Depois de um acordo para o caderno de encargos da privatização da TAP, os sindicatos vão ter uma palavra a dizer na escolha do vencedor?
Não. Cada um tem de assumir as suas responsabilidades e fomos eleitos para decidir. Há 16 anos que se fala em privatizar a TAP. E no final não houve um único Governo que conseguisse passar das intenções aos actos. Terei muito orgulho se concluirmos este mandato com a TAP privatizada a 66% e bem privatizada.
O que quer dizer 'bem privatizada'?
O caderno de encargos é muito completo. A capacidade e o compromisso de capitalizar a TAP para que cresça são determinantes. E não para despedir pessoas, reestruturar a empresa ou diminuir a sua actividade. A TAP tem cerca de 80 aviões e 80 destinos. Mas cumprirá melhor o seu desígnio de defesa do interesse nacional se puder ter 150 destinos e 20 milhões de passageiros em vez dos 11 milhões actuais.
E se as obrigações do caderno de encargos não forem cumpridas?
Não pactuaremos com qualquer violação das exigências, que obrigam a manter a marca TAP, a sede e a base operacional em Portugal, sem prazo. Existe um direito de reversão, ou seja, a TAP regressar ao Estado. Não seria o ideal, e não é isso que pretendemos, senão não privatizávamos. Mas está prevista essa possibilidade.
Também podem suspender a venda caso não haja candidatos que cumpram todos os critérios. Nesse cenário, qual é o plano B?
Temos de nos focar no plano A. Ninguém pergunta ao Cristiano Ronaldo, quando vai marcar um penálti, o que vai fazer se falhar. Ele não falha. Se falhar, logo se vê.
O Governo limitar-se-á a um 'logo se vê' se não houver privatização?
Fizemos o trabalho de casa para que a privatização seja feita. Se não fosse, não seria bom para a empresa, mas também não significa que a TAP morresse. Mas poderia definhar. Os aviões vão ficando mais antigos, as concorrentes oferecem condições que atraem os nossos pilotos e técnicos de manutenção. Quem verdadeiramente acha que a TAP tem um desígnio nacional a cumprir quer ver a empresa capitalizada. E sabe que tem de ter fortes accionistas privados para poder competir e crescer.
Se o preço de venda for acima do esperado, o Estado pode abdicar de vender os 34% que manterá na TAP?
Há um mecanismo de opções de venda e compra que pode ser exercido depois da privatização, tanto pelo vendedor como pelo comprador. Se nenhum deles exercer essa opção, pode eventualmente esta estrutura de capitais continuar. Se isso é desejável? Tenho as maiores dúvidas. As melhores empresas de aviação europeias são 100% privadas. E ninguém discute o facto de a Lufthansa ser um símbolo e uma empresa ao serviço da economia alemã. O mesmo se passa com a British Airways.
Os novos donos vão ficar inibidos de vender a empresa durante cinco anos, quando no processo de 2012 foram dez anos. Porque foi tomada esta decisão?
Porque isso retira valor à TAP. Uma empresa que já tem as obrigações que tem e cujos accionistas depois não podem vender as acções é menos atractiva. Além disso, o Governo tem um direito de preferência. Se daqui a seis ou sete anos a empresa ou parte da empresa fosse revendida e o Governo sentisse que o eventual comprador não era confortável para o Estado, poderia exercê-lo.
O que acontece se o futuro dono levar a TAP à falência ou degradar muito as condições financeiras?
Poderia ser uma razão para a reversão do negócio.
Que avaliação faz do trabalho de Fernando Pinto à frente do grupo?
Positiva. Estamos em funções há três anos e meio e as principais figuras da administração de Fernando Pinto mantiveram-se. A partir do momento em que se privatize a maioria do capital, devemos estar abertos a escolher os órgãos sociais em consonância com os novos accionistas.
Não devia ter havido maior concertação entre os principais partidos neste processo, tendo em conta que parte dele será decidido pelo próximo Governo, que pode ser PS?
Seria interessante. Mas António Costa, benza-o Deus, foi muito claro. Quando foi eleito disse que não queria nenhum compromisso com o Governo. Tivemos de assumir as nossas responsabilidades.
Tentou algum contacto com ele?
As relações com o principal líder da oposição são conduzidas pelo primeiro-ministro. Tínhamos um compromisso de privatizar a TAP nesta legislatura. E nunca fui tão atacado como desde que se aprovou o decreto-lei da privatização. Mas estamos preparados para isso. Estudámos, ouvimos potenciais interessados. Tentámos perceber como podiam funcionar as várias alternativas e todas estiveram em cima da mesa. Aprendemos também com o que correu menos bem no processo que não foi concluído em 2012.
Este é o derradeiro ano? Como disse, há muito tempo que se fala da necessidade de privatizar, mas a companhia sobreviveu e até cresceu. Daqui para a frente seria sempre a piorar?
Não. É uma visão de médio e longo prazo. Se na sua actividade profissional sabe que pode fazer uma coisa bem-feita, vai esperar por três ou quatro anos para alguém fazê-la por si? Eu não sou assim.
Mas a solução está longe de ser consensual.
Se o PS fosse coerente com o que já defendeu e que inscreveu no PEC III, no PEC IV e no memorando de entendimento, estaria a aplaudir esta privatização. Faz-me confusão que o tacticismo político muitas vezes impere em decisões que são de interesse nacional. A TAP, se não fosse privatizada, não tinha necessariamente de morrer nem amanhã nem no ano a seguir nem daqui a dois ou três anos. Mas não teria condições para crescer e desenvolver-se. Porque havemos de permitir que seja este o destino da TAP se se pode ambicionar competir com a Lufthansa e com a British Airways, pagar salários de topo aos pilotos e técnicos de manutenção, contratar mais, ter o dobro das rotas e destinos, aviões mais modernos? Porque é que havemos de cingir-nos à estagnação ou definhamento para a TAP?
Mas esta semana toda a oposição pediu a suspensão da venda no Parlamento. E o movimento Não TAP os Olhos, que também é contra, admite tentar um referendo.
Esse movimento está a fazer o seu papel, que é de um populismo atroz. Faz-me impressão como é que algumas pessoas por quem tenho consideração podem participar num movimento com estas características e achar que decisões sobre a sobrevivência de empresas fundamentais deve ser delegada não nos Governos, mas em movimentos referendários. E julga que estamos numa espécie de concurso de beleza para ver quem ama mais a TAP. Lamento bastante que o PS esteja agora a assumir estas posições tão demagógicas. Já se percebeu que António Costa não tem o sentido de Estado que matérias destas exigiriam de um candidato a primeiro-ministro.