Foi para desfazer a ideia de que a Madeira vive à custa do continente que, em 1997, surgiu o projecto de investigação das finanças públicas da Madeira denominado ‘O Deve e o Haver das Finanças da Madeira, nos séculos XV a XXI’.
O levantamento foi realizado por uma equipa de historiadores regionais, ao longo de mais de 15 anos. O documento final, coordenado pelo historiador do Centro de Estudos de História do Atlântico (CEHA), Alberto Vieira, será apresentado na conferência de imprensa da próxima sexta-feira, pelas 16 horas, na Representação Permanente da Madeira em Lisboa/Casa da Madeira (no Restelo).
O timing político escolhido por Alberto João Jardim não é negligenciável: o estudo aparece depois de uma reunião que teve em Lisboa com o primeiro-ministro, Passos Coelho, no passado dia 6, e em vésperas do Dia da Região (1 de Julho).
Depois de ponderado se seria uma provocação a Lisboa, na reunião da comissão política do PSD-Madeira, a 9 de Junho último, ficou mesmo decidido avançar com a divulgação do estudo em Lisboa.
Jardim prometeu que só falaria dos assuntos pendentes entre a Madeira e Lisboa depois da saída da troika de Portugal (17 de Maio), pois a Região receava ser hostilizada ou mesmo penalizada. Foi por isso que só se encontrou com Pedro Passos Coelho a 6 de Junho último.
‘Reposição da verdade histórica’ remonta ao séc. XV
O ‘Deve e Haver’ pretende ser um trunfo que abrirá portas à renegociação do Programa de Ajustamento Económico-Financeiro (PAEF) que a Madeira foi obrigada a assinar a 27 de Janeiro de 2012. Segundo o SOL apurou, do ‘Deve e Haver’ constam informações documentais e gráficas que suportam a tese segundo a qual é o Estado que deve dinheiro à Madeira e não o contrário.
“A reposição da verdade histórica das relações financeiras entre o Estado Português e a Região Autónoma da Madeira foi o principal objectivo que levou à concretização do projecto que agora se apresenta, cujos resultados científicos permitiram comprovar que, ao contrário do que comummente é público, a Madeira sempre foi magnânima nos apoios ao Reino e Estado, desde o século XV” – refere uma nota hoje divulgada pelo Governo Regional.
Conforme o SOL noticiou há cerca de um ano, as conclusões preliminares do ‘Deve e Haver’ indicam que, até 1974, o Estado só deixou na Madeira um quarto da receita que arrecadou no arquipélago.
A investigação compilou, numa colecção de 13 volumes, vários textos, notas, apontamentos, citações, testemunhos, relatórios e documentos. O estudo tem cerca de 10 mil páginas de texto e números. Para facilitar a comunicação, foi elaborado um sumário com as conclusões do documento.
Toda a informação baseia-se nos dados oficiais dos orçamentos do Estado, a partir do século XIX, e em diversa documentação que não só expressa as contas da Ilha como, também, as permanentes reclamações dos madeirenses desde o século XV.
Toda a informação que serviu de base ao estudo foi reunida e sistematizada numa base de dados, de forma a permitir o acesso à comunidade científica e política. Para elaborar o estudo, a Região recorreu a fundos comunitários através do programa ‘Intervir +’: entre 2006 e 2011, foram orçamentados para o projecto mais de meio milhão de euros.
A ‘Ilha do Tesouro para a Metrópole’
O ‘Deve e Haver’ é o sustentáculo para outras reivindicações. A Madeira defende mais autonomia, um sistema fiscal próprio para a Região e uma revisão constitucional para reformar o Estado.
“Contrariando a ideia de despesismo que se associa a esta Região Autónoma, a história mostra uma ilha que sempre se disponibilizou a pagar despesas que não lhe competiam (…) Os dados agora disponíveis – que não cobrem todos os anos em causa – revelaram, com clareza e rigor técnico, um superavit nas contas do Deve e Haver em favor do Estado, com prejuízo inegável para a Região Autónoma. Excedente que, no decurso dos séculos XV a XVIII, chegou a mais de dois terços” – revela a súmula feita pela Quinta Vigia.
São “dados históricos que desmontam a ideia de a Madeira ser uma ilha despesista e que provam, pelo contrário, que a Região foi sempre ‘a ilha do Tesouro para a metrópole’, onde se encontraram os meios para custear despesas sem que se tivesse em conta as reais necessidades dos madeirenses e do desenvolvimento socioeconómico desta região portuguesa”, conclui-se.