Já o primeiro filme do mexicano de 52 anos ganhou o epíteto de ‘Pulp Fiction mexicano’. ‘Amores Perros’ (2000), que encerra em si três histórias de vida ligadas por um acidente de automóvel, valeu-lhe a aprovação da crítica e alguns galardões europeus (os principais foram o BAFTA de Melhor Filme Não Inglês e o Prémio da Crítica em Cannes), assim como a entrada na passadeira vermelha de Hollywood com uma nomeação para Óscar de Melhor Filme Estrangeiro, que acabou por ser arrebatado por Ang Lee com o ‘Tigre e o Dragão’.
A dureza e realismo da longa-metragem que pôs Iñarritu na ribalta ficariam imagem de marca dos filmes do realizador. A morte, a violência, a crueldade ou o suicídio são temas que o mexicano privilegia. São certamente a catarse do seu medo da morte, um terror já confessado em algumas entrevistas. “Quem diria que ele estaria por trás de uma série de filmes conhecidos como a Trilogia da Morte? A forma como fala da mulher e dos filhos e a energia com que trabalha revela uma tremenda paixão pela vida”, descreve o jornalista Elvis Mitchell após uma longa entrevista a Iñarritu. A dado momento o realizador explica: “Não haveria forma de ter filmado dramas tão intensos sem algumas ferramentas para lhes sobreviver. É sabido que os comediantes têm um lado negro. Acho que no meu caso é igual. A única maneira de descer tão fundo é ter um equilíbrio”. Este equilíbrio traduz-se na personalidade descontraída do mexicano.
Mas é na dureza realista, nas emoções extremas e nos limites do medo que se conduzem também '21 Gramas’ (2003) e ‘Babel’(2006), as duas películas que fecharam a Trilogia da Morte após ‘Amores Perros’. Em todas há um denominador comum: o argumento assinado por Guillermo Arriaga, que deixou entretanto de fazer dupla com Iñarritu. Com Babel (2007) a ter uma mega-produção e com Brad Pitt e Cate Blanchett à cabeça do elenco, a trilogia não poderia ter encerrado de melhor forma. Esteve nomeada em sete categorias dos Óscares e arrecadou o de melhor banda sonora.
Com Javier Bardem protagonista, Barcelona de fundo e um drama duro, Biutiful (2010) foi novamente aclamado pela crítica, mas só esteve nomeado para duas estatuetas em Hollywood (Melhor Filme Estrangeiro e Melhor Actor) e outras três em Cannes (aqui Bardem levou o galardão de melhor actor). Esta é a primeira longa-metragem de Iñarritu com a sua assinatura no argumento. A segunda chega agora com a história da estrela de cinema em declínio que faz a narrativa de Birdman.
Cineasta da decadência, o mexicano opta por ter na tela a miséria humana, a depressão urbana, o declínio dos grandes. Iñarritu é no entanto a antítese destes cenários. O seu caminho até ao reconhecimento mundial foi rápido, consistente e sem sobressaltos. Da sua vida em jovem a trabalhar num navio cargueiro – experiência que diz influenciar bastante o seu trabalho – passou pela rádio, onde entrevistou inúmeras estrelas da música e do cinema, foi compositor de várias bandas sonoras de filmes mexicanos. Daí lançou-se para a criação de uma produtora, estudou realização, realizou curtas-metragens e alguns anúncios publicitários. A produção da primeira série televisiva trouxe-lhe a experiência e o embalo para a primeira obra no grande ecrã.
O mexicano consegue desde o início da sua carreira a proeza de encher os seus elencos de nomes sonantes, dos que agradam a Cannes e Hollywood. São exemplos Gabriel Garcia Bernal, Javier Bardem, Sean Penn, Naomi Watts, Benicio Del Toro, Brad Pitt, Cate Blanchett e agora Michael Keaton (este mais mal amado pela crítica, o que faz com que a personagem lhe assente na perfeição).
Alejandro Gonzalo Iñarritu está já a filmar a sua próxima película e prevê-se que seja mais um passo para que Hollywood o acolha como um dos seus. 'The Revenant' terá Leonardo Di Caprio como protagonista e será um filme de aventura. Causa estranheza pensar numa fita de aventura assinada pelo homem que filma de forma exímia a realidade. Mas a estética de Birdman já revela um pouco desse desejo do mexicano. Aguardemos o resultado.
andreia.coelho@sol.pt