O plano de acção dos clientes lesados ganha relevância numa altura em que está instalada uma guerra entre supervisores financeiros e os protestos dos lesados sobem de tom.
A associação dos Lesados e Indignados do Papel Comercial (AILPC) convidou o mediático advogado dos clientes BPP para representar os seus associados. O SOL sabe que Luís Miguel Henrique aceitou e iniciará a defesa de cerca de 200 clientes na próxima semana, após o cumprimento de questões formais.
Alberto Neves, vice-presidente da AILPC, confirma a escolha do antigo advogado dos clientes do BPP, deliberada em assembleia-geral no dia 22. O dirigente revela que “os órgãos sociais e os associados estão muito confiantes na experiência e no poder de negociação do jurista”.
Luís Miguel Henrique assumiu, em Dezembro de 2008, a estratégia jurídica da Associação de Defesa dos Clientes do Banco Privado Português. A solução passou pela criação de um mega-fundo especial de investimento para recuperar o dinheiro investido pelos clientes em produtos de retorno absoluto.
Banco de Portugal sob pressão
O plano jurídico no caso BES prevê, numa fase inicial, reuniões com os responsáveis do Banco de Portugal, Comissão de Mercado de Valores Mobiliários, Novo Banco e BES.
Os clientes lesados defendem que, numa primeira instância, deve ser o Novo Banco a restituir as verbas bloqueadas, mesmo sem juros. Este é, aliás, o entendimento de Carlos Tavares, presidente da CMVM. “Foram criadas expectativas jurídicas aos subscritores destes produtos, quanto à restituição do capital investido, susceptíveis de determinar ou de interferir com decisões quanto à manutenção ou não dos investimentos”, insiste o regulador do mercado de capitais.
Por sua vez, o Banco de Portugal não obriga o Novo Banco a qualquer restituição, mesmo abrindo a porta a excepções. Ou seja, Eduardo Stock da Cunha poderá compensar os clientes que possam vir a apresentar vantagens comerciais – leia-se lucro – para o banco no futuro.
Na quinta-feira, os clientes manifestaram-se em Braga e está já a ser preparado um protesto em Lisboa, à porta do Ministério das Finanças. É precisamente de Maria Luís Albuquerque que a AILPC tentará, numa segunda fase das negociações, obter um aval estatal. No caso do BPP foi concedida uma garantia estatal de até 250 mil euros por cliente, sujeita à valorização do mega-fundo de investimento.
À medida que o tempo passa, maior é a probabilidade de a solução encontrada colidir com o fim do mandato do governador Carlos Costa no Banco de Portugal (em Maio), a venda do Novo Banco (até ao final do primeiro semestre) e as eleições legislativas (em Outubro).
O governador está sob fogo cerrado de várias frentes, devido aos lesados do BES. Escolhido para suceder a Vítor Constâncio em Abril de 2010, Carlos Costa termina o mandato em Maio. A recomendação para cumprir o segundo mandato ou ser substituído é um pelouro da ministra das Finanças, mas a última palavra será de Passos Coelho.
Ricardo Salgado subscreveu papel comercial
A quantidade de lesados do BES mostra que os produtos eram de ampla comercialização. O SOL confrontou Ricardo Salgado com a subscrição de dívida de muito curto prazo da Espírito Santo International e Rioforte e fonte oficial garantiu que o antigo banqueiro é um dos subscritores do papel comercial. “É mentira que Ricardo Salgado não tenha investido em papel comercial”. A mesma fonte não esclareceu quando e quanto aplicou o banqueiro neste produto. Os ex-quadros do BES, incluindo a família Espírito Santo, têm os movimentos congelados ou muito condicionados.
Possíveis cenários para o reembolso dos clientes do papel comercial
Novo Banco
O Novo Banco insiste que «não tem nenhuma obrigação legal» para com os clientes do papel comercial. A medida de resolução prevê excepções, sujeitas a uma série de condições. A decisão de compensar os clientes tem de ser neutral do ponto de vista de liquidez, rentabilidade e solidez. Um dos cenários possíveis é a revisão destas condições para facilitar o pagamento a parte dos clientes.
Banco mau
A provisão de 668 milhões de euros para reembolsar os clientes lesados não passou para o Novo Banco, como garantiu inicialmente o próprio Banco de Portugal. Está no BES, mas só existe no papel. O antigo banco está em insolvência e não há dinheiro para pagar. Será necessário um elevado sucesso na recuperação de activos para haver recursos para reembolsar os clientes.
Governo-BdP
O plano de acção da associação dos Lesados e Indignados do Papel Comercial do BES prevê uma negociação com todas as entidades envolvidas. Todos os cenários estão em aberto, incluindo o pedido à ministra das Finanças de uma garantia estatal para uma estratégia de reembolso de médio-longo prazo. Esta foi a solução encontrada entre o Governo e o Banco de Portugal, no caso BPP.
Acções judiciais
Há múltiplas acções judiciais, individuais ou colectivas, a entrar todos os dias nos tribunais relacionadas com a queda do BES. Vários especialistas acreditam que a partir do momento em que exista uma decisão favorável à restituição do papel comercial haverá uma espécie de jurisprudência. Bastará aos clientes seguirem a primeira fórmula usada com sucesso. Seria um processo moroso.