PGR analisa acção de médico que assistiu Dux

O procurador do Ministério Público (MP), que arquivou a investigação à morte dos seis estudantes na Praia do Meco, está a analisar a actuação do médico que assistiu o sobrevivente, quando este chegou ao Hospital Garcia de Orta, em Almada, na madrugada da tragédia, apurou o SOL junto de fonte da Procuradoria-Geral da República. 

PGR analisa acção de médico que assistiu Dux

No relatório médico feito pelo profissional em causa – um clínico-geral que trabalha na urgência daquele hospital público através de uma empresa privada – apenas está descrito que João Gouveia tinha uma dor de cabeça e que foi-lhe receitado um paracetamol. A situação despertou a atenção dos investigadores, que depois de ouvirem todas as testemunhas ficaram com a certeza de que o dux tinha estado em hipotermia. 

Por isso, decidiram chamar de novo o médico a depor, tendo este admitido, segundo diz o próprio coordenador do inquérito, que “atropelou as boas práticas” médicas. O MP está neste momento a analisar o caso para apurar se há indícios de algum crime ou de outras irregularidades, podendo abrir um processo ou enviar o caso para a Inspecção-Geral das Actividades em Saúde.  

Entretanto, a administração do Hospital Garcia de Orta, onde o médico trabalha como tarefeiro desde a década de 1990, também decidiu averiguar a situação para ver se há motivo para instaurar um inquérito interno. Segundo apurou o SOL, a advogada da unidade de Saúde deslocou-se na terça-feira aos serviços do MP de Almada para pedir a consulta dos depoimentos do médico nos volumes que compõem o processo. 
O clínico geral foi das primeiras testemunhas a serem ouvidas pelo MP  durante a investigação ao caso do Meco. E, na primeira audição, terá transmitido a ideia de que João Gouveia, que deu entrada nas urgências três horas depois da tragédia, estava bem e apenas com um dor de cabeça, tendo sido medicado com 500 mg de paracetamol. 

Uma versão bem diferente da que veio depois a ser descrita aos investigadores pelos bombeiros e socorristas do INEM, que garantiram ter encontrado o dux “quase morto” na areia, encharcado e com vestígios de vómitos na roupa. Factos confirmados pelos depoimentos dos elementos do Instituto de Socorros a Náufragos, segundo os quais o jovem estava gelado, com uma temperatura corporal de 34 graus e “quase em falência vital”. 

Depois de ouvir estas testemunhas, o MP ficou sem dúvidas de que João Gouveia tinha sofrido “hipotermia”. Além disso, como o próprio procurador de Almada escreve no despacho de arquivamento à morte dos seis jovens na madrugada de 15 de Dezembro de 2013, estes depoimentos “puseram a nu a actuação do médico de urgência”, que deu alta ao jovem duas horas depois de chegar às urgências. 

E assim, quando a 13 de Maio foi ouvido em novo depoimento, o tarefeiro fez um “mea culpa  clínico”, diz o MP.  
“Não falo sobre o assunto. Tudo o que tinha a dizer já disse às autoridades”, disse ao SOL o médico, cujo relatório clínico, elaborado após ter observado João Gouveia, não faz qualquer referência ao que se passara nas horas anteriores nem contempla pedido de exames complementares. Isto apesar de a enfermeira da triagem da urgência do mesmo hospital ter dito ao MP que o jovem parecia um “croquete”, tal era a quantidade de areia que tinha no corpo.

Aliás, o próprio sobrevivente diz hoje considerar estranho que, por ter estado em pré-afogamento, o médico não lhe tenha pedido exames. “Pelo que soube [o médico], não tinha lido o relatório”, disse João Gouveia à revista Sábado, recordando que apenas lhe perguntou se lhe doía alguma coisa. “Respondi que me doíam os ombros e o pescoço”, relata o dux, lembrando que depois o clínico geral medicou-o e deixou-o “a dormir um pouco”, tendo voltado duas horas depois para lhe dar alta médica.

joana.f.costa@sol.pt