Gritos de “Je Suis Charlie”, entoações espontâneas do hino francês, aplausos mas também períodos de silêncio em memória das vítimas das acções terroristas desta semana em França. Esta foi a banda sonora daquilo que o Governo francês considera ter sido uma manifestação sem precedente no país.
Ao final do dia, as autoridades estimavam que 3,7 milhões de cidadãos de diversas nacionalidades tivessem saído à rua, e essa diversidade era visível nas bandeiras de múltiplos países que eram exibidas sobretudo na maior marcha republicana, a de Paris. Muçulmanos, cristãos, judeus, ateus e pessoas das mais diversas confissões, ideologias e origens expressaram a sua condenação à vaga terrorista que começou na quarta-feira com o massacre de 11 membros da redacção do jornal satírico Charlie Hebdo, numa acção em suposta represália pela publicação de caricaturas de Maomé.
Na capital francesa, chefes de Estado, de Governo e representantes políticos e diplomáticos de dezenas de países – entre estes Angela Merkel, Mariano Rajoy, David Cameron, Benjamin Netanyahu ou Mahmoud Abbas, bem como Pedro Passos Coelho – caminharam lado a lado com o Presidente francês François Hollande durante cerca de 20 minutos, e cerca de 200 metros, na cabeceira da manifestação.
Foi uma acção sobretudo simbólica que produziu uma imagem forte de unidade contra o extremismo e pela liberdade de expressão. Isto apesar de, nas redes sociais, muitos cidadãos sublinharem a contradição entre esta tomada de posição e as práticas de vários destes altos dignitários nos seus respectivos países – nomeadamente a Turquia, a Hungria, a Rússia ou o Egipto.
A pequena passeata dos notáveis, realizada sob um apertado esquema de segurança, decorreu sem registo de qualquer incidente.
Também se realizaram manifestações noutros países europeus. Cerca de 20.000 pessoas marcharam em Bruxelas, 18.000 em Berlim e 12.000 em Viena, entre os eventos mais participados indicados pela agência Lusa. Em Portugal também houve demonstrações de solidariedade, com destaque para uma manifestação em Lisboa – mais pequena, apesar de tudo, do que a concentração registada na quinta-feira.
Um total de 19 pessoas morreram em três dias de terror em França. O ataque ao Charlie Hebdo, cometido por dois irmãos muçulmanos de nacionalidade gaulesa, foi reivindicado pela al-Qaeda da Península Arábica, filial da rede terrorista fundada por Osama bin Laden sediada no Iémen. O atentado num supermercado judaico de Paris, cometido na sexta-feira por outro francês muçulmano, que no dia anterior tinha assassinado uma agente da polícia na mesma cidade, é atribuído ao Estado Islâmico. No entanto, e apesar dos autores terem sido abatidos pelas autoridades, estas ocorrências continuam sob investigação.
pedro.guerreiro@sol.pt