Troika força acordo orçamental

A troika regressa a Portugal dentro de duas semanas e vai pressionar o consenso político entre o Governo e o PS no modo de saída do programa de assistência e nos compromissos a longo prazo do Documento de Estratégia Orçamental (DEO), a apresentar em finais de Março.

O Governo está interessado num acordo com o PS no que diz respeito ao DEO – o documento que vai estabelecer metas para o equilíbrio orçamental até 2018 e, acima de tudo, o ritmo e calendário para esses objectivos. É o instrumento mais importante sobre o pós-troika.

No ano passado, o PS votou a favor dos projectos de resolução do PCP e BE que rejeitavam o DEO do Governo. O documento propriamente dito não vai a votos no Parlamento: a oposição pode apresentar projectos de resolução de rejeição e o Executivo pode optar por uma resolução de apoio. É isto que o Governo tenciona fazer este ano.

Projecto de resolução

“É muito importante que haja um projecto de resolução em que os partidos se entendam. Esperamos que isso possa acontecer nesta situação”, afirmou ao SOL o deputado do PSD Duarte Pacheco, responsável pelas questões orçamentais no Parlamento, frisando que a votação irá ocorrer na altura “em que já se sabe como vai ser a saída de Portugal do programa de resgate”. A abstenção do PS nessa resolução ou o voto a favor em alguns dos seus pontos já seria bem visto em Bruxelas.

Isto significa que a pressão sobre os socialistas será maior. O compromisso no DEO com o PS é um dos ‘trunfos’ que o Governo pretende levar a Bruxelas para a reunião do Eurogrupo de 1 de Abril, quando a saída do programa português começar a ser discutido, adiantou fonte comunitária ao SOL.

Um membro do Governo explicou que, “no seu devido tempo”, haverá conversas com o PS sobre o documento – algumas “com reserva” e outras em público – porque a matéria “tem de ter uma dimensão pública”, dada a pressão da troika.

Em segredo, Governo e PS têm conseguido alguns consensos importantes, como o das novas regras do QREN, mas, como sublinha ao SOL fonte do Governo, “tem sido difícil viver” com as circunstâncias do PS, que, por diversas vezes, negou em público contactos que estavam a decorrer em privado.

PS desconfiado

O PS está na expectativa de ser chamado a participar, mas parte desconfiado para um processo negocial. Para os socialistas darem o seu acordo “é preciso que haja alguma substância”, diz ao SOL Eduardo Cabrita, presidente da Comissão de Economia e Finanças. O deputado acusa o Governo de falar muito de entendimentos, mas depois “actuar unilateralmente”.

O voto contra do PS no ano passado foi de protesto contra a forma – foi entregue fora de tempo – e o conteúdo do DEO. “É o Governo que se põe numa posição marginal, não o PS”, remata.

O consenso entre os partidos do arco de governação é uma exigência feita pelos credores externos em qualquer assistência. A ausência de entendimentos foi uma crítica constante nas diversas avaliações da Comissão Europeia, do Fundo Monetário Internacional (FMI) e Banco Central Europeu (BCE), nos últimos dois anos.

Seja com um programa cautelar ou com uma saída ‘limpa’, os líderes europeus querem que as políticas tenham suporte a longo prazo. O consenso político na Irlanda, por exemplo, foi sempre um dos grandes argumentos de Dublin na mesa de negociações com a troika.

Banca em análise

A penúltima avaliação da troika Portugal arranca a 20 de Fevereiro e será a última decisiva, uma vez que a final será apenas para fechar o programa. Dentro de duas semanas começam a ser analisadas 53 medidas e, se a avaliação for positiva, haverá uma tranche de 2,5 mil milhões de euros em Abril.

As metas do défice não deverão sofrer alterações, mas a evolução da economia poderá ser ligeiramente revista em alta este ano, depois de a performance de 2013 ter sido menos negativa do que o previsto. A descida do desemprego, a subida dos indicadores de confiança da economia e a tendência positiva no consumo e nas exportações poderão levar os credores a avançar para uma revisão em alta.

Na última avaliação, a troika esperava um regresso ao crescimento este ano (subida do PIB de 0,8%) e as estimativas mais optimistas, como a da Moody’s, apontam agora para 1%. Recentemente, o Diário de Notícias avançou que o Governo estaria a trabalhar com um cenário de subida do PIB de 1,2%.

A energia e as rendas ficam de fora da agenda provisória desta avaliação, segundo os documentos da troika, mas a banca terá grande destaque. Como o BCE vai avançar com avaliação dos activos da banca europeia em Abril, cujos resultados serão depois incorporados em testes de stress a realizar em Outubro, a vigilância da instituição de Frankfurt na visita da troika será reforçada.

A situação dos hospitais e a equiparação dos salários das empresas públicas com os do Estado central também fazem parte da agenda.

luis.goncalves@sol.pt, manuel.a.magalhaes@sol.pt e helena.pereira@sol.pt