Miguel Trindade, que em 1998 começou a trabalhar nas áreas de mercado cambial e mercado monetário no BPP, passando a subdirector da sala de mercados com a entrada, em 2008, da administração provisória presidida por Fernando Adão da Fonseca, disse hoje que, embora não tivesse tido um relacionamento directo com Paulo Guichard, as opiniões eram as de que este "não tinha nem capacidade nem mérito para os poderes que tinha e as decisões que tomava".
O economista depôs hoje como testemunha de defesa arrolado por João Rendeiro no processo de impugnação das contra-ordenações aplicadas pelo Banco de Portugal em Outubro de 2013, num valor global superior a 10 milhões de euros, por falsificação de contabilidade, inobservância de regras contabilísticas, prestação de informações falsas ou incompletas, entre outros, que impediram o conhecimento da real situação patrimonial e financeira do grupo.
No processo que corre no Tribunal da Concorrência, Regulação e Supervisão, em Santarém, estão a ser julgados os pedidos de impugnação apresentados por dez dos 11 arguidos.
Miguel Trindade afirmou que em 2004 e 2005 "começou a notar-se que João Rendeiro passou a ter menos controlo" e começaram a ouvir-se "muitos zunzuns", com as pessoas a saírem "descontentes" das reuniões com Paulo Guichard, então administrador do BPP, devido às "decisões que tomava".
Nessa altura, disse, o fundador e ex-presidente do BPP, João Rendeiro, estava "mais preocupado com arte" e com "viagens ao Brasil" e "menos preocupado com o banco".
Afirmando ter uma opinião profissional sobre João Rendeiro "sempre boa", o economista afirmou que "o problema foi ter-se desligado e dado muita força a quem não devia".
Miguel Trindade fez referência ao período da administração provisória para afirmar que Adão da Fonseca "ficou furioso com o Governo" pela insolvência do banco.
"Havia a promessa de que o plano de recuperação e saneamento", no valor de 450 milhões de euros, elaborado por Paula Figueiredo, seria aprovado. Adão da Fonseca "sentiu-se traído pelo Governo", afirmou.
Na sexta-feira, o Tribunal de Justiça da União Europeia confirmou a decisão da Comissão Europeia de ordenar a recuperação da ajuda estatal prestada ao BPP, indeferindo o recurso apresentado pelo banco e pela massa insolvente.
Em causa está uma decisão de Julho de 2010 do executivo comunitário, que considerou que a garantia do Estado português sobre o empréstimo de 450 milhões de euros concedido em 2008 ao BPP foi um auxílio estatal "ilegal e incompatível", ordenando por isso às autoridades nacionais a recuperação do auxílio.
O julgamento que se iniciou no passado dia 23 de Junho encontra-se em fase de audição de testemunhas de defesa, tendo João Rendeiro arrolado vários docentes e responsáveis do Instituto Superior de Economia e Gestão, como António Ascensão Mendonça, seu colega de curso, que depôs hoje, João Duque, agendado para quarta-feira, ou Victor Barros (08 de Janeiro).
Para terça-feira, está agendado o depoimento de Jorge Braga de Macedo, sem que o Tribunal tenha ainda recebido confirmação da recepção da notificação.
O Banco de Portugal (BdP) condenou o BPP ao pagamento de uma contra-ordenação no valor de três milhões de euros, suspensa em metade do seu valor pelo período de três anos, e a Privado Holding ao pagamento de 2,5 milhões de euros.
João Rendeiro foi condenado a pagar 1.995.191,58 euros, sofrendo ainda a sanção acessória de inibição do exercício de cargos em qualquer instituição de crédito ou sociedade financeira pelo período de 10 anos.
Paulo Guichard foi condenado ao pagamento de 1,5 milhões de euros, e inibição por um período de 10 anos, Fezas Vital a uma coima de 850 mil euros, acrescida de inibição por oito anos, Paulo Lopes a pagar 400 mil euros, suspenso em metade do valor por cinco anos, e inibição de exercício de cargos no sector por cinco anos.
A Vitor Castanheira foi aplicada uma coima de 190 mil euros, suspensa em metade do valor por cinco anos, e inibição por dois anos, a Fernando Lima 275 mil euros, suspensa em metade do valor por cinco anos, e inibição por três anos, a Tiago Ferreira 240 mil euros, suspensa em cinco sextos do valor por quatro anos (o único que não recorreu).
Foram ainda condenados Rui Domingues, a uma coima de 90 mil euros e Nuno Paramés de 75 mil euros, ambas suspensas em cinco sextos do seu valor por quatro anos.
Lusa/SOL