"Milhares de afegãos foram mortos ou feridos pelas forças dos EUA desde a invasão, em 2001, mas as vítimas e suas famílias têm poucas hipóteses de fazer justiça. O sistema de justiça militar dos Estados Unidos não responsabiliza os seus soldados por homicídios ilegais e outros abusos ", disse Richard Bennett, director da Amnistia Internacional para a Ásia-Pacífico.
O relatório incide principalmente sobre os ataques aéreos e incursões nocturnas realizadas pelas forças norte-americanas, incluindo forças de Operações Especiais. Estes crimes de guerra mesmo quando investigados passam sem qualquer punição. A ONG diz ter reunido provas "de um sistema de justiça militar norte-americano com muitas falhas, que permite uma cultura de impunidade".
A organização ressalva que de acordo com o direito internacional (leis de guerra), nem todas as mortes de civis, em conflitos armados, implicam uma violação legal. No entanto, se os civis parecerem terem sido mortos deliberadamente, de forma indiscriminada, ou como parte de um ataque desproporcional, o incidente requer uma investigação imediata, completa e imparcial. Se esse inquérito mostrar que as leis de guerra foram violadas, um processo deve ser iniciado.
Investigações criminais formais na morte de civis no Afeganistão são extremamente raras. A Amnistia Internacional tem conhecimento de apenas seis casos desde 2009, nos quais militares norte-americanos acabaram por enfrentar acusações.
Das dezenas de testemunhas contactadas pela AI para a realização deste relatório, apenas duas pessoas disseram que tinham prestado declarações a pedido dos investigadores norte-americanos. Em muitos dos casos abordados no relatório os militares dos EUA ou porta-vozes da NATO anunciaram que estavam a ser realizadas investigações, mas não divulgaram qualquer informação sobre o andamento da investigação ou as suas conclusões.
O relatório detalha, por exemplo, um ataque aéreo das forças norte-americanas, em 2012, nas montanhas da província oriental de Laghman, onde mulheres estavam a recolher lanha. Sete mulheres morreram e outras sete ficaram feridas.
"Não tenho nenhum poder para pedir ajuda. Não posso levá-los à justiça", lamentou Ghulam Noor, que perdeu a filha, de 16 anos, durante o ataque. Qandi Agha, prisioneiro em Nerkh no final de 2012, falou sobre as sessões diárias de tortura que sofreu. "Quatro pessoas bateram-me com cabos, amarraram as minhas pernas e bateram nas solas dos meus pés com um bastão de madeira." Agha afirmou ainda ter sido submetido a choques eléctricos.
"Três dias depois do ataque, o comandante convidou-nos a ir à base e pediu-nos desculpas. Dissemos que não íamos perdoar, dissemos ainda que não queríamos o seu dinheiro; Queremos levá-los a tribunal", contou Mohammed Nabi, cujo irmão de vinte anos, Gul Nabi foi morto, juntamente com quatro outros jovens, num ataque de helicóptero perto de Jalalabad, a 4 de Outubro de 2013.
A AI detalhou 10 incidentes que ocorreram entre 2009 e 2013, todos com vítimas civis resultantes de operações militares dos EUA. Pelo menos 140 civis foram mortos, incluindo mulheres grávidas e pelo menos 50 crianças.
"Exortamos os militares dos EUA a investigar imediatamente todos os casos documentados no relatório e todos os outros casos em que foram mortos civis. As vítimas e seus familiares merecem justiça ", disse Richard Bennett.