Dias Loureiro: a ironia fina de Passos Coelho!

1.    Passos Coelho tem muitas facetas desconhecidas ainda do povo português. Passos é muito inteligente a pensar política, é persistente, trabalhador, e sem ser brilhante ou muito carismático, tem uma imagem de serenidade e confiabilidade. As minhas críticas à primeira metade da governação de Passos Coelho são conhecidas – mas a verdade é que, com…

2.    Ora, quando as circunstâncias da política nacional começam a ser cada vez mais favoráveis a Passos Coelho, eis que o nosso Primeiro-Ministro lá resolveu a agitar as águas, criando uma polemicazinha. Desta vez, Passos Coelho elogiou Dias Loureiro, como um empresário português de sucesso, responsável e “com mundo”. Um amigo pessoal que Passos Coelho fez questão de reabilitar – afirmou Passos Coelho. 

3.    Pois bem, nós próprios quando ouvimos tais declarações ficámos perplexos. Então, o Primeiro-Ministro que apregoa a responsabilidade, a exigência e a mudança de paradigma da economia portuguesa – dá como exemplo de futuro, de um visionário que deve ser levado a sério, o caso de Manuel Dias Loureiro? Será mesmo o Dias Loureiro, braço-direito de Cavaco Silva durante anos, administrador do BPN, forçado a sair do Conselho de Estado pela pressão da opinião pública que venceu a resistência e a teimosia do Presidente Cavaco Silva em o manter no órgão consultivo que o coadjuva? Será mesmo o Dias Loureiro?- interrogámos introspectivamente. Não pode ser! Não pode ser: o Passos Coelho seria incapaz de elogiar, pelo menos nesta fase, esse Dias Loureiro em público! Mas foi. Passos Coelho elogiou mesmo Dias Loureiro como o exemplo… de empresário de sucesso, visionário, conhecedor do mundo. De facto, Dias Loureiro conhece mundos extraordinários: o mundo das negociatas, de utilizar a Política para ganhar dinheiro (não é um juízo subjectivo: é um facto) e o mundo de um modelo de desenvolvimento para Portugal assente no betão e na construção civil. Como temos a certeza de que Passos Coelho, com todos os seus defeitos que já assinalámos, é um homem sério, competente, impoluto, que está na Política por convicção e não por interesses ou negociatas e que apresenta aos portugueses um modelo de rigor económico e financeiro, alicerçado numa nova estratégia para incrementar a competitividade da economia (dando primazia aos bens transaccionáveis) – então temos de encontrar uma explicação racional para as declarações abonatórias de Passos Coelho sobre Dias Loureiro. 

4.    Ora, só há uma explicação possível: a maioria dos jornalistas e comentadores não o perceberam, mas Passos Coelho só podia estar a ser irónico. Foi um sarcasmo muito inteligente e bem pensado de Passos Coelho: quando o Primeiro-Ministro dá uma palavra amiga a Dias Loureiro e depois aponta o seu exemplo como homem de rigor – na verdade, Passos Coelho está a dizer que “portugueses, não façam como o Manel Dias Loureiro: paguem as vossas contas, sejam rigorosos, ensinem aos vossos filhos os valores fundamentais da honra e de que os fins não justificam todos os meios, que, na política, deve reinar as convicções – e não as conveniências”. 

5.    A prova de que Passos Coelho estava a ser irónico é o elogio final:  os investimentos servem para gerar lucro, devolvendo e retribuindo todos os euros investidos pelos investidores. Ora, isto só se pode dizer por ironia em relação a Manel Dias Loureiro: este deixou um buraco colossal no BPN, que está a ser pago pelos contribuintes, lesando o Estado em largos milhões de euros e desconhecemos que Dias Loureiro seja muito pontual no cumprimento das suas obrigações para com os accionistas das suas sociedades comerciais. Pode ser que sim…

6.    Por último, Passos Coelho só mesmo por ironia ou sarcasmo poderia elogiar o apresentador da biografia de José Sócrates, que qualificava o ex-Primeiro-Ministro como “o menino de ouro do PS”, e grande defensor da governação de José Sócrates durante muitos anos. Poderia racionalmente agora Passos Coelho elogiar Dias Loureiro, o homem que achava que Sócrates era o menino de ouro do PS? Meu caro leitor, só mesmo por sarcasmo. Passos Coelho, como pode constatar, também tem um lado mais estilístico ou, se quiser, brincalhão. Também sabe brincar, este nosso Primeiro-ministro! 

7.    Uma última nota em jeito de aviso: meu caro Pedro Passos Coelho, tenha mais cuidado com as suas ironias em plena pré-campanha eleitoral. Para a próxima, podemos não perceber o sentido crítico da pessoa de Manuel Dias Loureiro subjacente às suas declarações – e os portugueses legitimamente podem pensar que ainda (veja só o ridículo!) está mesmo a elogiar Manel Dias Loureiro. Cuidado, muito cuidado, Pedro! Os portugueses confiam em ti – não os desiludas com ironias tão finas!

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