num dos textos entregues, com a chancela do ministério das finanças, esse alerta está escrito com todas as letras: “não se verificando a manutenção do esforço de ajustamento de forma credível e sustentada e, consequentemente, não sendo possível o financiamento em condições regulares, portugal retomará a situação de abril de 2011 de iminente bancarrota, sendo obrigado a recorrer a um segundo programa de assistência financeira”.
segundo essa análise apresentada como técnica, e feita pelo gabinete de estudos e planeamento das finanças, “esta situação seria particularmente gravosa por duas ordens de razão: o esforço de ajustamento conduzido ao longo dos últimos dois anos e meio, com os custos já suportados, seria quase totalmente perdido”.
o problema da fadiga dos credores
num segundo argumento subentende-se outro aviso: que os próprios credores poderiam colocar, no mínimo, condições mais gravosas para conceder um novo empréstimo: “um novo resgate seria mais penalizador do que o primeiro, até porque se sentirão os designados efeitos de ‘fadiga’: reform fatigue [fadiga de reformas] por parte dos agentes económicos portugueses e bail-out fatigue [fadiga de apoio financeiro a portugal] por parte de alguns estados-membros do core da área do euro”.
um outro texto do governo que chegou às mãos dos juízes contextualizava já o entendimento de passos coelho e maria luís albuquerque de que um novo aumento de impostos teria de ser excluído, mesmo em cenário de chumbo do tc à medida, tal como aconteceu depois. “o programa de ajustamento estabelecia uma trajectória de ajustamento orçamental que previa uma repartição do esforço em 66% do lado da despesa e 33% do lado da receita. (…) chegados a este ponto do programa”, diz a nota da presidência do conselho de ministros, “tornou-se impossível retardar, por mais tempo, a redução estrutural de despesa que esteve prevista desde o início, de forma a assegurar o excedente orçamental necessário à redução de dívida. (…) a via do aumento de impostos está esgotada. aumentá-los agora só acentuaria, ainda mais, o desequilíbrio, teria efeitos negativos sobre a economia, que, aliás, começa a dar sinais de recuperação, e perpetuaria a situação de profunda injustiça social que vivemos”.
quadro aos juízes, a contar quanto custaram os chumbos
uma análise detalhada destes documentos internos do governo – que entretanto foram divulgados no seu site – mostram até que ponto o executivo colocou os juízes entre a espada e a parede. há documentos, por exemplo, a demonstrar que todos os países que fizeram ajustamentos acabaram por aplicar cortes de pensões a pagamento e de salários no estado – tal como tentou o governo em portugal, até aqui travados pelo constitucional.
mais ainda, há quadros extensos com a listagem de todas as medidas já aplicadas pelo governo para tentar cumprir os objectivos do memorando – com sublinhados a cores em que se destacam as medidas que chumbaram no palácio ratton e quanto dinheiro elas representavam.
os alertas sobre as possibilidades de um novo resgate foram, por exemplo, enquadrados por uma extensa análise de como as agências de rating internacionais estão a olhar para portugal. onde se recorda que “em 18 de setembro passado, a standard & poor’s passou [o país] a ‘watch‘ negativo, considerando como principais riscos para uma eventual revisão em baixa do rating (com probabilidade de 50% nos próximos meses) o incumprimento da trajectória de consolidação orçamental definida no paef por uma execução orçamental mais desfavorável, por atrasos na implementação do oe 2014 ou de reformas estruturais resultantes de declarações de inconstitucionalidade por parte do tc”.