Qual é a marca que fica do jardinismo na Madeira?
Fica a marca de uma revolução social tranquila. A sociedade madeirense era muito estratificada, com uma classe média alta muito distante da classe mais baixa, cuja única saída era a emigração. Não havia classe média.
Fica uma Madeira mais igual?
Há uma impressão muito comum relativamente a estes 40 anos, que é a ideia das infra-estruturas, dos viadutos, das estradas. É evidente que isso foi marcante. Mas para mim é no plano social e humano que se dá a grande mudança. Praticamente estancou-se a emigração, tirando agora por razões da crise geral, nacional e internacional. Hoje, temos uma escola secundária em cada conselho, quando há 40 anos tínhamos apenas no Funchal uma escola técnica e um liceu. Hoje não há uma diferença entre os jovens dos concelhos rurais e do Funchal.
A dívida é face negra?
Não nos podemos esquecer de que, aquando da primeira intervenção do FMI em Portugal, tinham passado dois ou três anos sobre a revolução. E a Madeira era a região mais carenciada de todo o país. Carecia de todas as infra-estruturas. Todas: as viárias, os saneamentos, as escolas, havia o Hospital do Funchal e havia dois concelhos com centro de saúde. Hoje, todas as freguesias têm um centro de saúde. Tudo isto teve custos. Ora, quando estas verbas deviam vir para a Madeira e para os Açores a fundo perdido, vieram como empréstimos. Esses empréstimos, com o aval do Estado, foram a alternativa que o Estado pôs. Deu-se uma bola de neve com os juros. Depois veio Sócrates que fez uma alteração profunda à alteração da lei das Finanças das Regiões Autónomas e retirou centenas de milhões à Madeira. E fez isso a meio de uma legislatura, com um programa de governo aprovado. Ora, isso obrigou ao recurso à banca. Aliás, a dívida só não é maior porque houve um recurso a empréstimos. Se não, a região tinha sido condenada a pagar indemnizações brutais aos empreiteiros das obras que estavam em curso.
Sócrates tem uma parte de culpa da dívida da Madeira?
Tem, porque cortou verbas da Lei das Finanças das Regiões Autónomas.
Uma maioria absoluta do PSD será uma validação do jardinismo?
Penso que sim. A forma como se fez a escolha do novo líder do PSD Madeira, com um debate muito aberto durante um ano em que se discutiu tudo, quando toda a gente dizia que o partido era monolítico e que ninguém discutia nada, revelou uma maturidade democrática que toda a gente dizia que estava ausente. Foi desmentido o défice democrático. E a eleição fez-se com toda a normalidade, sem nenhum incidente. Isso significa que Alberto João Jardim preparou o partido para o futuro e que há uma continuidade.
O que se pode esperar do novo ciclo?
Alberto João Jardim teve o seu estilo de governação. Os estilos são próprios, não se imitam. Mas foi o estilo adequado a uma época. Essa mudança é assegurada pela nova liderança do PSD. Hoje, não é compreensível que se ande em campanhas dispendiosas. Há um tipo de campanha diferente. Por outro lado, há a realidade nova das redes sociais e do peso que tem essa forma de comunicação política. Parece até que as campanhas são mais mornas, mas essa é uma falsa percepção por ignorância do peso que tem essa intervenção partidária nas redes sociais.
E na governação?
Obviamente que tem de haver mudanças. O ciclo que fechámos foi o de apetrechar a região com os meios e as estruturas que a aproximam do nível nacional e do nível europeu, na Saúde, na Educação, nas infra-estruturas viárias, na Cultura. Agora, é preciso ter uma política de manutenção de tudo isso e puxar cada vez mais pela Cultura, pela Saúde e pela Segurança Social, que são áreas que têm de ser mantidas com uma sensibilidade social que Jardim cultivou sempre muito e que o partido mantém.
Miguel Albuquerque pode trazer uma nova relação com o Governo do continente?
O novo presidente do PSD Madeira já definiu a sua postura na sua relação com o Estado. É uma relação de cooperação, mas não de submissão. Cada época exige respostas diferentes. A resposta dada no período de Jardim foi a certa e sem ela não tínhamos conseguido o que conseguimos. Neste momento, é preciso ter outra forma de estar e de negociar. Mas há aqui um ponto fundamental: a autonomia regional. É preciso não abdicar de aprofundar e aperfeiçoar a autonomia em sede de revisão constitucional. É importantíssimo que isso aconteça.
Vão voltar a pegar nessa bandeira?
Essa bandeira deve ser retomada. Deve ser negociada e alargada a outros partidos, mas nunca em circunstância alguma abandonada. E digo isto não numa ideia apenas de criar mais poderes para a região, mas porque ela é indispensável a um relacionamento mais correcto entre o Estado e a região. As dúvidas e situações nebulosas que subsistem só perturbam a relação e isso não é bom para a unidade nacional.
O Governo de Lisboa devia renegociar a dívida da Madeira?
Isso é um imperativo. O Governo defendeu as condições que estabelecia no empréstimo à Madeira com base na circunstância de não poder dar outras mais favoráveis porque o próprio Estado estava submetido a condições idênticas na sua relação de financiamento externo. Mas o Estado tem hoje condições de financiamento externo muitíssimo mais favoráveis. Ora, se o argumento foi válido para condições mais onerosas, tem de ser válido para ser ajustado a essa melhoria. Aliás, o Governo português não tem ética para junto da União Europeia reivindicar fundos do Plano Juncker, do QREN, e linhas especiais para as regiões autónomas, se internamente der o mau exemplo de estar a exigir condições superiores às que suporta na vertente externa. Isto lá fora é mortal.
Passos não veio à campanha…
Não é novidade. Nunca houve presença ao longo destes 40 anos nas campanhas das eleições regionais de nenhum dirigente nacional do partido, estivéssemos no governo ou na oposição. Sempre fizemos campanha com a prata da casa.
Acredita na maioria absoluta?
A população da Madeira percebe que o nosso contexto específico exige governos estáveis e fortes. E isso só se consegue com a maioria absoluta. Por outro lado, há uma radicalização partidária na Madeira. E essa radicalização não é propícia a coligações ou pelo menos ao seu sucesso.
É preferível uma coligação ou governar com acordos de incidência parlamentar?
Preferia um governo com acordos de incidência parlamentar. Acho que será o mais viável.
Qual seria o parceiro mais natural para o PSD na Madeira?
À primeira vista, pareceria que seria o CDS em função da coligação nacional. Não tenho como líquido que isso seja assim tão evidente porque o CDS esteve sempre muito associado às antigas classes dominantes do antes do 25 de Abril e isso gera clivagens muito fortes. O CDS foi o maior partido da oposição nos últimos quatro anos e tem sido bastas vezes muito hostil, muito radical em relação ao PSD. Essa prática não facilita uma solução com o CDS.
O resultado na Madeira terá algum impacto nacional?
Se o PSD tiver uma vitória folgada, isso será um catalisador de uma dinâmica que pode ter repercussão positiva nacional. O ciclo de vitórias pode iniciar-se aqui. De resto, não vejo que se possa tirar outro tipo de leitura pelas especificidades da Madeira. Há uma situação particular na nossa posição de deputados do PSD Madeira na Assembleia da República e eu tenho chamado a atenção da direcção nacional, mas nem sempre tenho tido a compreensão para isto. Não há outros deputados na bancada do PSD que tenham de fazer o exercício diário apoiar um governo de coligação PSD/CDS na República e de fazer oposição na Madeira ao CDS. Não é fácil e explica o voto contra o Orçamento do Estado. Fui incompreendido. Mas desafio os meus companheiros de partido a passarem por este exercício para perceberem as dificuldades.
Como deputado da Madeira, o mais importante é defender a região?
Além disso, sempre o fiz sem sentir em ocasião nenhuma que estava a colidir com o interesse nacional. Pelo contrário. Estava através da região e da sua defesa a realizar o mais importante, que é garantir a unidade nacional que a Constituição consagra.
Estão sanadas as feridas abertas pela luta no poder no PSD Madeira?
Não há uma regra geral nessas matérias. Cada pessoa é uma pessoa. O que posso dizer é que do Congresso resultou uma unidade à volta do novo líder e da nova Comissão Política Regional. E não sinto que haja marcas da pugna interna que possam prejudicar estas eleições ou gerar facções que perturbem o funcionamento do partido e da sua acção governativa, independentemente de haver divergências.