Todos querem o Oceanário

Credibilidade e prestígio internacionais explicam interesse de privados nacionais e estrangeiros pela empresa do Oceanário de Lisboa. Já há três candidatos, mas o número deve aumentar.

Acerca de uma semana do fim do prazo dado pelo Governo para a apresentação de candidaturas à compra da concessão do Oceanário de Lisboa – a 12 de Junho –, o interesse dos investidores no equipamento público, considerado o melhor da Europa e o segundo melhor do mundo, é cada vez maior. Mas o que torna este aquário público tão apetecível para privados? A resposta vai muito além do lucro.

É, sobretudo, o prestígio e a credibilidade conquistados desde a sua inauguração, em 1998, e consolidados internacionalmente ao longo dos anos a atrair a atenção de vários grupos portugueses, espanhóis, ingleses e italianos. «O Oceanário é um óptimo activo, de primeiro nível na Europa. E é um produto de ócio de alta qualidade», explicou ao SOL Javier Carbajo, director-geral da Aspro Parks, o primeiro concorrente estrangeiro a assumir, nesta semana, a entrada na ‘corrida’ às acções da Sociedade Oceanário de Lisboa, S.A., à qual o Governo adjudicou por 30 anos o serviço público de exploração e gestão deste equipamento que agora pertence à Parque Expo.

Também «a sua equipa de gestão bastante qualificada» contribui para esta atracção pelo Oceanário português, explica o director do grupo espanhol, presente em 12 países.

José Soares dos Santos, da Sociedade Francisco Manuel dos Santos – a primeira a divulgar o seu interesse na concessão –, corrobora: «A qualidade e a credibilidade do Oceanário» tornam-no interessante para o seu grupo, que pretende criar uma Fundação para o Oceano e através dela investirá no mar enquanto centro de sustentabilidade e desenvolvimento da economia portuguesa.

«Essa fundação terá quatro pilares essenciais», explica José Soares dos Santos: «A literacia do mar (temos uma biodiversidade fantástica e ainda pouco conhecida),  a conservação dos oceanos, a gestão correcta dos recursos (pretendemos ser uma plataforma de encontro de organizações não governamentais) e, finalmente, a ‘economia azul’». Neste âmbito, a exploração do Oceanário «faz todo o sentido», explica o responsável.

Entre os interessados nas actividades do aquário que já assumiram oficialmente que vão candidatar-se está ainda a Mundo Aquático, que explora o Zoomarine, no Algarve (Guia), há 25 anos – o primeiro criado em Portugal.

O facto de «ser considerado o segundo melhor aquário do mundo e o melhor da Europa», segundo a apreciação dos turistas no Tripadviser, também é motivo para a Mundo Aquático pretender «criar sinergias» com o Oceanário, explicou ao SOL o presidente da empresa, Pedro Lavia.

Por outro lado, acrescenta, o Oceanário faz parte do «património de Portugal» e está na «linha de trabalho e de interesse» da Mundo Aquático, que tem um centro de recuperação de animais marinhos em protocolo com o Instituto da Conservação da Natureza e das Florestas.

Equipamento rentável

Em Julho, deverá ser conhecida a proposta vencedora, segundo anunciou o Ministério do Ambiente. Com a venda das acções da Sociedade Oceanário de Lisboa, S.A. – à qual o Governo concessionou, no dia 15 de Maio, as «actividades de serviço público de exploração e administração deste equipamento» e determinou a «adjudicação do respectivo contrato» –, conclui-se um processo iniciado há um ano.

O objectivo, garantiu então ao SOL o ministro do Ambiente, Moreira da Silva, é liquidar a dívida da Parque Expo à banca, que ascende a 167 milhões de euros. E o Oceanário sempre foi um dos activos mais rentáveis da Parque Expo para o Estado. No ano passado, aliás, o aquário obteve o maior lucro de sempre, atingindo quase 1,5 milhões de euros (em 2013 tinha já chegado a 1,17 milhões). O equipamento constava da lista de estruturas a abrir aos privados até 2015, no âmbito do relatório da 11.ª avaliação da troika.

O Governo espera encaixar pelo menos 40 milhões de euros com a concessão – mas o elevado interesse que este activo está a gerar deverá elevar o montante em causa.

Além das propostas assumidas oficialmente, já vieram a público nomes de outros grupos interessados . No total, o Oceanário contará já com pelo menos oito interessados. Quando anunciou a medida no ano passado, Moreira da Silva asseverou que não seria uma alienação ou concessão a «qualquer preço» ou «com qualquer resultado».

E, antes de abrir a exploração do Oceanário a privados, por um período de 30 anos, o Governo assegurou que a natureza da actividade de exploração e administração do Oceanário iria ficar estabelecida como «serviço público» (o que aconteceu através de um decreto-lei aprovado em Março), «atendendo aos fins pedagógicos, científicos e culturais que lhe estão subjacentes e que integram o elenco das necessidades colectivas de interesse geral».

Com a legislação mais recente o Governo adjudicou o Oceanário por 30 anos à sociedade homónima na prossecução do «interesse público». E, caso a concessionária não cumpra o estipulado no contrato, o Estado pode reaver o Oceanário ao fim de 10 anos.

Entretanto, tanto a Câmara Municipal de Lisboa como a Junta de Freguesia do Parque das Nações já fizeram saber que estão contra esta concessão. A mesma posição assumiu o PCP.

Os outros oceanários: públicos, privados e até PPP

A venda da concessão do aquário público é, portanto, uma decisão política. Mas não é excepção nem na Europa nem no mundo.

Os poucos aquários que se mantêm completamente na esfera do Estado são os dos Estados Unidos e do Japão. O Georgia Aquarium e o Monterey Bay Aquarium (inaugurado em 1984, na Califórnia, e considerado o melhor do mundo),  ambos nos EUA, são públicos. Também o Okinawa Churami Aquarium, no Japão, é público, sendo gerido pela fundação governamental Ocean Expo Park.

Quanto a experiências privadas, há-as por todo o mundo, da China à Turquia, passando pelos Emirados Árabes Unidos e por Espanha.

No caso do país vizinho, a privatização da gestão e exploração do Oceanogràfic – em Valência e até agora mantido pelo município – entrou, aliás, na sua recta final, com a oferta apresentada pelo consócio Águas de Valencia, Aquário de Vancouver e Ket Gestão, num valor que ascende a 67,6 milhões de euros para explorar o aquário durante os próximos 15 anos.

Com uma aposta claramente mais comercial, no Dubai, o aquário The Mall’s Dubai Aquarium and Discovery Centre, gerido pela Oceanis Australia Group e que detém um dos maiores painéis acrílicos do mundo, ficando dentro de um centro comercial, é detido pela Emaar Properties, dona do megacomplexo que inclui o centro comercial.

Outro aquário instalado num centro comercial é o aquário oceânico de Xangai, do Orient Shopping Cente, que se gaba de ter tido desde a sua abertura, em 2002, mais de 1,5 milhões de visitantes.

Quanto à Turquia, o Turkuazoo é detido pela britânica Merlin Entertainments, o segundo maior grupo de parques temáticos do mundo, a seguir à Disney, e que detém dezenas de aquários na Europa (como o Sea Life, no Porto).

Um exemplo de parcerias público-privadas é o Aquário de Génova, em Itália, detido pela Costa Edutainment S.A (também interessada no Oceanário de Lisboa), pela Fondazione Acquario di Genova Onlus (onde o Estado assegura uma presença na gestão) e pelo operador turístico Incoming Liguria, que opera em Génova. Outra parceria público-privada é o exótico uShaka Marine World:  inaugurado em 2004, num restaurante de Durban (África do Sul), é  detido pelo eThekwini Metropolitan Municipality (que inclui Durban e cidades dos arredores) e por vários parceiros privados.

 

As condições

40 milhões

é o encaixe mínimo definido pelo Governo para a concessão e previsto no Orçamento do Estado de 2015. Mas o Estado poderá arrecadar mais de 50 milhões de euros com a operação.

1, 49 milhões de euros

de lucro em 2014: foi o maior de sempre, em termos de receita líquida.

30 anos

é o prazo máximo da concessão da exploração do equipamento. Mas, caso o vencedor não cumpra o contrato, o Estado poderá reaver o Oceanário após dez anos.

Distinções

Logo em 1998, o Oceanário foi distinguido com vários prémios, como o Valmor de Arquitectura e o Prémio Chiaja Per Le Scienze. Foi também considerado um dos 10 Melhores Eventos Científicos de 1998 pela revista Time. Em 2006, ganhou a medalha de prata de mérito turístico.

 

Os candidatos

SOCIEDADE FRANCISCO MANUEL DOS SANTOS

Investir em investigação e na conservação dos oceanos, através de protocolos com universidades portuguesas – é esta a principal aposta da Sociedade Francisco Manuel dos Santos, a primeira entidade a assumir publicamente o seu interesse no Oceanário. A família detentora da cadeia de supermercados Jerónimo Martins e da Fundação Francisco Manuel dos Santos pretende criar uma Fundação para o Oceano, com «uma componente científica independente e forte», com  sinergias com outros aquários –  como, por exemplo, o Monterey Bay Aquarium (Califórnia, EUA), considerado o melhor do mundo – e investir na vertente do entretenimento e da educação dos mais jovens, segundo explicou ao SOL José Soares dos Santos. Para o desenvolvimento deste projecto conta com especialistas que fundaram o Oceanário, em 1998, como Tiago Pitta e Cunha. Caso vença o concurso, todo o lucro obtido será reinvestido no Oceanário.

MUNDO AQUÁTICO

Presente em Portugal há 25 anos, no Algarve, onde explora o Zoomarine, a Mundo Aquático está a preparar a sua proposta desde que surgiu a primeira notícia sobre a venda. «Tivemos logo uma primeira reunião com a Parque Expo», conta o presidente da empresa, Pedro Lavia. Para explorar o Oceanário, a Mundo Aquático, que trabalha com a Universidade do Algarve em programas de conservação do oceano, além de outras universidades pelo mundo, e que tem o primeiro centro de recuperação de animais marinhos em Portugal, propõe «somar, não dividir» – garante Pedro Lavia, referindo-se à equipa do Oceanário e à criação de sinergias em termos turísticos. «O turismo é um pilar fundamental para a economia do país e temos trabalho desenvolvido nessa área internacionalmente», refere.

GRUPO ASPRO PARKS

O grupo espanhol, há 15 anos em Portugal a explorar o Aqualand, um parque aquático também no Algarve, pretende «promover o crescimento da empresa, em estreita colaboração com a equipa de gestão do Oceanário», explica Javier Carbajo, director-geral do Aspro Parks. Na exploração do aquário, o grupo, que concorre sozinho e com meios próprios à concessão, contará com a assessoria da Fundação Aspro Natura, que desenvolve programas de conservação da fauna autóctone selvagem e participa nos programas desenvolvidos a nível europeu de criação em cativeiro de espécies em perigo (European Endangered Species Program), actividades de educação e de investigação. Sendo o primeiro grupo estrangeiro a assumir o seu interesse no equipamento, o Aspro Parks conta com a sua experiência internacional – detém 60 parques naturais em 12 países europeus – para a sua gestão. «A nossa proposta é pan-europeia, mas sempre com um enfoque local», garante o responsável do grupo que explora, por exemplo, o Aquário de Barcelona.

OUTROS INTERESSADOS

Além das propostas assumidas oficialmente, têm vindo a público nomes de outros privados interessados: a espanhola Parques Reunidos, a britânica Merlin Entertainments (segunda maior do mundo na gestão de parques temáticos, a seguir à Disney, e que gere o Sea Life, no Porto), os accionistas do Aquário de Génova e os do Aquashow (Quarteira). Até o nome da Disney já veio a público como possível interessada no negócio, o que o grupo ainda não confirmou.