António José Seguro recusa negociar por não o querer fazer nos termos definidos pelo PSD e por entender que consensos alargados devem ser discutidos no início e não a meio da legislatura.
As áreas de maior divergência são precisamente as que estão em primeiro lugar na agenda política: estratégia orçamental e reforma do Estado. A ambas, Seguro dá resposta: “A política do Governo gerou mais dívida, mais pobreza e diminuiu a capacidade instalada do país para responder à crise, mas não tinha de ser assim. Por isso, quando o Governo apela ao consenso, nunca poderá contar com o PS, porque o PS não partilha a ideologia liberal do Estado mínimo”. O líder socialista respondeu assim, no encerramento das jornadas parlamentares, aos apelos insistentes que chegaram do Congresso social-democrata.
Seguro e Passos já não falam há largos meses
Nas últimas semanas, os desafios ao consenso vindos da maioria são constantes. Mas Seguro e Passos não falam há meses: o telefonema que marcou o acordo sobre o IRC, em Dezembro, terá sido a última vez. E desde Maio que não têm reuniões a sós – todas as conversas neste momento passam pelo circuito parlamentar.
Pela Assembleia da República passará também a discussão do decisivo e estrutural Documento de Estratégia Orçamental (DEO), para o qual a ministra das Finanças já pediu “algum tipo de entendimento que traga estabilidade para além das próximas eleições”. Mas o PS considera “muito difícil” o acordo e “grande” a possibilidade de um voto contra.
Em causa estão cortes adicionais na despesa do Estado, que implicam novas medidas de austeridade. O PS não irá comprometer-se com cortes definitivos de salários e não está sequer excluída a hipótese de submeter essa medida à fiscalização do Tribunal Constitucional.
Com o argumento de que estes cortes salariais não constam do programa eleitoral da actual maioria, o PS remete a decisão para as próximas legislativas – ou seja, cortes definitivos só com sanção eleitoral dos portugueses.
Além do PSD, também a troika pressionou esta semana os socialistas para consensos. Depois da reunião no Rato, o responsável pela área financeira, Óscar Gaspar, não rejeitou a necessidade de consenso, mas sacudiu a pressão: “Quem fala muito de consenso parece depois ter muita dificuldade em tornar prático esse consenso, porque fica-se pelas palavras e não diz o que é”.
O que Seguro não quer
No PS, estão bem definidas as matérias às quais não dará acordo, sendo uma delas os despedimentos na Função Pública. Nas conferências Novo Rumo, Seguro defendeu, ao invés, a mobilidade de funcionários – que passa pela transferência de competências para as autarquias.
O líder socialista não entra na lógica de “ter de se cortar por não haver dinheiro”. À pressão para cortar na Saúde, na Educação e na Segurança Social, o PS responde ‘fora da caixa’ e designa estes sectores como “estratégicos” para o crescimento do país. O responsável pela Saúde na direcção do PS, Álvaro Beleza, rejeita mesmo que haja no SNS “um problema de gastos exagerados, bem pelo contrário”.
A margem para consensos é, pois, estreita. E há matérias em que existindo declarações de princípio comuns entre socialistas e Governo, não existe depois concretização. É o caso da despesa corrente primária do Estado: o PS concorda com a definição de um limite, mas só perto das legislativas admite concretizar qual é.
A discussão sobre investimentos prioritários em infra-estruturas a financiar através de fundos comunitários é uma das discussões que passará pelo Parlamento. Os socialistas já manifestaram críticas à “falta de visão estratégica” do plano do Governo. Aqui, ainda é previsível que se chegue a algum grau de acordo, mas também nesta matéria há espaço para o PS atacar o Governo, neste caso por falta de investimento no crescimento económico.
Cautela no programa cautelar
Na discussão do programa cautelar para o pós-troika, os socialistas evitam comprometer-se. Seguro tem sido insistente na marcação de uma linha divisória: se tiver de haver um programa cautelar que proteja Portugal da turbulência dos mercados, “o Governo terá de explicar porque falhou”. No caso da ‘solução à irlandesa’ se concretizar, o líder do PS insistirá na mensagem de que o país está “mais pobre e mais desigual”.
Na reunião com a troika, esta semana, o PS recomendou “prudência” aos representantes do FMI, BCE e Comissão Europeia. E aos jornalistas afirmou que “os testes à sustentabilidade da dívida pública apresentam taxas na ordem dos 3,4% ou 3,5%”, ou seja, bem inferiores aos cerca de 5% com que Portugal actualmente negoceia.