É esta importância da mulher, enquanto alma mater de um lar, habitual responsável pela boa e sábia utilização dos recursos, cuidadora presente da família e fazedora de uma cozinha de sentimentos, onde em cada prato, receita ou produto esconde um mimo de carinho, que as confrades das Sainhas querem também enaltecer. Por isso, esta confraria é constituída apenas por elementos do sexo feminino e muitas das suas actividades são centradas na valorização do papel da mulher na sociedade presente e passada. Dotadas de uma grande capacidade de trabalho e de uma espantosa organização, estas Sainhas mostram serem capazes de levar mais longe o nome de Vagos e a fama do produto que defendem. Criado o vínculo entre estas mulheres de Vagos, a Confraria serve para expandir um associativismo que assume a sua feminilidade e o enaltece. Mostram, assim, que a confraria é um espaço onde cabem vários sentimentos, de amizade, de fraternidade, de expressão, de trabalho, de coesão e de partilha de tudo o que exprime a gastronomia de Vagos.
Por isso, além das saborosas e loiras sainhas, são outros os produtos resultantes das mãos vaguenses que preenchem os sabores que esta Confraria divulga. O pão da Celeste, feito com farinha de trigo, é, ainda hoje, amassado à mão e cozido em forno de lenha. Por isso, diz quem o prova, é saboroso e cala a vontade de regressar aos sabores de outrora presentes nas padas. A broa mimosa surpreende: ao milho e trigo são adicionados ovos, açúcar e canela, dando-lhe um toque que, embora adocicado, é um bom acompanhamento do carneiro assado no forno, prato habitualmente confeccionado em dia da festa em honra do padroeiro local, Santo Inácio do Boco. O pão de Cornos, de origem centenária, era uma dádiva das famílias abastadas às crianças, em dia de casamento, que iam atirar flores aos noivos à porta da igreja. É importante realçar que muitas destas tradições caíram no esquecimento e que só o trabalho das confrades da Confraria Gastronómica As Sainhas de Vagos tem permitido recuperar. É, por isso, de notar a relevância deste trabalho de recuperação e de contextualização das tradições gastronómicas que, necessariamente, envolvem outras vertentes da vida social da região, já que através da alimentação conhece-se um povo e os seus hábitos culturais, religiosos e sociais do passado. Esta tem sido uma tarefa muito bem desempenhada pelas Sainhas que sabem o quão importante é recuperar a memória de outros tempos como forma de dar identidade a um povo.
Mas impõe-se falar mais um pouco das sainhas e da forma como o porco era devidamente festejado e partilhado. Logo após a 'matadela do porco' era tempo de comer o sarrabulho. No segundo dia, o porco era desmanchado e comia-se o arroz de lebes (as fressuras) e as febras. Ao terceiro dia, a cozinha cheirava a sopa enriquecida com os ossos da cabeça e os fartos rojões. Em tempos idos era hábito, após a 'matadela', e a fartura que a mesma implicava, partilhar com os vizinhos, com os amigos e, sobretudo, com quem representava algum poder na terra (o médico, o pároco), os 'presentes do sarrabulho'. Com estes iam também as sainhas, tal a importância que se lhes dava.
De um abraço entre a ria e o mar, em plena Beira Litoral, temos Vagos, um concelho onde os sabores da ria, do mar e da terra se misturam e dão origem a uma gastronomia genuína que as confrades da Confraria Gastronómica As Sainhas lutam por valorizar, divulgar e dignificar. No entanto, há que não esquecer que não são apenas as sainhas o foco desta confraria, mas também a mulher enquanto elo e vínculo familiar, enquanto género por vezes mais esquecido, pelas suas mãos que dão sabor, cheiro e textura aos sentimentos, enquanto força da natureza sempre presente na vida de todos nós. É a mulher que procuram distinguir e dar visibilidade. Na verdade, As Sainhas são tudo isto e muito mais. São um pouco da mulher que há em todas as mulheres portuguesas!