Benditos Turistas

Há dois anos Lisboa passou a estar destacada na imprensa internacional como um destino de férias imperdível.

O mérito está na grande quantidade de pessoas que trabalha no sentido de aumentar o número de turistas na cidade. É por causa deste trabalho importante, mais do que pela beleza indiscutível de Lisboa, que uma multidão de estrangeiros aparece com os primeiros raios de sol. Dir-se-ia que é uma óptima notícia, mas talvez seja precipitado.

Um artigo no Público, com o título 'Lisboetas sentem-se cada vez mais acossados pelos turistas', alerta para o descontentamento dos autóctones com esta invasão de bárbaros que cantam, bebem e gritam. Li os testemunhos cansados dos turistas com alguma amargura. Pensava que era bom termos gente a visitar-nos, a querer conhecer o nosso país, a recomendar Lisboa. Mas parece que não. O que queremos é sopas e descanso, que ninguém venha cá, sobretudo que não contrariem a ideia de que somos um desgraçados. 

A vida dá muitas voltas

Pensava que a China era um pais exótico até ler uma notícia no Daily Mail sobre a utilização do nome 'Hitler' como marca de cones de gelados na Índia. Segundo o jornal, há «uma grande falta de cultura no país no que respeita ao Holocausto», o que explica a utilização da imagem do ditador sinistro nas caixas de cartão do produto. O jornal alemão Das Bild disse que se tratava de «um golpe de publicidade macabro». O Twitter reagiu como uma dama antiga e classificou o acto como de «mau gosto». É impossível não desatar a rir quando olhamos para as imagens de pessoas a posar com o cone 'Hitler' à espera do gelado de chocolate, sem fazerem ideia de quem é aquele homem de bigodinho e aspecto irado. Não tem importância. Entendo esta utilização como uma forma de ridicularização da memória de um assassino perigoso e louco. Talvez mais interessante do que ser 'apagado da memória' é ser lembrado como se fosse irrelevante, coisa que Hitler nunca quis ser. 

Mulheres ao volante

Não é só na Arábia Saudita que as mulheres foram proibidas de conduzir. Aqui muito perto, em Londres, os líderes de uma seita judaica ultra-ortodoxa emitiram uma declaração que proíbe as mulheres daquela comunidade de conduzirem. Os argumentos são claros: mulheres ao volante, perigo constante, que é como quem diz 'são uma ofensa às regras de modéstia da comunidade'. Como consequência imediata, as crianças que sejam levadas pelas mães de carro até à escola serão proibidas de assistir às aulas. Se, por acaso, a mãe tiver de levar o filho ao hospital e não tiver um homem ou um táxi por perto, terá de escrever um pedido a uma comissão que avaliará a situação. Ora aqui está uma solução prática. É evidente que nem a modéstia, nem a dignidade, nem o pudor são para aqui chamados. Trata-se apenas da velhinha vontade de controlar a próxima, limitando a quilometragem. Uma mulher que conduz é um perigo. Só Deus sabe onde pode ir parar. Ainda se põe a milhas.
Espertos
A Goldman Sachs resolveu investir nos pais e aumentou a licença de paternidade paga na totalidade para quatro semanas, duplicando assim o tempo que podiam estar ausentes do trabalho para cuidar dos filhos. A empresa anunciou que percebeu que os seus funcionários eram na sua maioria casados ou viviam em união de facto e que tinham filhos, por isso considerou importante contribuir para o equilíbrio entre a vida familiar e profissional. Membros de casais do mesmo sexo também podem usufruir desta licença, segundo o anúncio do departamento de Recursos Humanos da Goldman Sachs. Porque é que a paz e a harmonia familiar dos funcionários são tão importantes para um banco de investimento que só pensa em lucro? É uma pergunta à qual responderemos com alguma dificuldade, mas que pode estar baseada na ideia antiga de que um trabalhador feliz é mais produtivo. Registemos o acto como sendo digno da civilização a que pertence. Interesseiro, mas de civilização. 

Trabalho e conhaque

Um relatório do Eurostat revelou aquilo que sabemos: os portugueses estão entre os menos satisfeitos na Europa com a qualidade da sua vida. A situação financeira é motivo de grande preocupação e dor de cabeça. Mas no que se refere às suas relações pessoais, os portugueses têm uma opinião diferente. Aí tudo corre às mil maravilhas. Podemos não ter um tostão furado, mas somos amigos dos nossos amigos, filhos dos nossos pais e tios dos nossos sobrinhos. Numa pontuação de zero a dez, os portugueses atingem 7,9 de satisfação neste campo tão importante da vida. Se por um lado compreendo que a situação financeira pode não estar associada às relações pessoais, também defendo e acredito que é difícil enriquecer (ou sair da pobreza) sozinho. Acontece que as relações pessoais não se restringem ao âmbito familiar ou de amizade. Não serão todas as relações entre as pessoas precisamente pessoais, peço desculpa pela redundância? Se assim for, a média tem de descer.