Em segundo, narra-se uma palestra de Bertrand Russell numa universidade americana, a 4 de Setembro de 1939, na qual ele defende a não-intervenção dos EUA na Segunda Guerra. No centro de tudo, conta-se o que Russell disse naquela palestra: a história da sua vida, da busca de certezas matemáticas e da autonomização da lógica, na fronteira entre a Matemática e a Filosofia.
Mais do que em algumas das mais famosas novelas gráficas de inspiração autobiográfica (Maus, Art Spiegelman; Persepólis, Marjane Satrapi; Diary of a Teenage Girl, Phoebe Gloeckner; Palestina e Área de Segurança: Gorazde, de Joe Sacco), o principal trunfo de Logicomix é a identificação dos próprios mecanismos da ficção (metaficção). Aqui, o recurso surge justificado, e fundido, na noção de auto-referência, fundamental no edifício teórico de Russell.
Através do próprio questionamento pelo protagonista e das discussões entre os autores sobre o rumo da história, esta desenvolve-se num movimento pendular, entre a procura do concreto e a intromissão do abstracto, entre o rigor da racionalidade e a sombra ameaçadora da loucura. A aventura resulta inconclusiva: demonstra, em simultâneo, o fracasso (das verdades “auto-evidentes”) e a vitória (“a criação do computador, o verdadeiro herói da busca”) da empresa do herói.
A ideia de que “a lógica e a insanidade são estranhas companheiras”, o enfoque nos terrores mais íntimos e na tenacidade intelectual de Russell (“a minha paixão quase maníaca pelo conhecimento sólido e absoluto era sem dúvida intensificada pela minha solidão”) funcionam como porta emocional para a adesão do leitor à história.
Logicomix é uma narrativa humanizada, sobre o grau de criatividade e irracionalidade implicado na genialidade científica e o grau de certeza e eficácia a que esta pode aspirar.
Logicomix
Apostolos Doxiadis e Christos H. Papadimitriou (texto) Alecos Papadatos e Annie Di Donna (arte)
Gradiva
351 págs., 16 euros