José Quitério

O Expresso da última semana trazia uma notícia, triste por sinal. O grande guru da crítica gastronómica portuguesa fechou o livro e não escreverá mais crónicas.

José Quitério de seu nome, era o verdadeiro artista que tantos empresários da restauração temiam. Durante muitos anos poucos conheciam a sua cara e só quando saíam as suas crónicas no semanário é que ficavam a saber que tinha estado no restaurante. Muita coisa se alterou quando fez o seu livro e apareceu nas televisões e noutros jornais. Tive o privilégio de partilhar algumas refeições com Quitério, que eram um verdadeiro tratado.

Munido de um pequeno gravador que guardava no bolso da camisa, ia debitando a ementa, com os respectivos preços, para no final fazer as suas apreciações. Procurava sempre levar outras pessoas que pediam pratos variados para os poder provar.

Recordo-me de histórias hilariantes de alguns donos de restaurantes que faziam queixa a alguém que conheciam do jornal, dizendo que era impossível José Quitério falar de tantos pratos se apenas tinha ido duas vezes ao mesmo local. Outros pensavam que o grande crítico se aproveitava do cargo para pagar jantares a amigos, não percebendo que essas pessoas eram necessárias para ele provar vários pratos.

Também durante muito tempo ouvi queixas de que a rubrica de restaurantes e vinhos ficava muito cara, já que não aceitava borlas e tinha, por exemplo, o cuidado de comprar as garrafas (pois não escrevia sobre ofertas) em diferentes lojas. Mas, além da comida e da bebida propriamente dita, Quitério era uma figura que não deixava ninguém indiferente. Longas noites no Snob com os seus amigos, entre os quais Torcato Sepúlveda, acabavam em discussões hilariantes. Outra história curiosa é que se recusava a escrever sobre os restaurantes próximos da redacção, na então Duque de Palmela. Tudo em nome da sua independência e da boa vizinhança.

Foi dos críticos mais livres que conheci e com quem tentei aprender. Por problemas de saúde deixou de escrever, embora ainda tenha a esperança de o encontrar um dia destes no mítico Snob, do senhor Albino.

Tchim, Tchim, ao José Quitério.

vitor.rainho@sol.pt