2. Devemos dizer que a entrevista de Rui Gomes da Silva deve ser lida com atenção: nela, o ex-Ministro dos Assuntos Parlamentares traça com exactidão e mestria analítica o percurso do PSD, desde a sua fundação até à ascensão de Pedro Passos Coelho; perspectiva o que pode vir a suceder nas eleições legislativas; faz uma auto-análise do seu desempenho como político com muita lucidez – e, ponto mais importante, destacado devidamente na capa daquele jornal económico, traça cenários possíveis quanto às presidenciais de 2016. Em jeito de balanço, podemos dizer que Rui Gomes da Silva confirma o que já suspeitávamos: uma das figuras políticas que melhor e mas profundamente pensa política em Portugal. Os portugueses ainda não têm essa ideia (ficaram com a imagem do erro cometido pelo então Ministro dos Assuntos Parlamentares quando criticou o formato de um programa televisivo) – mas perceberão a seu tempo (começando já por esta entrevista) que Gomes da Silva é alguém que domina os assuntos da política, na teoria e na prática, como muito poucos em Portugal.
3. No ponto das presidenciais, em particular, Rui Gomes da Silva veio agitar as águas trazendo para a discussão alguém que já estava esquecido nos cálculos dos analistas políticos. Na mesma semana em que a revista “Nova Gente” avança que a esposa de José Manuel Durão Barroso (Margarida Sousa Uva) sofre de uma terrível doença (cancro do útero), estando em fase de tratamento. E naturalmente Durão Barroso está a apoiar a sua esposa, como marido zeloso e ser humano generoso que é, a vencer esta luta. Luta que estamos certos (e confiantes) que, com a ajuda de Deus, vencerão. E todos nós somos solidários com o casal nesta luta. Uma coisa é a Política; outra – muitíssimo mais importante – é a Família e a Vida.
4. Ora, face a esta infeliz e temporária contingência, a revista “Nova Gente” avança, contextualizando com declarações da própria Margarida Sousa Uva, que Durão Barroso sacrificará a sua carreira em prol da ajuda a prestar à sua esposa. Tal declaração é passível de ser lida como uma desistência em absoluto de uma possível candidatura a Belém. Isso a somar às conferências bem pagas, às aulas em Princeton e na Católica, e a recente substituição de Balsemão como representante de Portugal no Clube de Bildeberg. Tudo isto ponderado, seria mais do que óbvio concluirmos pela impossibilidade total de uma candidatura de Durão Barroso a Belém em 2016.
5. Porém, temos de mais cautelosos: José Durão Barroso é um muito experiente politicamente. E sabe que as grandes decisões políticas se tomam em silêncio, afastado do palco mediático e trabalhando, bem e eficazmente, nos bastidores.
6. Na verdade, Barroso gostaria muito de ser candidato à Presidência da República, replicando o que fez Cavaco Silva. Ou seja: candidatar-se a Belém em 2016, opondo-se a um candidato de esquerda (nem sequer se pode dizer de centro-esquerda) que é Sampaio da Nóvoa, podendo ganhar ou perder. Durão Barroso, no seu íntimo, está convencido que, em campanha eleitoral, poderá destronar o candidato presidencial do Partido Comunista apoiado pelo PS. Mas, mesmo perdendo, Durão Barroso marca o seu espaço para daí a cinco ou dez anos. E avançar agora permitir-lhe-ia começar a mudar a percepção que os portugueses têm da sua ida para Bruxelas: daqui a dez anos, a imagem que os portugueses teriam já não seria tanto a do “fugitivo político” – mas sim a do candidato que se posicionou em 2016 e que preparou o seu terreno na última década. Seria, pois, uma jogada expedita de Durão Barroso avançar já em 2016.
7. Pense-se, ainda, para compor o ramalhete de ambições políticas de Barroso, que Passos Coelho e Cavaco Silva seriam entusiastas apoiantes da sua candidatura. Segundo o que apurámos, o Presidente Cavaco Silva terá tentado convencer Passos Coelho da bondade da candidatura presidencial do seu discípulo ex-Presidente da Comissão Europeia: Passos Coelho não se terá oposto, chegando mesmo a falar com Paulo Portas sobre este nome.
8. Em conclusão, em teoria, José Manuel Durão Barroso ainda poderá tentar um golpe de asa, impondo-se a Passos Coelho e Paulo Portas, com a conivência simpática e feliz de Cavaco Silva. Mas apenas em teoria: este cenário é completamente inviável na prática.
9. Desde logo, porque as bases do PSD ainda não perdoaram a Durão Barroso, pelo que uma candidatura destas poderia lançar o caos no partido; segundo, Passos Coelho que quer representar o futuro de Portugal, não pode apresentar como candidato alguém que foi o rosto da austeridade – o homologador para os portugueses das políticas de Merkel; terceiro, José Manuel Durão Barroso geraria a dispersão completa no espaço do centro-direita, com a multiplicação de candidaturas (de personalidades do PSD e do CDS, que não se conformariam com a sua candidatura).
10. Logo, o avanço de José Manuel Barroso em 2016, na prática, poderia ser o epitáfio triste e desastroso da sua carreira: Barroso, com muita probabilidade, teria um resultado eleitoral humilhante que comprometeria qualquer estratégia política plurianual.
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