Combustíveis low cost geram polémica

O objectivo de introduzir combustíveis low cost (baixo custo) é simples: baixar os preços da gasolina e do gasóleo. A medida é aplaudida pelos consumidores, mas os intervenientes e especialistas do sector petrolífero avisam que terá o efeito contrário ao pretendido. 

A proposta de lei, aprovada no Parlamento no final de Maio, visa “garantir as condições para permitir que os consumidores tenham acesso a combustíveis mais baratos, sem colocar em causa a liberdade económica e das empresas, mas sim reforçando o poder dos consumidores”, explicou ao SOL fonte oficial do Ministério do Ambiente, Ordenamento do Território e Energia. 

Ficam de fora da obrigação as bombas de gasolina situadas em municípios nos quais se comprove que há uma “percentagem significativa” de combustível vendido “a um preço médio de venda ao público situado dentro do intervalo de valores do preço de referência”, a determinar pela entidade supervisora do sector – a ENMC, segundo o diploma.

A nova legislação será agora discutida na especialidade, na Comissão Parlamentar de Economia e Obras de Públicas. E a tutela espera ver os combustíveis low cost nas redes de abastecimento no Outono. 

A data pode, contudo, ser 'apertada', tendo em conta que as operadoras e associações do sector alegam que faltam elementos essenciais para a implementação do projecto-lei, como o preço de referência.

Segundo António Comprido, secretário-geral da APETRO, “ainda não se sabe como o preço vai ser calculado”. “Há uma série de incógnitas que ainda não estão definidas. Mas uma coisa sabemos: vai ser mais caro operar um posto obrigado a disponibilizar mais produtos, o que se irá reflectir no preço final”, alerta o responsável da associação que representa as empresas petrolíferas.

A Galp, líder do segmento, também aponta o dedo à nova medida. Sublinhando ser “defensora de mercados livres e concorrenciais, sendo que a maximização dos benefícios para os consumidores resulta acima de tudo da livre iniciativa dos operadores”, considera que “a legislação proposta vai no caminho inverso”.

Questionado sobre a previsão da descida média dos preços dos combustíveis, o Ministério de Jorge Moreira da Silva refere:  “O Governo não irá apontar preços concretos. É de esperar que o reforço do poder dos consumidores aplique uma forte pressão que faça baixar o preço, ao clarificar as semelhanças entre os combustíveis à venda nos postos mais baratos e nos mais caros”.

Para os especialistas do sector, o investimento em novos depósitos e mais cisternas e o reforço do abastecimento diário das gasolineiras serão os principais 'entraves'. Como explica Clemente Pedro Nunes, professor do Instituto Superior Técnico, “uma coisa são as redes low cost – como têm os hipermercados, que são construídos de raiz e têm outra fonte de lucro – e outra os custos que os postos tradicionais vão ter na implementação de um novo tipo de combustível nas actuais redes”.

O 'balão furado'

Quanto à medida poder trazer maior concorrência e novos players, como defende o Governo, “é a mesma coisa que impor a um comerciante a venda de cerveja belga: é um balão furado”, comenta outro especialista, que preferiu não ser identificado.

Então, de que maneira as gasolineiras vão conseguir ter combustível mais barato? “Através da redução de aditivos. Diminuir o índice octano (que mede a capacidade da combustão) poderá ser uma forma de low cost. As petrolíferas só vão conseguir ter um produto mais barato se for mais fácil de produzir e tiver menores custos”, acrescenta Clemente Pedro Nunes.

Novos aumentos a caminho

A discussão do novo diploma acontece quando o preço do petróleo nos mercados internacionais continua a subir.

Em Portugal, no último mês, a gasolina 95 aumentou 2,8%, para 1,604 euros por litro, uma subida de quatro cêntimos. O gasóleo ficou dois cêntimos mais caro, custando em média 1,320 euros.

A tensão no Iraque, um dos maiores produtores, gerou receios de quebra na produção e redução dos fornecimentos, o que puxou pelas cotações para máximos de Setembro de 2013.

No último mês, o valor do Brent subiu 2,30%, para 111,93 dólares. O mercado prevê nova 'escalada' no segundo semestre.  Segundo os analistas do Barclays “a estabilidade dos preços do petróleo”, que se vinha a verificar, “acabou”. 

Tiago da Costa Cardoso, gestor da XTB, explica que “neste momento os investidores estão preocupados com os stocks”. E sublinha que a situação na Líbia também tem gerado volatilidade. “O facto de na quarta-feira os rebeldes líbios terem reaberto o porto de Es Sadar, gerou um alívio enorme do preço do Brent, com uma queda de 1,1 dólares, mesmo tendo os stocks de crude caído”.

sara.ribeiro@sol.pt