Os resultados do insucesso escolar pioraram. A que se deve isto?
Temos níveis de reprovação muito elevados. A culpa não é só dos professores, embora estes o façam. Mas há um enquadramento que leva a isso. O que está em causa é precisamente esse enquadramento: uma cultura de retenção.
Quais as vantagens de reter ou não?
Não sou defensor da eliminação administrativa da retenção nem de aumentar os resultados estatísticos não mexendo em nada. Para diminuir os níveis de retenção vamos ter de trabalhar mais e melhor. Parte significativa dos alunos que são retidos nunca mais recuperam e, quanto mais cedo isso acontece, mais cedo entram neste trajecto de insucesso.
Temos de actuar preventivamente?
Sim, ajudá-los para que não entrem nesse percurso. Não é quando chegam ao 9.º ano que vamos agir. Este fenómeno esteve sempre escondido. Sabíamos que tínhamos taxas de retenção muito altas mas não se fazia nada. Fazia parte. Resignámo-nos. Mas a retenção custa 250 a 300 milhões de euros por ano. Se canalizarmos parte dessa verba para investir em apoios educativos e evitar que entrem neste trajecto, poupamos, temos possibilidade de ter mais professores e melhores aprendizagens. É um investimento.
Como é que isso se consegue se nos últimos anos tem havido uma diminuição dos apoios aos alunos.
É difícil chegar a essa conclusão. Sabemos que houve redução da despesa na Educação e o grosso deve-se aos salários dos professores. Mas não estamos numa abundância de recursos. Digo que uma intervenção cirúrgica nalgumas escolas onde as retenções são maiores traria ganhos grandes.
Não deve ser uma medida geral?
Não se justifica. Hoje sabemos as escolas, os estratos e as zonas onde há mais retenção.
O aumento do insucesso não se deve também ao alargamento da escolaridade obrigatória?
Não. O aumento das retenções nos últimos anos está centralizado no 6.º e 8.º anos e nas escolas públicas. Havia uma tendência para as retenções diminuírem e nos últimos três anos houve uma inversão. Temos de ver se é um problema das escolas, do Ministério da Educação ou das famílias.
Casos em que as escolas inflaccionam as notas dos alunos (em comparação com os exames) são pontuais ou há uma cultura instalada?
São pontuais e o problema está identificado há muitos anos. É uma situação que introduz uma injustiça enorme porque tem implicações no acesso ao ensino superior. Pode significar a entrada ou não num curso. Mas o problema não é só de quem favorece, mas dos critérios de acesso ao ensino superior. O modelo permite isso. Ao usar exclusivamente a classificação final, cria um incentivo a que os menos rigorosos influenciem as notas dos alunos para que entrem mais facilmente.
Isto resolve-se com inspecção?
Há uns anos colocou-se a questão de serem os estabelecimentos de ensino superior a escolherem os seus alunos. Não foi desenvolvido nenhum modelo porque não encontrámos interesse da parte das instituições superiores, embora reconheçam que não são os alunos com melhor nota que têm melhor desempenho. Em termos de justiça, temos de atalhar rapidamente a situação que está em cima da mesa. A médio e longo prazo, temos de olhar para os mecanismos de acesso ao ensino superior. Isso pode incluir provas específicas, entrevistas, outros indicadores que não apenas a nota.
As instituições do ensino superior estarão disponíveis para isso?
Não sei, têm estado muito caladas sobre o assunto. Mas vamos ter de falar sobre isso.