Durão Barroso diz que ‘saída limpa’ depende do PS. Como comenta?
Isso é inverter os termos do problema. O país não tem um Governo e uma maioria parlamentar?
Mas há decisões para um período em que o PS já pode ser Governo.
Certas matérias, idealmente, poderiam ser objecto de um acordo alargado. Mas estamos na 11.ª avaliação e até agora as posições do PS foram ignoradas. Não se peça ao PS que valide políticas erradas, que não são as suas.
Ao recusar acordos, o PS não passa a mensagem de que não conta chegar ao Governo tão cedo?
Não. O PS continua comprometido com o controlo do défice. O que o PS não aceita é a sobrecarga de austeridade para além do estabelecido no memorando inicial que nos conduziu a um maior empobrecimento, a uma quebra do investimento e ao desemprego.
Em cima da mesa estão cortes de 2 mil milhões na despesa pública. Não são necessários cortes adicionais?
Mais austeridade só trará mais empobrecimento. O que o país precisa é de um compromisso em torno de uma política de investimento, público e privado, que conduza ao crescimento económico, até porque sem crescimento, a dívida pública é insustentável.
No Documento de Estratégia Orçamental, será difícil um acordo?
Não se devem antecipadamente fechar portas de diálogo. Mas devemos ser claros relativamente às divergências de fundo com este Governo.
É provável que o país seja governado por um Bloco Central em 2015?
É cedo para antecipar. Mas há uma coisa que tenho por certa: nas actuais circunstâncias um Governo minoritário é completamente indesejável.
Guterres ganhou as europeias por 8 mil votos. Esta vitória chega a Seguro para chegar às legislativas?
Uma vitória para o PS é ficar à frente dos seus opositores. É importante notar que a direita se apresenta coligada e isso é um sinal de fraqueza, porque estes partidos costumam ir separados.
António Costa, José Sócrates e Santos Silva vieram elevar a fasquia. Isso não mostra que a Seguro não basta ganhar?
É natural que destacadas individualidades do PS tenham a ambição de ver o partido obter um bom resultado. É também a minha ambição. Não dou segunda interpretação a esse desejo.
O que é preciso para reabrir a questão da liderança no PS?
Não está em causa. O PS está completamente estável, tem uma liderança legitimada e que se apresenta em condições de tranquilidade interna tanto nas europeias como nos futuros desenvolvimentos da vida política nacional.
Não é o resultado das europeias que a pode reabrir?
Eu não faço antecipações do estilo bola de cristal. Mas sublinho que a vida do PS é completamente tranquila.
Há um ano, Costa desistiu de avançar para a liderança e fez um acordo com Seguro para unir o PS. Valeu a pena Costa terrecuado?
Eu próprio tive envolvimento no esforço que foi feito na altura. O acordo que refere foi extraordinariamente importante para criar condições de tranquilidade no PS, que passou a ser muito visível a partir desse momento.
Como vê o regresso do Sócrates?
Com muito interesse. É uma voz esclarecida que contribui para a formação da opinião pública. Em muitos aspectos tem-se revelado essencial para desmistificar ataques feitos a políticas de governos do PS.
E não fragiliza Seguro?
De modo nenhum. Até ao momento nunca me apercebi de que tal tivesse ocorrido. Os comentários de José Sócrates, se para alguma coisa têm contribuído, é tornar evidente o esforço do Governo do PS em evitar ao país uma crise.
Na convenção Novo Rumo, o senhor tem a Justiça e a Segurança Interna. Faz sentido juntar ambas as áreas num único ministério?
É cedo para antecipar a orgânica de um Governo. Mas há muitas conexões entre as matérias e não seria uma solução impossível.
Sendo constitucionalista, como é que deixou Seguro fazer a proposta de um ‘tribunal gold’, só para grandes investidores?
Temos de ter espírito aberto para o que é inovador e pode contribuir para dar uma resposta sólida da Justiça portuguesa em domínios tão importantes para o desenvolvimento económico do país.
A discriminação positiva aos grandes investidores é constitucional?
Não há problema de constitucionalidade. Actualmente o que acontece é que boa parte dos litígios que emergem de contratos financeiramente relevantes, incluindo os que têm o sector público como parte, são resolvidos em convenções arbitrais, portanto fora do sistema. Não é isto verdadeiramente uma ‘Justiça gold’? E quando se tenta uma resposta célere no sistema institucional não é isso dignificar a Justiça?
Outra proposta é reabrir os tribunais que forem agora encerrados. Isso faz sentido depois de os tribunais estarem um ano fechados?
Essa lógica precisa de ser bem compreendida. Em 2008, foi aprovada na Assembleia da República (AR) uma lei de organização judiciária que contemplava uma maior racionalidade, mas não implicava o encerramento de qualquer tribunal. Agregavam-se as comarcas com menor movimento processual, levando a que fossem os juízes a deslocar-se e não as populações. Fazia-se assim a defesa da coesão territorial do país. Em 2011, fazia parte do memorando de entendimento, o compromisso não só do PS como do PSD e do CDS, para a execução desta reforma judiciária até ao final de 2012. O que aconteceu depois foi que, de uma forma unilateral, sem nunca o justificar, este Governo deitou a reforma para o lixo e encetou soluções controversas, fazendo-nos perder um tempo precioso.
A ministra da Justiça diz que já concretizou as reformas constantes do memorando de entendimento.
É completamente falso. O Governo fez aprovar na AR um novo modelo de organização judiciário, que ainda não entrou em vigor, e o decreto-lei que o concretiza está por promulgar, assim como os seus instrumentos de execução. Na melhor das hipóteses teremos o início da concretização desse novo modelo lá para final do ano. Ora, de final de 2012 a final de 2014 está aqui todo um tempo perdido e que já não é recuperável.
Não há êxito da ministra?
Há um fracasso, que resulta de uma atitude de arrogância que não tem justificação política. E é um incumprimento dos objectivos iniciais do memorando.
A ministra da Justiça diz não ter desistido de criar o crime de enriquecimento ilícito. Esse projecto terá o acolhimento do PS?
É muito estranha esta fixação da ministra da Justiça. Ao mesmo tempo que foi rejeitado por declaração de inconstitucionalidade do Tribunal Constitucional (TC) o tipo legal de crime que a ministra e esta maioria tentaram estabelecer, o PSD e o CDS rejeitaram um projecto de lei do PS que impunha sanções ao rendimento não declarado de titulares de cargos políticos – o que é paradoxal. Ou seja, quem inviabilizou soluções com cabimento constitucional foi a actual maioria. Qualquer solução que se procure tem de saber respeitar os valores jurídicos da presunção de inocência e da não inversão do ónus da prova. A senhora ministra da Justiça continua a laborar num profundo erro e a lançar suspeições que são de todo insustentáveis, como se pudéssemos sequer admitir que o TC fizesse parte de uma rede transversal de interesses obscuros.