento.

sem acordo interno e com a preocupação comum de “não dar sinais ao presidente que possam ser mal interpretados ou contraproducentes” – uma expressão repetida ao sol por vários governantes -, passos coelho achou por bem deixar caminho livre ao presidente. a decisão seria sempre do chefe do estado, mas desta vez sem qualquer condicionamento do executivo.

em belém, a única frase que se ouve é de repetição do que cavaco já tem dito: “não há palpites até o presidente ver o diploma. só aí ele tomará uma decisão”.

nos círculos de conselheiros de cavaco silva, medem-se já os prós e contras. por um lado, a tradicional reserva do pr em não deixar entrar em vigor o documento no tempo certo, para não prejudicar a sua execução, nem causar mais instabilidade; por outro, as circunstâncias específicas de um final de resgate e a necessidade de se chegar ao pós-troika.

mas há um dado que tornará o julgamento mais difícil: quando cavaco decidir, já conhecerá a decisão do tc sobre o corte de pensões – que mereceu a sua reprovação clara no requerimento enviado no sábado aos juízes. isto porque o parlamento ainda tem que acertar o diploma, que só chegará a belém a 18 de dezembro, dois dias antes do limite que os juízes têm para uma decisão.

se houver chumbo, o presidente terá na mão um oe já prejudicado em mais de 700 milhões e a precisar de um rectificativo.

david.dinis@sol.pt