As contas no UBS foram abertas por Santos Silva com dinheiro que os investigadores suspeitam ser do ex-primeiro-ministro e com origem ilícita.
Uma delas reporta-se a dinheiro colocado naquele banco até 2005 – cerca de 500 mil euros -, em nome de uma offshore titulada por Santos Silva. A quantia foi transferida nesse ano para Portugal, para o BES, ao abrigo do primeiro Regime Extraordinário de Regularização Tributária (RERT I), um perdão fiscal para quem tinha dinheiro escondido no estrangeiro.
A segunda conta é a referente aos mais de 20 milhões de euros que a investigação suspeita serem 'luvas' acumuladas entre 2005 e 2009, também em nome de uma offshore titulada por Santos Silva. Esse dinheiro foi igualmente transferido para Portugal, ao abrigo do segundo perdão fiscal – o RERT II, de 2010, decidido pelo próprio Governo de José Sócrates. Recorde-se que, para regularizar o dinheiro, e segundo as regras deste RERT, Santos Silva pagou um imposto de apenas 5% (cerca de um milhão de euros), quando em condições normais teria de pagar 50% (10 milhões).
Muito antes da detenção do ex-líder socialista, o Ministério Público (MP) português enviou cartas rogatórias para a Suíça, solicitando ao congénere helvético o acesso ao histórico de movimentos das referidas contas. Mas as autoridades daquele país, devido ao procedimento habitual nestes casos – em que o titular da conta é notificado para se pronunciar sobre o pedido judicial de quebra do sigilo bancário – só diligenciaram nesse sentido após a detenção do ex-primeiro-ministro.
Quando foi notificado, Santos Silva, através de representantes, deduziu oposição ao pedido, invocando os direitos ao sigilo e à reserva da vida privada. Conforme determina a lei suíça, tudo isto ficou registado num processo, em que, já com os dados na sua posse, as autoridades convidam as partes (MP e titular da conta) a fazerem as suas alegações. Segundo o SOL apurou, o pedido acabou por ser aceite e as informações já foram enviadas para Portugal – à semelhança, aliás, do que tem acontecido noutros processos, como o Monte Branco.
Os movimentos dessas contas são fundamentais para a investigação, nomeadamente para provar o crime de corrupção. No processo, estão em causa factos ocorridos nos dois mandatos do ex-primeiro-ministro (2005-2009 e 2009-2011) e não anteriores a 2005, como deu a entender há uma semana João Araújo, advogado de José Sócrates, numa entrevista à TVI. O advogado afirmou então que “a janela temporal [a que se referem os alegados crimes de corrupção] não bate certo com José Sócrates/primeiro-ministro”.
Os recursos dos arguidos da Operação Marquês contestando a investigação e as medidas de coacção foram distribuídos esta segunda-feira, através de sorteio electrónico, no Tribunal da Relação de Lisboa. O de Sócrates será apreciado pelos desembargadores Agostinho Torres (relator) e João Carrola (adjunto). O de Carlos Santos Silva foi atribuído à juíza Maria da Graça Santos Silva (sendo o mesmo apelido uma mera coincidência) e o do advogado Gonçalo Trindade Ferreira será decidido pelo juiz Ricardo Cardoso.
Em cada caso, o MP na Relação tem 10 dias para se pronunciar, cabendo depois à defesa outros 10 dias para contra-alegar.