Como foi o processo de pesquisa para Saint Laurent?
Li cinco ou seis biografias. Vi o máximo de imagens de colecções, apartamentos e objectos dele. Quando a história é real, corta-se até se chegar ao essencial. Se decides contar tudo, não contas nada. As biopics de que gosto mais, como Van Gogh, de Maurice Pialat, abordam momentos e não vidas inteiras.
O filme de Jalil Lespert aborda a ascensão de YSL, mas a si interessou-lhe o período entre 1967 e 1976.
Foi a década mais louca e criativa. Nela temos tudo sobre o homem: a juventude, as suas principais invenções e, quando termina, mesmo se ele ainda só tem 40 anos, já vemos no que se ia tornar.
Até onde se permitiu ficcionar?
Fartei-me de dizer ao meu co-argumentista [Thomas Bigedain]: ‘Não estamos a fazer um biopic, estamos a fazer um filme. Se este acontecimento não fosse verídico, pô-lo-íamos no filme?’ Por exemplo, a carta do Andy Warhol ao Yves foi inventada para mostrar que ele era muito famoso sem ter de utilizar imagens de imprensa da altura. Através da mentira encontrar uma certa verdade – esta é a grande beleza do cinema.
Começa o filme com a informação mais contundente sobre Yves: o trauma da guerra da Argélia contado numa entrevista ao telefone.
O Pierre Bergé diz algo sobre Saint Laurent que eu repito muitas vezes: ‘Yves nasceu com um colapso nervoso’. Essa cena serve para mostrar um homem muito frágil, não para dar uma razão para ele ter sido desta ou daquela forma.
Porque tentou Pierre Bergé boicotar o seu filme?
Ele gosta de ter tudo sob controlo. Acontece que, para fazer este tipo de filme, é preciso ser livre. Não o contactámos e ele não gostou disso. Mas quando começámos a rodar ele deixou de nos chatear.
Colocou estas palavras na boca de Yves: “Ninguém compete comigo, esse é o meu drama”. A sua melancolia vinha deste esforço constante para se superar a si próprio?
Sem dúvida. Um designer de moda tem quatro colecções para fazer por ano. A melancolia e a pressão levam ao álcool e aos comprimidos, que por sua vez levam à depressão. É um ciclo vicioso. Puxei por isto: quanto lhe custava ser ele próprio? O preço a pagar e a melancolia que acompanham alguns artistas foi o que quis retratar.
Dividiu o ecrã para resumir algumas das suas colecções, a par de acontecimentos no mundo importantes na altura: o Maio de 68, a guerra no Vietname… Mostra que ele estava desconectado da política. Não é a moda toda assim?
Sim, é. Embora sinta muita empatia por ele, quis sublinhar que é assim que funciona. Foi muito difícil imaginá-lo a andar na rua, senti que tinha de o isolar da realidade, colocá-lo numa caixa que de alguma forma o protegia e que de alguma forma era uma prisão, mesmo que uma prisão de ouro.
Passa a ideia de que no início dos anos 80 a indústria está a mudar. Yves hoje não se reveria na marca?
Se estivesse vivo, estaria triste. O marketing tornou-se tão grande que já não vemos tanto a roupa. Mas também foi ele que inventou muitas coisas que contribuíram para essa mudança. Começou com o sonho de ser um artista e tornou-se numa grande marca.