A esmagadora maioria pertencente ao grande grupo dos animais, que inclui vertebrados e, no caso português, muitos invertebrados, como aranhas, moscas, lacraus e escorpiões, fungos, cromistas -como as algas e outros microorganismos – e bactérias.
Umas resultaram da evolução dentro da própria espécie, outras foram documentadas só agora – um longo processo que passa pela confirmação de que ainda não tinham sido nomeadas antes como seres vivos únicos.
Nova mosca detectada este ano na Serra de Monchique
Já este ano, foi descoberta e descrita, na Serra de Monchique, no Algarve, uma nova espécie de mosca – a colaspidea algarvensis, com reflexos dourados.
E, recentemente, foram identificadas duas espécies de formigas numa zona de olival perto de Moura, no Alentejo. Uma chama-se stronggylognathus caeciliae e a outra temnothorax tyndalei. Foram descobertas por uma bolsista e elevaram para 126 o número de tipos deste pequeno animal existentes no país.
O Alentejo, o Algarve, a Madeira e os Açores são, segundo os cientistas, áreas de grande relevância ecológica. E por isso, Portugal integra um dos 34 hotspots ecológicos identificados pela Conservação Internacional, organização com sede em Washington, EUA, que promove a conservação e utilização sustentada da biodiversidade.
O ano de 2013 foi bastante produtivo para os investigadores que, em terras portuguesas, descobriram pelo menos 12 novas espécies de aranhas, pseudoescorpiões, escaravelhos e outros insectos, como um de cor verde que foi baptizado com o nome cigarra-dos-arbustos.
Uma das aranhas descritas foi encontrada na ilha de São Jorge, nos Açores – o único local do mundo onde reside esta espécie.
Aliás, 36 das 118 descobertas são novas aranhas. Uma delas, a tecedeira-de-funil, foi encontrada por acaso, em 2009, quando os investigadores procuravam uma outra espécie no Parque Florestal de Monsanto, em Lisboa.
Nesse mesmo ano, foi ainda identificada em terras portuguesas a aranha mais pequena da Europa e uma das mais pequenas no mundo. Não chega a medir um milímetro (tem entre 0.43 e 0.58 mm) e só se conhecem exemplares do sexo feminino. Chama-se anapistula ataecina (sendo este último o nome de uma deusa da Natureza) e é conhecida também por aranha-cavernícola-do-frade por apenas ter sido vista em algumas grutas do Frade, em Sesimbra.
Entre os novos animais há também algumas aves, como o paínho-de-monteiro, uma ave marinha descoberta em 2008, que habita apenas nos Açores. A lista conta também com um escaravelho baptizado com o nome geoch noudari barrancos, em homenagem ao Castelo de Noudar, em Barrancos, onde foi encontrado.
Os dados a que o SOL teve acesso são do Naturdata, um projecto voluntário e o único que agrega toda a informação relativa a Portugal e onde estão listadas 36. 341 espécies: não só de animais mas também de plantas, existindo 134 que são exclusivas do território português.
Mas, segundo o responsável por esta base de dados iniciada em 2009, Ricardo Silva, “esta é a melhor lista possível, mas seguramente não estará completa”. Na verdade, saber o número das novas espécies detectadas em Portugal é uma tarefa “extremamente complexa”, admite o biólogo, especialista em aranhas. Isto porque até recentemente não havia qualquer entidade que o fizesse.
30 espécies de besouros e escaravelhos
De acordo com os números do Naturdata, os anos de 2009 e 2005 foram os mais ricos em descobertas, com 18 registadas em cada um. Em 2005, os cientistas foram surpreendidos com, pelo menos, quatro novos peixes: ruivaco-do-oeste, pardelha-do-mira, robaco e quimera-lusitana. E também com borboletas, moluscos e bactérias desconhecidas.
Já o ano de 2009 ficou marcado não só por aquela mini-aranha, mas também por novas moscas – como a ariasella lusitanica, de reduzidas dimensões e com asas atrofiadas, e a mosca-das-dunas-lusitanica, com manchas nas asas.
Entre as espécies mais encontradas pelos cientistas estão os escaravelhos. E um dos investigadores que tem dedicado grande parte da vida aos insectos coleópteros, mais conhecidos pelo comum dos mortais como escaravelhos e besouros, é Artur Serrano, do Departamento de Biologia Animal da Faculdade de Ciências de Lisboa. É responsável pela descrição de 66 espécies destes insectos desde 1985 – cerca de 30 só na última década.
A grande maioria foi encontrada em Portugal. Pela diversidade que representam, explica o perito, é “difícil referir a espécie mais importante” que descreveu e o seu contributo para reconhecer a importância do país enquanto hotspot de biodiversidade, mas arrisca destacar a pequena hypotyphlus lusitanicus, descrita em 2004: “Pertence a um género que não estava referenciado para Portugal e em termos filogenéticos [ou seja, a posição que ocupa em relação aos antepassados], as espécies mais relacionadas com ela estão na região dos Pirinéus”.
Umas das características destes animais, acrescenta o especialista, é viverem em zonas profundas do solo. Por isso, sublinha, “apresentam características morfológicas peculiares, como a ausência de olhos e alguma despigmentação corporal, além de exibirem diminutas dimensões – cerca de um a 2,5 milímetros de envergadura”. Só assim, explica, conseguem “viver nos pequeníssimos canais do solo”.
Aliás, o nosso país assume uma importância fulcral no estudo das grutas e outras cavidades naturais da Terra (espeleologia): “Portugal está localizado no extremo ocidental da Europa, o que tem um efeito de fundo de gargalo de garrafa, onde terminam várias linhagens de animais provenientes da Europa e da Ásia”, explica a bióloga Ana Sofia Reboleira, do Centro de Estudos do Ambiente e do Mar da Universidade de Aveiro.
Responsável pela descrição de mais de 20 novas espécies subterrâneas em Portugal, encontradas sobretudo em grutas, a especialista destaca o pseudo-escorpião gigante das grutas do Algarve (titanobochica magna), descoberto em 2010. “É um animal fascinante, com adaptações extremas à vida subterrânea, que é uma verdadeira relíquia biológica”, refere Ana Sofia Reboleira, outros dos nomes relevantes da investigação da vida que fervilha nos locais mais insuspeitos, sublinhando que as espécies subterrâneas são importantes devido à “raridade, endemismo e interesse evolutivo”.
“As espécies adaptadas ao meio subterrâneo são formadas por populações com um pequeno número de indivíduos e mais vulneráveis à extinção. Uma grande percentagem é o registo vivo de condições climáticas que outrora existiram à superfície e que conservam características únicas que permitem compreender a história da vida na Terra”, conta a especialista.
Falta sistematizar informação
Conhecer as espécies com as quais o ser humano partilha o espaço é fundamental, concorda Artur Serrano. “Os insectos são elementos fundamentais na composição, estruturação e funcionamento dos ecossistemas terrestres”, explica o investigador, lamentando o facto de “muitas das actividades humanas” ameaçarem os serviços prestados por estes pequenos animais, que não são nada valorizados: “Não faltam exemplos disso, como a destruição maciça das comunidades de abelhas na Europa e nos EUA, a poluição dos rios e da sua fauna de insectos e a destruição de habitats”.
Ricardo Silva, um dos responsáveis do Naturdata, também salienta a necessidade de conhecer melhor os seres com que partilhamos casa: “Só assim se preserva a biodiversidade. E é fundamental haver gestão da informação. Mas em Portugal, infelizmente, esta é uma necessidade que ainda parece não ser tida em conta pelas entidades oficiais, às quais compete proteger a Natureza”.
O país tem várias áreas classificadas, lembra o biólogo, questionando: “Mas sem informação como poderemos saber quais proteger e como fazê-lo?”.