Liberta-te, vale a pena voar

Uma breve viagem pelos filmes históricos que diariamente passam quer no cinema como na televisão mostram-nos como a sociedade antigamente era feita de acções e pensamentos estereotipados, em que tudo era determinado por uma qualquer cartilha que nos dizia inúmeras coisas que percebíamos depois estarem erradas. Como exemplo a superioridade de algumas raças, que o…

O mundo evoluiu e assistimos nos anos 70 e 80 a um culto da espontaneidade, pela primeira vez era possível passar os limites e determinar os seus próprios impulsos sem que isso fosse 'crime'. A música, como sempre, foi um dos grandes impulsionadores dessa nova corrente que tornava as pessoas mais naturais, seres pensantes, mais pela sua própria cabeça, com vontades muito próprias que acabavam por pôr em prática sem que isso fosse julgado. Eram os anos dourados, talvez excessivamente dourados, mas por vezes é importante irmos aos anos 80 até para calibrarmos as nossas próprias necessidades e anseios. Para nos tornarmos mais conhecedores de quem somos é fundamental termos a percepção dos nossos próprios limites.
 
O que é facto é que talvez toldados pela depressão económica deixámo-nos adormecer e regredir nos nossos sonhos, nas atitudes e na forma como abordamos a vida, o mundo e, fundamentalmente, os que nos rodeiam. As pessoas voltaram a não ser tão naturais, muito menos expressivas e mais pragmáticas, parece que tudo o que nos fazia libertar do stresse diário nos foi proibido com regras e mais regras, umas efectivas outras morais. Tudo é criticado, todos temos que viver dentro do cinto de amargura e da angústia, ninguém se pode exceder porque vivemos tempos difíceis e isso deixa-nos mais calculistas, frios e mesquinhos.
 
Enquanto noutros países quando passa uma miúda ela é elogiada seja pelo que veste, pela sua beleza, conquistas profissionais ou tão só pelo seu cheiro, cá temos a mania de estarmos sempre mais próximos da crítica do que do elogio, temos muita dificuldade em alimentarmos o ego e as proezas uns dos outros e assim vamos prosseguindo no nosso triste fado. Quando alguém bate palmas pela aterragem de um avião notam-se os sorrisos de troça da pessoa ao lado, quando dançamos mais freneticamente no meio da pista estamos a exibirmo-nos, quando nos queremos divertir e nos arranjamos melhor, gastando mais do que o normal, somos bêbados ou ganhámos o dinheiro na droga ou a vender armas.
 
Na noite, as pessoas deixaram de ter vontade de se arranjar e saem desleixadas porque não querem ter trabalho ou tão só porque se se arranjarem demais estão à procura de alguma coisa, têm medo de se divertir porque dão demasiado nas vistas – passámos a estar votados ao monocórdico, à monotonia, a sermos insípidos porque assim não somos alvos da inveja de ninguém. Eu não me conformo em viver a vida assim. Temos o direito de voar e de ser felizes mesmo com todas as dificuldades que quem nos dirige nos fez e faz passar. No Brasil e em Moçambique, por onde passei, não vi governos menos corruptos nem mais dinheiro, mas vi alegria, optimismo e vontade de acordar com um sorriso nos lábios.
 
Eu sei que não é fácil e já sei que me dirão que eu não passo por dificuldades, que se eu soubesse não falava assim, não estou a tirar a razão a ninguém nem estou a dizer que não é mais fácil falar do que fazer, mas acho que com todos os sacrifícios que temos passado merecemos ser um povo bafejado pela sorte, pela nossa humildade, cultura, pelo respeito que ainda temos uns pelos outros. Tentar por vezes libertarmo-nos das amarras das agruras dos tempos que correm, darmo-nos a oportunidade de sonhar um pouco, de sermos mais quentes, mais próximos, mais cheios, mais… Tenta nem que seja por um segundo e liberta-te… Vais ver que vale a pena voar…!