João Medeiros, advogado de Silva Carvalho, adiantou ao SOL que o requerimento, apresentado em Junho, solicita também que os juízes da 1.ª secção da Instância Central Criminal de Lisboa se pronunciem sobre se consideram ou não inconstitucional a punição criminal que o arguido pode sofrer caso fale em julgamento de assuntos vinculados ao segredo de Estado.
No documento enviado ao presidente do colectivo, Pedro Lucas, Silva Carvalho alega que, a manter-se o segredo de Estado, não está garantido o seu direito à defesa, pondo-se mesmo em causa a constitucionalidade de um julgamento nestas condições. “Questiono se um julgamento em que o arguido está impedido de falar e em que a documentação que ajuda a provar a veracidade da sua versão não será disponibilizada obedecerá aos direitos de defesa constitucionalmente consagrados no artigo 32.º”, esclarece ainda João Medeiros, que aguarda que o juiz responda ao pedido.
O último despacho que a defesa de Silva Carvalho recebeu do tribunal foi em 14 de Julho passado, a informar que o processo estava parado, devido à reorganização dos tribunais agendada para 1 de Setembro e o consequente movimento nacional de magistrados, não podendo o juiz nessa altura assegurar que seria ele a continuar como titular do processo.
A situação foi entretanto resolvida, tendo o caso ficado nas mãos do mesmo juiz, que pode em breve marcar o início do julgamento.
No processo, que tem cinco arguidos, Silva Carvalho é acusado de violação do segredo de Estado, corrupção e abuso de poder. Isto por alegadamente ter usado agentes do Serviço de Informações Estratégicas de Defesa (SIED), em Portugal e no estrangeiro, para obter informações para a Ongoing e conseguir que o presidente desta empresa, Nuno Vasconcellos, o contratasse – o que sucedeu em Janeiro de 2011.
Críticas a Passos Coelho e a Júlio Pereira
“Estou disponível para ser julgado amanhã. Tenho é de ter as mínimas condições”, diz ao SOL Silva Carvalho, fazendo críticas a altos dirigentes do Estado. “Lamento é que as mesmas pessoas do Governo e dos serviços secretos que contribuíram para eu ir a julgamento e não me protegeram sejam as mesmas que agora estão a limitar a minha defesa” – diz, referindo-se ao primeiro-ministro, que lhe negou até agora o levantamento do segredo de Estado, e a Júlio Pereira, secretário-geral dos Serviços de Informação, que deu um parecer nesse sentido.
O antigo director do SIED aproveita ainda para lamentar o tempo que está a demorar a Justiça, uma vez que a acusação foi já deduzida em 2012. “Há três anos que estou limitado na minha actividade profissional e pessoal”, refere, sublinhando que desde o primeiro momento solicitou “que o processo andasse o mais rápido possível, tendo prescindido da instrução” e disponibilizando-se para “prestar todos os esclarecimentos”.
Apesar de a acusação ter sido deduzida em Maio de 2012, Nuno Vasconcellos – indiciado por violação do segredo de Estado, corrupção e abuso de poder – pediu a instrução e esta apenas ficou concluída em Abril deste ano. O Tribunal de Instrução Criminal de Lisboa decidiu levar a julgamento cinco arguidos: não só Silva Carvalho, Nuno Vasconcellos e João Luís, agente das secretas, mas também uma ex-funcionária da Optimus e o seu companheiro, que trabalhava no SIS, por acesso ilegítimo a dados telefónicos de um jornalista e violação do segredo profissional.
‘Sou leal aos meus amigos’
“Compreendo que o Nuno Vasconcellos tenha a sua estratégia de defesa, mas é claro que isso atrasou o processo porque ultrapassou todos os prazos previstos”, argumenta Silva Carvalho. Apesar de ter saído da Ongoing em Janeiro de 2012, continua a falar com o ex-patrão: “Sou leal aos meus amigos”.
O ex-dirigente do SIED argumenta que, com este processo, já perdeu várias hipóteses de emprego. “Esta situação é de risco profissional para funções de administração de empresas ou na área negocial”, conta, explicando que as empresas não querem ser alvo de pressão mediática: “Um alto responsável de uma empresa internacional até me disse que não queria arriscar ter títulos nos jornais, mesmo que falsos”.
Silva Carvalho afirma estar arrependido de, logo no início do caso, não ter tido outra reacção. “Quando o processo começou a ser mediatizado, devia ter sido mais incisivo na respostas públicas às minhas acusações”. “Também não tinha esperado tanto de pessoas que ocupam cargos de relevo no Estado” – acrescenta, referindo-se claramente a Júlio Pereira, que na altura enviou para a Procuradoria-Geral da República um documento em que não descartava a possibilidade de os serviços de informações terem sido usados para outros fins.